Anais: Geomorfologia de encostas

Comportamento do Potencial Matricial da Água de Solo Submetido à Agricultura Orgânica em Encosta com Distintos Manejos e Usos em Ambiente Serrano: Paty do Alferes/ RJ/ Brasil

AUTORES
Pereira, L.S. (UERJ/FFP) ; Rodrigues, A.M. (UERJ/FFP) ; Marinho, A.P.S. (UERJ/FFP) ; Calixto, J.M.S. (UERJ/FFP) ; Bertolino, A.V.F.A. (UERJ/FFP) ; Bertolino, L.C. (UERJ/FFP)

RESUMO
Analisou a porosidade, densidade aparente (Dap) e o potencial matricial da água sob agricultura orgânica com plantio convencional (PC), cultivo mínimo (CM) e parcela sem cobertura (SC). O estudo se localiza em Paty do Alferes/ RJ. Foram instalados/ monitorados (2008 a 2011) tensiômetros e GMS’s em parcelas de erosão de 88 m2. Em 2011 o potencial matricial no CM obteve média de -45, -10 e -30 kPa em 15, 30 e 80 cm, respectivamente, em detrimento do PC e SC (-10, -4 e -20 kPa; -15, -11 e -13 kPa).

PALAVRAS CHAVES
porosidade; tensiômetros; cultivo mínimo

ABSTRACT
Analyzed the porosity, bulk density (Dap) and matrix potential of water in organic agriculture with conventional tillage (PC), minimum tillage (CM) and plot without covering (SC). The study is located in Paty do Alferes/ RJ. Were installed/ monitored (2008-2011) tensiometers and GMS in erosion plots of 88 m². In 2011 the matrix potential in CM obtained media of -45, -10 and -30 kPa at 15, 30 and 80 cm, respectively, at the expense of PC and SC (-10, -4 and -20 kPa, -15, -11 and -13 kPa).

KEYWORDS
porosity; tensiometers; minimum tillage

INTRODUÇÃO
A dinâmica da paisagem é influenciada, principalmente, pelo conjunto sistêmico de energias e matérias que compõem o solo, que podem ter alterações de ordem ambiental variando a entrada e saída desses elementos no solo (Vezzani e Mielniczuk, 2011). A intervenção antrópica, por exemplo, pode mudar toda teia holística de um sistema regional, favorecendo problemas de ordem ambiental, econômico e social (Ab’ Sáber, 1951), como em áreas agrícolas, onde o solo varia seu comportamento hidrológico devido às técnicas de manejo que interferem em suas propriedades físicas (Bertoni e Lombardi Neto, 2010). Nesse sentido, o solo, corpo aberto e dinâmico, está sujeito à influência de diversas ações que atuam de forma interligada (Christofoletti, 2011). Amaral (1986) e Reichardt (1987) observam que a boa estrutura do solo é de grande importância para o emprego de práticas agrícolas, viabilizando maior eficiência de drenagem, além de proporcionar maior variabilidade do potencial matricial da água no solo. Bertolino (2004) e Bertolino et al. (2010) ressaltam que a água da chuva atinge o canal através de diversos caminhos, sendo que a dinâmica desses fluxos variam de acordo com a área em questão, sobretudo, em relação às características estruturais do solo, à presença de descontinuidades no perfil e à umidade antecedente, assim, a boa dinâmica hídrica agrícola está alicerçada no manejo adequado da água de irrigação e do solo. No entanto, práticas agrícolas convencionais causam maiores modificações no solo, como em sua porosidade e densidade, afetando a retenção da água e a resistência mecânica, entre outros aspectos (Silva et al., 1994). Por outro lado, práticas conservacionistas, com utilização adequada da água e do manejo do solo, implicam na diminuição dos gastos com implementos agrícolas, bem como na preservação dos solos (Lopes et al., 2005). Desta forma, o cultivo mínimo torna-se um manejo alternativo, resultando na regeneração do solo, preservando a sua estrutura.

