Anais: Geomorfologia fluvial

AVALIAÇÃO DA CONECTIVIDADE NO TRANSPORTE DE SEDIMENTOS ENTRE AMBIENTES FLUVIAIS NO CANAL MACAÉ (RJ)

AUTORES
Amadeu de Souza, P. (UFRJ) ; dos Santos Marçal, M. (UFRJ)

RESUMO
O trabalho apresenta discussão teórica do conceito de conectividade entre ambientes fluviais e estudos no canal do rio Macaé a partir da avaliação da transferência de sedimentos entre os ambientes identificados. Foram utilizados quatro parâmetros geomorfológicos na diferenciação dos trechos e avaliada a conectividade entre eles. A transferência de sedimentos é eficiente, com pequeno transporte de sedimentos grosseiros entre um trecho e outro, exceto em eventos extremos.

PALAVRAS CHAVES
Conectividade; Ambientes Fluviais; Bacia do rio Macaé

ABSTRACT
The paper presents a theoretical discussion of the concept of connectivity between river environments and studies in Macaé river channel from the assessment of sediment transfer between environments identified. Were used four parameters for differentiation of geomorphological sections and the assessment of connectivity. The transfer of sediment is efficient, with little transport of coarse sediments from a section and another, except in extreme events.

KEYWORDS
Connectivity; Fluvial Environment; Macaé Catchment

INTRODUÇÃO
O entendimento da relação do homem dentro da própria paisagem e evolução da mesma tem feito cada vez mais parte das discussões nas ciências ambientais, a exemplo da Geomorfologia Fluvial, em função da crescente preocupação com as condições naturais dos ambientes físicos e seus ajustes frente às perturbações antrópicas (Harvey, 2001; Brierley et. al., 2006). A compreensão das interações entre as diversas partes que compõe os ambientes físicos têm ganhado grande destaque, exigindo o aprofundamento em diversos estudos que tratam da conectividade de paisagens, isto é, do potencial de transferência das partículas dentro e entre partes de um sistema, possibilitando melhor entendimento da sua dinâmica e funcionamento como um todo (Harvey, 2001). Entender como e com que eficiência ocorre o transporte de sedimento em uma bacia hidrográfica, assim como, identificar se há interruptores dentro do sistema de análise, seja por razões naturais e/ou antrópicas, é fundamental para observar as modificações na passagem de sedimentos em diferentes setores e maior retenção em outros, através de feições formadas ao longo do canal, gerando conseqüências propagatórias e diferentes respostas, com possíveis desajustes em todo o sistema fluvial. O trabalho visa apresentar discurssão teórica do conceito de conectividade entre ambientes fluviais e, de forma preliminar, apresentar os estudos desenvolvidos no canal do rio Macaé, a apartir da avaliação da transferência de sedimentos, com base na dimensão longitudinal, entre os ambientes identificados. A Bacia do rio Macaé esta localizada na região Norte do Estado do Rio de Janeiro. O rio Macaé apresenta ambientes fluviais que possuem caracterísiticas e comportamentos que se diferenciam ao longo do canal aonde, muitas vezes, vêm tendo a sua dinâmica modificada por interferências antrópicas direta, através das retificações dos canais das áreas de baixadas, e indireta (através das atividades de agropecuária, turismo e indústria).

MATERIAL E MÉTODOS
O conceito de conectividade dos ambientes fluviais em bacia hidrográfica foi baseado em foi baseado em Harvey (2002), Hooke (2003), Brierley et. al. (2006), que buscam compreender as diversas dinâmicas de sistemas com base da interação entre os seus compartimentos. A segmentação e diferenciação dos ambientes fluviais no canal Macaé foi realizada com base nos seguintes parâmetros geomorfológicos: (1) Sinuosidade do canal; (2) Características Sedimentológicas dos sedimentos transportados (sedimentos de fundo: Granulometria, Grau de Arredondamento e Seleção – e sedimentos em suspensão); (3) Ocorrência de feições fluviais dentro do canal (tipo e forma); e (4) Característica do leito fluvial. O parâmetro de sinuosidade baseou-se na metodologia de Schumm (1977), que considera o meandramento de canais fluviais. Os pontos de coleta de sedimentos no canal foram realizados à jusante das desembocaduras dos principais afluentes que são monitorados, desde Outubro de 2007, em seções transversais ao canal Macaé pelo grupo de Geomorfologia Fluvial do LAGESOLOS. Os sedimentos fluviais de fundo foram coletados no centro e nas margens direita e esquerda. As análises foram realizadas no Laboratório de Geomorfologia Maria Regina Mousinho de Méis, do Departamento de Geografia da UFRJ. As feições geomorfológicas foram baseadas em Brierley & Frirys (2005), no qual classifica uma variedade de barras laterais e de centro presentes dentro do canal. E realizado através de observações em trabalhos de campo e na análise de imagens do Google Earth, na escala de 1:10.000 do ano 2011. Foram identificados quatro trechos com diferentes características geomorfológicas e espacializados na base cartográfica de 1:50.000, onde foram avaliados a conectividade de transferência de sedimentos longitudinal, de acordo com Frirys et. al. (2007).

