Anais: Geomorfologia de encostas

Levantamento de estradas não pavimentadas e sua relação com a carga de sedimentos em plantios de eucalipto: bacia do rio Sesmaria, Médio Vale do Rio Paraíba do Sul

AUTORES
Sato, A.M. (IGEO-UFRJ) ; Ferreira, D.C. (IGEO-UFRJ) ; Coelho Netto, A.L. (IGEO-UFRJ) ; Avelar, A.S. (IGEO-UFRJ)

RESUMO
O objetivo deste estudo foi abordar a influência do manejo de plantios de eucalipto na erosão baseado na análise de quatro áreas na bacia do rio Sesmaria, médio vale do rio Paraíba do Sul. Especificamente, foram avaliados os impactos erosivos decorrentes das estradas não pavimentadas (ENPs) dos plantios. Os resultados indicaram que as ENPs contribuíram significativamente com sedimentos para os canais fluviais, embora não tenham sido detectadas alterações na carga de sedimentos no fluxo de base.

PALAVRAS CHAVES
eucalipto; erosão; estradas não pavimentadas

ABSTRACT
The objective of this study was to address the influence of eucalypt plantations management on erosion based on analysis of four areas in Sesmaria basin, middle Paraíba do Sul river valley. Specifically, we assessed the impacts of unpaved roads of the plantations on erosion. The results indicated that unpaved roads erosion contributed significantly to sediments discharge into fluvial channels, although no changes were detected in sediment load in base flow.

KEYWORDS
eucalypt; erpsion; unpaved roads

INTRODUÇÃO
Segundo Sato (2012), embora os plantios de eucalipto estejam expandindo no médio vale do rio Paraíba do Sul (MVRPS), existem muitos questionamentos sobre os impactos hidrológicos e erosivos destes plantios. No MVRPS, Vianna et al. (2007) detectaram que os plantios de eucalipto têm substituído pastagens em um padrão espacial de manchas e que em 2006 ocupavam aproximadamente 3% da bacia do rio Sesmaria. Estudos em parcelas de escoamento no interior de um plantio nesta mesma bacia indicaram que o interior dos plantios constitui-se em um ambiente de infiltração de água, com ocorrência de escoamento superficial inferior a 1% na relação Q/P (Sato, 2008; Melos et al., 2011). Este baixo valor de escoamento superficial foi relacionado com o atravessamento concentrado próximo aos troncos (Sato et al., 2011), onde ocorre a maior concentração de raízes que atuam como vias preferenciais de percolação de água no solo, assim como pela ocorrência de uma espessa camada de serrapilheira que dificultaria a ocorrência de fluxos superficiais. Embora os resultados indiquem que no interior dos plantios de eucalipto este processo não seja relevante, existem indícios de campo que o escoamento superficial é bastante significativo nas estradas não pavimentadas (ENPs) dos plantios (Ferreira, 2011). As práticas de manejo florestal deveriam incluir o menor extensão possível de ENPs (Likens, 1985), sendo indicado que a densidade de estradas em plantios florestais que visem a proteção ambiental fique entre 30 e 40 m/ha (FAO, 1989). De acordo com Croke et al. (1999), os solos das ENPs apresentam elevada densidade e baixa capacidade de infiltração devido à compactação pelas máquinas, o que proporciona a formação de fluxos superficiais hortonianos. Diante do exposto, o objetivo deste trabalho é avaliar as características das ENPs que possam estar relacionadas com o aumento da carga de sedimentos (CS) nos canais fluviais em quatro cabeceiras de drenagem com plantios de eucalipto.

MATERIAL E MÉTODOS
A extração da área ocupada pelas ENPs nas quatro estações foi feita a partir da base digital na escala 1:10.000 e de complementações realizadas a partir de trabalhos de campo. Para maiores detalhes sobre as estações de estudo, consulte Sato (2012). Os pontos de saída d’água das ENPs foram definidos como locais onde havia evidências de saída de fluxos superficiais das ENPs para o interior dos plantios, áreas de preservação permanente ou diretamente para os canais de drenagem. A localização destes pontos foi feita com um receptor GPS. O processamento envolveu o estabelecimento das distâncias mínimas entre as saídas d’água e os canais de drenagem, sendo esta etapa realizada através da ferramenta Near da caixa de ferramentas Analysis Tools do ArcGIS 9.3, tendo como arquivo de entrada os pontos das saídas d’água e arquivo de referência de distância a hidrografia das cabeceiras de drenagem. Desta forma, foi obtida a menor distância entre cada saída d’água em relação à rede de drenagem. Visando estabelecer uma relação entre estas distâncias e o número total de saídas d’água por cabeceira de drenagem, foi proposto o Valor de Conectividade Estrada- Drenagem (VCED). Em uma análise comparativa, as bacias que apresentarem maiores valores de VCED possuiriam uma maior conexão entre as ENPs e a rede de drenagem. O cálculo do VCED baseia-se na seguinte fórmula: VCEDi = SAi/Di (Equação 1) Onde: VCEDi = valor de conectividade estrada-drenagem da bacia i SAi = número de saídas d’água da bacia i Di = média das distâncias mínimas entre as saídas d’água e a rede de drenagem da bacia i Também foram coletadas semanalmente três amostras de água nas quatro estações a partir do eflúvio dos vertedores. O período de amostragem foi de Janeiro de 2010 a Fevereiro de 2011 e não foram analisados separadamente os sedimentos em suspensão e dissolvidos. Para a análise da CS nas amostras foi utilizado o método de evaporação e pesagem (DNAEE, 1970 apud Carvalho, 2008) adaptado.

