Anais: Geomorfologia de encostas

RELAÇÕES ENTRE INTERCEPÇÃO DA CHUVA, ESCOAMENTO SUPERFICIAL E EROSÃO DOS SOLOS OBTIDAS DE ENCOSTA EXPERIMENTAL EM ÁREA URBANA, ILHA DO FUNDÃO, RIO DE JANEIRO (RJ).

AUTORES
Monico, T.S.C. (UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO) ; Avelar, A.S. (UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO) ; Coelho Netto, A.L. (UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO)

RESUMO
O objetivo deste trabalho é estudar os parâmetros de intercepção das copas arbóreas, escoamento superficial e produção de sedimentos, em encosta experimental no campus Ilha do Fundão/UFRJ. Com 6 parcelas hidro-erosivas do tipo Gerlach, 21 pluviômetros artesanais de PVC e um conjunto de calhas, mangueiras conectoras e galões para o armazenamento, a encosta está parcialmente recoberta pela copa de uma árvore, enquanto a outra está exposta à ação direta das gotas de chuva.

PALAVRAS CHAVES
Intercepção; Escoamento Superficial; Produção de Sedimentos

ABSTRACT
The objective of this work is to study the parameters of canopy tree interception, runoff and sediment yield in the experimental slope of the back of the building CCMN / UFRJ. 6 contains plots hydro-erosive type Gerlach, 21 gauges PVC craft and a set of rails, connector hoses and gallons for storage. Half of the slope is covered by the canopy of a tree, while the other is exposed to the direct action of raindrops.

KEYWORDS
throughfall; runnof; sediments yield

INTRODUÇÃO
Os recentes episódios de desastres naturais associados a chuvas extremas que atingiu estados do Sul-Sudeste brasileiro, como Santa Catarina (2008), São Paulo e Rio de Janeiro (2010) e Rio de Janeiro (2011) demonstram a fragilidade dos sistemas encosta-planície frente a eventos de precipitação de grande magnitude. Desta forma, é de suma importância a compreensão dos mecanismos e processos envolvidos. Neste contexto, este trabalho pretende apontar a importância da manutenção de espécies vegetadas nas encostas a partir do comparativo da variabilidade espacial das chuvas e dos parâmetros de escoamento superficial e remoção/transporte de sedimentos entre parcelas erosivas expostas diretamente a ação das gotas de chuva e sob influência das copas das árvores, em área urbana. Considera-se importante discorrer sobre as principais referências de pesquisa acerca do movimento da água em superfície assim como alguns fatores que influenciam na erosão mecânica dos solos. A importância da água no processo erosivo foi bem destacada por HORTON (1933, 1945) que demonstrou a tendência da precipitação ao infiltrar nos solos ou a de escoar em superfície. Destaca-se a importância da cobertura vegetal sobre o processo de infiltração. Um de suas funções é definida por COELHO NETTO (1994) como a de interceptar parte da precipitação pelo armazenamento das copas, de onde é perdida para a atmosfera por evapotranspiração durante e após as chuvas. A autora encontrou uma taxa de 11% (1985), ponderando áreas abertas, como trilhas enquanto MIRANDA (1992) deparou-se com uma taxa de intercepção em 24,5%, sendo ambos os estudos conduzidos na Floresta da Tijuca (RJ). Já a erosão pode ser definida como processos de desagregação, transporte e deposição dos materiais provenientes de solos e rochas (MORGAN, 1986)onde os principais fatores controladores são a textura dos solos e a erosividade das chuvas. Neste trabalho, a precipitação é compreendida como o principal dado de entrada de energia no sistema.