MATERIAL E MÉTODOS
A área de estudo se localiza em Paty do Alferes/RJ, região com predomínio pedológico de LATOSSOLO vermelho-amarelo (Lumbreras et al., 1998). Seu clima é caracterizado como Cw, segundo esquema de Koppen, sua morfologia é formada por contrastes entre serras e colinas onduladas, originadas sobre rochas metamórficas pré-cambrianas (Kunzmann et al., 1998). Ocorrem três domínios geomorfológicos: feições de degraus e serras escarpados e reafeiçoados; compartimentos de colinas suaves; degraus reafeiçoados e colinas dissecadas (Silva et al., 1998). Avaliou-se temporalmente (2008 a 2011) o comportamento hidrológico de solos submetidos à agricultura orgânica em encosta com diferentes manejos e usos, correlacionando dados de porosidade e de chuva de 40 anos. Foram instaladas três parcelas de erosão de 22 X 4 m (Meyer & Wischmeier, 1969) na encosta com 30 % de declividade da Estação Experimental da PESAGRO- Avelar, inserido no córrego do Saco-rio Ubá, com diferentes manejos orgânicos e usos (Kuzmann, et al., 1998): i) plantio convencional (PC); ii) cultivo mínimo (CM); e iii) parcela sem cobertura vegetal (SC), que representa um ambiente degradado (Palmieri, 1998). Foram instalados em 2008 tensiômetros de manômetro de mercúrio (Fernandes et al., 1989) em três profundidades(15, 30 e 80 cm) e posteriormente substituídos pelo sensor de matriz granular (GMS - Watermark®). Tanto os tensiômetros, quanto os GMS’s, foram mensurados diariamente as 16:00 horas. A discussão do potencial matricial da água no solo na parcela sem cobertura se inicia com a instalação do GMS. Os dados de chuva de 40 anos foram adquiridos pela Estação Agroclimatológica da PESAGRO- Avelar. Análises de porosidade total, macroporosidade, microporosidade e densidade aparente foram realizadas por meio do método da mesa de tensão (EMBRAPA, 1997). Para tal, foram coletadas amostras indeformadas de solo em todas as parcelas através de anéis de kopeck com cinco repetições em cada profundidade (15, 30 e 80 cm).