RESULTADOS E DISCUSSÃO
Os dados de comprimento de ENPs em relação à área das cabeceiras de drenagem indicaram que estas áreas possuem elevada densidade de ENPs (Tabela 1). Os resultados encontrados foram duas a três vezes maiores do que o máximo recomendado pela FAO (1989). A CS apresentou grande variação ao longo do período avaliado (Tabela 2), sendo as amostras, de modo geral, coletadas durante o fluxo de base dos canais. A estação Cax 01 apresentou a maior concentração de sedimentos e também possuía parâmetros das ENPs que favoreciam a erosão e a distribuição dos sedimentos para os canais de drenagem. Entretanto, a estação Ind 02, que apresentava os parâmetros mais conservativos das ENPs, foi a que apresentou a segunda maior CS. A maior CS das estações localizadas na fazenda Independência pode estar relacionada ao enriquecimento da água com material orgânico da vegetação dos fundos de vale mal drenados, sendo necessário alterar o método de análise da CS para remover esta possível interferência dos resultados. Em Novembro de 2010 foi realizada a reforma das estradas em toda área de estudo com a utilização de maquinário pesado. Durante esta etapa ocorreu a remoção da camada superficial da ENP e aplainamento da mesma, sendo este material depositado às margens das ENPs. Este material possuía elevada erodibilidade, pois estava completamente desagregado. A reforma da ENPs também modificou o padrão de escoamento nas mesmas, sendo observada após a reforma a formação de uma nova saída d’água imediatamente a montante do vertedor da estação Cax 01, que contribuiu significativamente para o assoreamento do mesmo. Tal aumento da CS devido à reforma das ENP não foi detectado pela amostragem do presente estudo, demonstrando que a coleta semanal fixa é inadequada para estudos da erosão. Porém os dados adquiridos serão úteis para futuras comparações com resultados de CS durante fluxos de chuva. Câmara e Lima (1999) monitoraram a CS em um plantio de eucalipto antes e após o corte utilizando esta mesma forma de amostragem e também obtiveram baixas concentrações de sedimentos. Os resultados indicaram valores que variaram de 0,5 a 19,2 mg/L antes do corte e de 1,5 a 15,9 mg/L após o corte. Conforme ressaltado pelos autores, embora os resultados não apontassem, existiam evidências de campo que indicavam uma maior produção de sedimentos após a colheita, em virtude dos distúrbios que ocorreram no solo pela passagem de maquinário pesado e o arraste das toras durante a colheita. Minella et al. (2009) coletou amostras de CS durante os fluxos de base e de chuva em uma bacia com diferentes usos do solo. A média de CS durante o fluxo de base e de chuva foram de 20,0 e 81,7 mg/L, respectivamente. Este autor ressalta que a mobilização dos sedimentos está em grande parte relacionada a grandes eventos chuvosos. Lane e Sheridan (2002) avaliaram a influência do cruzamento de uma ENP com uma linha de drenagem, monitorando a turbidez e a carga de sedimentos em um ponto a montante e outro a jusante simultaneamente. Durante os momentos de fluxo de base foram registrados em média 3,7 e 1,7 NTU e 9,9 e 2,8 mg/L nas áreas de jusante e montante, respectivamente, alterando para valores máximos de 468,6 e 45,6 NTU e 1.236,9 e 144,0 mg/L durante os fluxos de chuva. Ficou evidente a importância desses eventos de maior volume na mobilização dos sedimentos na estação Cax 01, que apresenta maior gradiente de bacia. Nesta área ocorreram ao menos três episódios de assoreamento do vertedor e as observações sugerem que estes processos ocorreram de forma episódica, em resposta aos eventos de maior chuva. Nas demais estações também foram feitas manutenções de remoção de sedimentos dos vertedores, mas em apenas uma oportunidade nas estações Ind 01 e 02 e duas oportunidades na estação Cax 02, sendo uma destas manutenções claramente relacionadas com a manutenção das ENPs, conforme citado anteriormente.

Tabela 1

Tabela 1 – Dados das ENPs por cabeceira de drenagem.

Tabela 2

Tabela 2 – Dados de carga de sedimentos por estação.

CONSIDERAÇÕES FINAIS
I) As ENPs demonstraram ser importantes fontes de sedimentos para os canais de drenagem, especialmente após a realização de reformas, quando grande quantidade de sedimento é desagregado e mobilizado para as margens das ENPs, causando o assoreamento dos canais; II) Baseado nas observações de campo conclui-se que parâmetros relacionados às ENPs (densidade, área ocupada, conectividade com a rede de drenagem, etc.) estão relacionados com a dinâmica hidrossedimentar dos canais fluviais dos plantios de eucalipto; III) Novas perspectivas de pesquisa hidrossedimentológica nesta região foram abertas após este trabalho, como a quantificação do escoamento superficial e a erosão nas ENPs dos plantios de eucalipto e sua contribuição direta para a carga de sedimentos em suspensão nos canais fluviais durante os eventos de chuva.

AGRADECIMENTOS
Os autores agradecem o auxílio financeiro da FAPERJ (processos E-26/102.791/2008 e E-26/110.283/2012), do CNPq (processo 480293/2011-2). Agradecemos também ao apoio logístico da FIBRIA Celulose S.A. por permitir o acesso e o monitoramento das fazendas de eucalipto. Sato agradece à CAPES pela concessão da bolsa de Doutorado e Ferreira agradece à FAPERJ pela bolsa de Iniciação Científica.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICA
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