MATERIAL E MÉTODOS
Localizada nos fundos do prédio do CCMN/UFRJ, a encosta experimental foi objeto de mensuração dos parâmetros de precipitação e escoamento superficial realizadas entre janeiro e março de 2009. Contem 6 parcelas hidro-erosivas do tipo Gerlach e 10º de inclinação. Como os resultados entre as duas metodologias de instalação de parcelas foram similares, optou-se por aguardar uma melhor acomodação do solo ao longo do tempo. Em dezembro de 2010 a encosta foi reativada, com a limpeza de espécies vegetais no interior e entorno das parcelas, evitando ao máximo possíveis destacamentos de agregados dos solos, para não permitir a constituição de grandes irregularidades no terreno. Procedeu-se a confecção e reinstalação das chapas de calhas coletoras, de aço galvanizado, direcionando o fluxo para mangueiras e galões de 25 litros para o armazenamento do escoamento superficial. Também foram confeccionados e instalados 21 pluviômetros artesanais de PVC, com 10 cm de diâmetro e 30 cm de altura, equidistantes 1,35m cada, formando uma malha com 6 destes no entorno de cada parcela. As parcelas possuíam 3 m de comprimento por 1 m de largura, e três delas ficaram sob influência das copas arbóreas enquanto as outras três permaneceram sob ação direta das gotas de chuva. As medições ocorreram diariamente, entre 15 e 16hs. A altura de coluna d’água nos pluviômetros anotada era depois convertida para mm de chuva. Depois de quantificar o volume de runnof, coletou-se amostras de 500 ml por galão e levadas a estufa para secagem da água (+- 105ºC) e pesagem dos sedimentos. De posse dos dados seguiu-se com as análises, confecçãp de mapas da dostribuição das chuvas e execução de testes estatísticos de agrupamento dos valores de pluviosidade, com objetivo de relacionar o escoamento superficial e na produção de sedimentos frente a intercepção, considerando chuvas variadas.

RESULTADOS E DISCUSSÃO
As precipitações coletadas na encosta experimental mostraram-se bastante variáveis frente ao dados obtidos de uma estação pluviométrica localizada na Ilha do Governador, monitorada pela Prefeitura do Rio e integrante do Sistema Alerta-Rio. A correlação foi de 61,5% no período deste estudo, mostrando uma variabilidade das chuvas em áreas relativamente próximas. O mesmo comportamento é obtido ao analisar as estações do Alerta-Rio: enquanto a estação Alto da Boa Vista, em área montanhosa, registrou em 2010 um total de 2795,4 mm de chuva, a estação Penha registrou 1348,2 mm. Na própria encosta experimental, ocorrem diferenças entre os volumes coletados pelos pluviômetros. Os localizados próximos a parte central das copas acumularam uma coluna d’água menor que aqueles instalados no outro extremo da encosta, exposto diretamente à queda livre das gotas. Foram confeccionados 12 mapas da distribuição espacial das chuvas ao longo da encosta, mas devido às variações entre a redistribuição da chuva promovida pelas copas em diferentes eventos de chuvas, não foi possível definir claramente quais os pluviômetros sofreram interferência das copas. Para tanto, recorreu-se ao tratamento estatístico da pluviosidade por meio do teste de agrupamento em árvore, que analisa os dados sem aplicar qualquer direcionamento ao software. Neste caso, os grupos são estabelecidos em termos de similaridade ou dispersão entre os dados. Os resultados apontaram dois grupos distintos na árvore: um com dados mais similares, relacionados à precipitação direta, e outro mais disperso, relacionado ao atravessamento das copas. A partir disto, os grupos de pluviômetros foram identificados na encosta de acordo com sua característica, indicando uma boa correspondência com as isolinhas de precipitação originadas dos mapas de distribuição através da encosta experimental, servindo como opção de metodologia para análise de chuvas em trabalhos futuros. A intercepção das copas alcançou uma taxa média de 23,07%, com variações entre cada parcela erosiva. Das três que posicionam-se abaixo das copas, a que é recoberta por uma maior densidade de galhos e folhas registrou 25,85% de intercepção. Aquela parcela relacionada a uma menor densidade de copas alcançou 17,67% de intercepção. Estas diferenças também podem ser explicadas por alterações no regime de ventos durante as chuvas. Logo, há uma aparente tendência inversa entre chuvas e intercepção, contudo parece ter um limite, pois o evento de 26 de abril registrou em torno de 90 mm de chuva, mas somente 3,59% foram interceptados pelas copas. Os parâmetros de escoamento superficial e sedimentos transportados foram analisados a luz de onze eventos de precipitação regulares e um evento extremo, ocorrido em 26 de abril. No primeiro caso, as parcelas abaixo das copas captaram menor pluviosidade em seus coletores, refletindo no menor volume de escoamento superficial. Por outro lado produziram uma maior taxa de transporte de sedimentos, quase o dobro das parcelas expostas a ação direta da chuva (87,55 g/L contra 41,25 g/L). Alguns autores justificam este efeito no fato de que a arquitetura dos galhos e a forma das folhas pode concentrar fluxos e aumentar o tamanho da gota, resultando em maior energia cinética, capaz de então destacar os grãos do topo do solo (VIS, 1986 apud MIRANDA, 1992). Para os eventos extremos, o escoamento superficial foi maior na área aberta (102L contra 94L), entretanto este resultado parece ter sido subestimado devido a um problema na parcela 5 que formou pequenas poças que reteram água na superfície, além de certa dificuldade em transpor o volume de chuva para as calhas coletoras e o galão de armazenamento. Ainda assim, a produção de sedimentos foi invertida em relação aos onze eventos. As parcelas de área aberta produziram pouco mais de 150% de solúveis em relação às de intercepção, o que sugere a maior capacidade de desagregação dos grãos em solos desprotegidos e ausentes de cobertura a cada evento de chuva extremo