RESULTADOS E DISCUSSÃO
A análise dos dados de 40 anos (1971 a 2011) demonstra aumento da precipitação do mês de novembro até janeiro (18, 24 e 17 %, respectivamente, 59 % do total da média anual) e um decréscimo de junho a agosto (1, 2 e 0 %). Resultados semelhantes foram encontrados por Souza (2003), que ao analisar a média pluviométrica de 30 anos na região, observa o mesmo trimestre como o mais chuvoso (12, 18 e 18%, respectivamente, totalizando 48%) e mais seco (2, 2 e 2%, respectivamente). Em relação à média pluviométrica anual de 40 anos (1211 mm), observa-se que os anos de 2008 (1347 mm), 2009 (1644 mm) e 2010 (1393 mm) ficaram acima da média em seus totais pluviométricos anuais, enquanto que 2011 destoou dos demais, apresentando 1111 mm (Fig. 1 A). Em 2008, o mês de agosto, com precipitação de 29 mm, ficou acima da média, que é de 5 mm, configurando um mês atípico. Percebe-se que 2009 apresentou elevada precipitação (1644 mm), onde o trimestre mais seco, de junho a agosto, apresentou 30, 34 e 6 mm, respectivamente, ficando acima da média de 40 anos (13, 22 e 5 mm). Em 2010, o trimestre mais chuvoso foi de novembro a janeiro, com 280, 333 e 211 mm, respectivamente, obtendo resultados semelhantes com a média de 40 anos. Enquanto que o ano de 2011 caracterizou-se como o mais seco, com o mês de janeiro (137 mm) atípico, ficando abaixo da média (201 mm). Em relação à macroporosidade no sistema CM, observam-se valores equiparados na profundidade de 15 e 30 cm (12%), além de um aumento em 80 cm (15%). Nota-se que a média da parcela PC apresenta desvio padrão de 2,6 % e o CM com 1 %, o que tende a estar relacionado aos sistemas submetidos a um preparo do solo mais intenso. Maiores índices de microporosidade foram encontrados em 30 cm, destacando-se PC (33 %) e SC (32 %), como desvios padrões de 2,8 e 2,9 % (Tabela 1), visto que com a compactação ocorre a desestruturação dos macroporos em poros menores, dificultando a percolação da água para camadas inferiores, que representa a zona de recarga do solo (Bertolino, 2004). CM obteve valores semelhantes de porosidade total em todas as profundidades (39, 39 e 40 %, respectivamente), com menor média de desvio padrão (1 %) em comparação ao PC (2,9 %) e SC (2,5 %), caracterizando um ambiente homogêneo, favorecendo a continuidade de drenagem ao longo do perfil. Sendo que PC e SC apresentaram maior Dap em 30 cm (1,7 e 1,6 g/cm3), expressando o favorecimento de retenção da água, dificultando sua movimentação para zonas inferiores. Em 2008, CM e PC apresentaram comportamentos semelhantes na média anual de potencial matricial (-15 kPa), mas 2009, o ano mais chuvoso, os sistemas se distanciaram em relação à drenagem. CM teve média anual de -17 kPa, caracterizando um solo úmido, PC obteve -7 kPa, caracterizando solo muito próximo à saturação (Fig. 1 B). Levando em consideração maio, que caracterizou o mês mais seco de 2010, nota-se que CM obteve valores de tensiometria mais próximos a solo seco, -29 kPa, em detrimento do PC que variou em -18 kPa. O ano de 2011, que obteve menor quantitativo anual de chuva, apresenta dados de tensiometria (de janeiro a abril) tanto no CM, quanto no PC, próximos, -14 e -11 kPa respectivamente. Os dados de GMS (de julho a dezembro) mostram CM com índice de kPa mais distante da saturação (-78), o PC apresentou -31 kPa, possuindo comportamento mais próximo a umidade, favorecendo as perdas de água e solo por escoamento superficial em eventos de chuva mais intensos. Os dados de média mensal por profundidade de GMS referentes aos meses mais chuvosos de novembro e dezembro de 2011 e janeiro de 2012 mostram o CM com valores distantes à saturação (-45, -10 e -30 kPa, respectivamente), representando boa drenagem. PC e SC apresentam semelhança no comportamento dos potenciais matriciais (-10, -4 e -20 kPa; -15, -11 e -13 kPa, respectivamente), tendo valores mais próximos à umidade, auxiliando na degradação do solo, a partir do escoamento superficial.

Gráfico de chuva e do potencial matricial da água no solo

Figura 1: média anual pluviométrica de 2008 a 2011 (A)e do potencial matricial no sistema CM, PC E SC de 2008 a 2011 (B).

Tabela de porosidade e densidade aparente

Dados por profundidade de porosidade total, macro/ microporosidade e densidade aparente nos distintos manejos e usos.

CONSIDERAÇÕES FINAIS
A pluviometria (média anual de 40 anos) demonstra o trimestre de novembro à janeiro como o mais chuvoso (18, 24 e 17%, respectivamente) e o trimestre de junho à agosto como o mais seco (1, 2 e 0%). SC apresentou elevados valores de microporosidade em 30 cm (32%), representando solo degradado. Contudo, CM demonstrou homogeneidade ao longo do perfil, em relação à porosidade e Dap, indicando boa estrutura no solo. Desde a instalação dos tensiômetros em 2008, CM demonstra maior variabilidade do potencial matricial, mesmo em períodos mais chuvosos mensais e anuais, em detrimento de PC e SC, com valores próximos à saturação. Em 2009, CM (-17 kPa) apresentou diferença de -10 kPa em relação a PC (-7 kPa), comportamento semelhante nos anos posteriores, pois a técnica do trator morro a baixo tende a desestruturar o solo, dificultando a drenagem. CM destaca-se como manejo alternativo, compactando menos o solo, obtendo temporalmente maior eficiência de drenagem e conservação do arranjo poral.

AGRADECIMENTOS
Agradecimento à FAPERJ no apoio ao projeto e na concessão da bolsa de Iniciação Científica (IC) – processo n°: E- 26/102.575/2011 e processo nº: E-26/102.567/2011 e à SR1/ CETREINA/ UERJ na concessão da bolsa de Iniciação à Docência e Estágio Interno Complementar.

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