RESULTADOS E DISCUSSÃO
O conceito de conectividade é considerado por autores (Chorley & Kennedy, 1971; Brierley et. al., 2006) como a capacidade de um compartimento da paisagem se conectar a outro compartimento e transferir informação, seja através do contato físico entre eles como pela transferência de material (sedimentos, água e nutrientes) e energia. Para Harvey (2001), este conceito pode ser analisado através de diferentes hierarquias: local, zonal e global. Na primeira, ocorre dentro do próprio canal fluvial, onde as diferentes formas de transporte dos sedimentos definem os tipos de conectividade existente dentro e entre os trechos de um rio. Caso haja, retenção de sedimentos (por alguma feição ou pela própria condição do canal), o material é armazenado temporalmente, cessando a transferência e a conectividade só é reestabelecida quando há renovação de transporte desse depósito. Na escala zonal há transferência de matéria entre compartimentos (encostas e canais); e na escala global a (des) conectividade diz respeito ao comportamento da bacia hidrográfica. O estudo da conectividade abrange três dimensões: Longitudinal, definida no âmbito da rede de canais e incluem relações de fluxo à montante e à jusante e nos tributários com o canal principal; Lateral caracterizada pela relação entre a rede de canais e de toda a paisagem e a Vertical implica na relação de trocas químicas, biológicas e hidrológicas que ocorrem entre os ambientes superficiais e subsuperficiais (Fryirs et. al., 2007). No canal Macaé foram identificados quatro diferentes ambientes fluviais denominados de trechos fluviais (Figuras 1 e 2). O 1º trecho fluvial (48 Km) possui baixa sinuosidade, maior ocorrência de aglomerações de blocos rochosos e ilhas, na maioria vegetada, apresenta grande expressividade de areia muito grossa com grãos angulosos a sub-angulosos, mal selecionado e o leito fluvial predominantemente rochoso. O 2º trecho fluvial (39 Km) possui sinuosidade pouco mais elevada em relação ao anterior, com maior meandramento. Há predomínio de seixos e grânulos sub-angulosos, moderado selecionado e baixa retenção de sedimentos em suspensão; o leito fluvial é predominantemente rochoso, mas com algum desenvolvimento aluvial. O 3º trecho fluvial (16 Km) possui alta sinuosidade. Há ocorrência de blocos rochosos com ilhas vegetadas, além de barras arenosas laterais e submersas. Há o predomínio de areia muito grossa e grãos sub angulosos a sub arredondados e média retenção de sedimentos em suspensão. O leito fluvial é mais aluvial, mas com presença de blocos rochosos. O 4º trecho fluvial (33 Km) apresenta-se todo retificado. Há presença expressiva de barras submersas e poucas barras arenosas centrais. Possui predomínio de areia grossa a fina, com grânulos e seixos, com baixa retenção de sedimentos em suspensão; o leito é arenoso, com presença expressiva de bancos arenosos. A transferência de sedimentos entre os trechos analisados ocorre de forma eficiente, podendo ser interrompidos por barreiras do tipo blocos rochosos, ilhas e barras. No 1º trecho analisado, a transferência dos sedimentos é retida por depósitos sedimentares em ilhas e barras laterais. Do 2º para o 3º trecho fluvial e do 3º para o 4º trecho fluvial parecem ocorrer de forma mais eficiente, visto principalmente pelo transporte de sedimentos de barra para barra, já que os dois primeiros ambientes possuem os mesmos tipos de feições fluviais. Já o 4º trecho fluvial possui na sua parte mais à montante presença de poucas barras submersas, aumento a ocorrência para jusante e em direção à foz, na medida em que passa a ter grande aporte de sedimento arenoso que dependendo do período de chuva se acumulam deixando o canal, por vezes, ora com volume elevado de água, ora com volume abaixo do normal.

Figura 1

Identificação dos trechos fluviais na Bacia do rio Macaé.

Figura 2

Parâmetros Geomorfológicos que diferenciam os trechos fluviais na Bacia do rio Macaé.

CONSIDERAÇÕES FINAIS
Considera-se de forma preliminar que entre os trechos fluviais identificados e analisados a transferência e transporte de sedimentos estão dentro de um sistema parcialmente conectado, onde os ambientes fluviais identificados não apresentam problemas de retenção excessiva de sedimentos. Porem observa-se que no trecho onde o canal é retificado há maior aporte de sedimentos que ficam retidos em formas de barras submersas. Estudos que relacionem as informações aqui levantadas sobre os ambientes fluviais com a declividade do canal e sua altimetria serão necessários para poder avaliar de forma mais efetiva como se dá a transferência de sedimentos ao longo de todo o canal fluvial.

AGRADECIMENTOS
Os autores agradecem à Fundação Carlos Chagas Filho de Amparo à Pesquisa do Estado do Rio de Janeiro (FAPERJ) e ao Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) pela concessão de financiamento de pesquisas referentes à Bacia do Rio Macaé.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICA
BRIERLEY, G.J. & FRYIRS, K.A. (2005). Geomorphology and River Management: Applications of the River Styles Framework. Blackwell Publishing, Oxford, UK. 398 pp.
BRIERLEY, G.J., FRYIRS, K.A., JAIN, V. (2006). Landscape connectivity: The geographic basis of geomorphic applications. Area 38.2, 165–174p.
CHORLEY, R.J. & KENNEDY, B.A. (1971). Physical Geography: A Systems Aproach, London: Prentice Hall. 370p.
HARVEY, A.M. (2002). Effective timescales of coupling within fluvial systems. Geomorphology. 44, 175–201p.
HOOKE, J.M. (2003). Coarse sediment connectivity in river channel systems: a conceptual framework and methodology. Geomorphology 56. 79–94p.
SCHUMM, S.A. (1977). The fluvial System, Chichester, UK: John Wiley and Sons, 338p.