CONSIDERAÇÕES FINAIS
A encosta experimental apresentou resultados acerca da produção de sedimentos e escoamento superficial compatíveis com o observado na literatura e de acordo com os estudos sobre intercepção florestal obtidos pelo grupo de estudos. Desta maneira, permitindo o avanço das pesquisas futuras, adicionando outros tipos de cobertura ao solo em etapas futuras, tais como gramíneas, leguminosas e mantas geotêxteis. Os resultados obtidos neste trabalho trouxeram uma dimensão quantitativa das alterações promovidas pela retirada da cobertura vegetal, contribuindo com uma possibilidade de perspectiva pré-evento, visto que no âmbito governamental as ações são tomadas nos pós-fato. Com os recentes eventos extremos de chuva no Brasil, assistiu-se a diversos eventos de enchentes e deslizamentos, com perdas humanas e econômicas, ensejando a realização de mapeamento das áreas de risco e monitoramento contínuo das precipitações, bem como planejamento e discussão acerca da ocupação urbana.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICA
COELHO NETTO, A. L. 1994. Hidrologia de Encosta na Interface com a Geomorfologia. In: GUERRA, A. J. T. e CUNHA, S. B. (ed). Geomorfologia: uma atualização de bases e conceitos. Editora Bertrand Brasil, p. 93-148.

MIRANDA, J. C. 1992. Intercepção das Chuvas pela Vegetação Florestal e Serrapilheira nas Encostas do Maciço da Tijuca: Parque Nacional da Tijuca, RJ. Dissertação de Mestrado. Programa de Pós-Graduação em Geografia. Instituto de Geociências. Universidade Federal do Rio de Janeiro. 100p.

HORTON, R. E. 1933. The Role of Infiltration in the Hydrological Cycle. Transactions – American Geophysical Union, 14: 446-460.
HORTON, R. E. 1945. Erosional Development of Streams and their Drainage Basins: Hydrophysical Approach to Quantitative Morphology. Geol. Soc. Am. Bull, 56: 275-370.

MORGAN, R. P. C. 1986. Soil Erosion and Conservation. Longman Group: Inglaterra, 298p.