Anais: Geomorfologia fluvial

Parâmetros morfométricos e evidências de controle estruturais na história evolutiva da bacia do rio Guapi-Açu (Cachoeiras de Macacu, RJ)

AUTORES
Vasconcelos Paes, T. (UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO) ; Mendes da Silva, T. (UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO)

RESUMO
O recorte espacial de bacias de drenagem é de extrema importância para a compreensão evolutiva da paisagem. O objetivo deste trabalho é analisar a bacia do rio Guapi-Açu (Cachoeiras de Macacu, RJ) através de parâmetros morfométricos. A identificação de assimetrias de bacias e a análise de perfis de relevo transversais e longitudinais aos rios permitiram constatar o controle tectônico na área, bem como subsidiaram o entendimento da ocorrência de processos geomorfológicos.

PALAVRAS CHAVES
Bacia de Drenagem; Parâmetros Morfométricos; Cachoeiras de Macacu

ABSTRACT
The spatial indenture of drainage basin is extremely important for understanding the evolutionary landscape. The aim of this paper is to analyze the river basin Guapi-Acu (Cachoeiras de Macacu, RJ) through morphometric parameters. The identification of asymmetric basins and analysis of relief transverse profiles and longitudinal rivers profiles allowed to assess the tectonic control on the area, as well as supported the understanding of the occurrence of geomorphological processes.

KEYWORDS
Drainage basin; Morphometric Parameters; Cachoeiras de Macacu

INTRODUÇÃO
Bacias Hidrográficas são superfícies de coleta e recipiente de armazenagem da precipitação, configurando o sistema através do qual a água e os sedimentos são transportados para o oceano ou um lago interior (MONTEIRO FILHO, 2009). Desta forma, o conhecimento sobre estas se faz necessário quando se busca o entendimento do desencadeamento de processos catastróficos na paisagem, pois estas tanto são cenários, quanto seus parâmetros são fatores deflagradores ou não para a ocorrência e a magnitude de tais processos, ou seja, a bacia de drenagem é o espaço físico onde estes eventos ocorrerão e seus fatores físicos (declividade, porosidade, permeabilidade, formato, entre outros) são ‘determinantes’ para a ocorrência ou não destes e, muitas vezes, de sua própria magnitude. Segundo Gilbert (1877, apud CORREA, 2011) a paisagem física da superfície terrestre é composta pela interação de material (rocha/sedimento), processos (endógenos/exógenos) e as formas. Sendo assim, a forma, e neste estudo a bacia de drenagem, se mostra um fator essencial quando se tem por objetivo o estudo da paisagem física da superfície terrestre. A análise deste recorte espacial através do cálculo de seus parâmetros morfométricos tem se mostrado uma ferramenta importante no estudo ambiental, haja vista seu baixo custo e elevada eficácia. Autores como Etchebehere et al. (2004), Correa et al. (2011), Martinez (2005) tem aplicado estas análises para o estudo da rede de drenagem em inúmeras regiões do Brasil. Neste contexto, o presente trabalho tem como objetivo mensurar alguns parâmetros morfométricos que busquem auxiliar na compreensão da dinâmica da bacia do rio Guapi-açu (RJ), podendo estes servir de subsídio a compreensão dos mecanismos associados a Movimentos Gravitacionais de Massa tão característicos nesta bacia, como em toda a porção escarpada SE da Serra do Mar.

MATERIAL E MÉTODOS
Foram confeccionados perfis longitudinais ao rio coletor, bem como em sub-bacias de drenagens afluentes, a partir da extração dos valores de curvas de nível que a calha fluvial tangencia, observados em cartas topográficas na escala 1:50.000. Os valores encontrados foram plotados em planilhas Excel (2007) e elaborados os perfis longitudinais às calhas fluviais. Além dos perfis longitudinais foram também realizados perfis de relevo transversais aos eixos fluviais no alto, médio e baixo cursos, tanto para a bacia do rio Guapi-Açu, como para as bacias afluentes. A obtenção destes foi feita por meio da compilação do MDE (proveniente da missão SRTM) disponibilizado pelo Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais. Estes cálculos foram úteis na análise da assimetria das bacias e, portanto, na investigação sistemática da influência de aspectos da neotectônica. Os parâmetros morfométricos calculados correspondem àqueles direcionados à investigação da ocorrência de neotectonismo na área: a) Fator de Assimetria de Bacia (FA = 100.(Ar/At), onde Ar é a área da bacia à direita do rio (olhando em direção à jusante), e At é a área total da bacia) e b) Fator de Simetria Topográfica Transversa (FSTT = Da/Dd, onde Da é a distância da linha média do eixo da bacia até a linha média do cinturão do meandro ativo e Dd é a distância da linha média da bacia ao divisor da bacia) - SALAMUNI et al. (2004); c) Relação Declividade-Extensão (RDE= Δh/Δl*Ln, onde Δh é a diferença altimétrica que compreende o trecho selecionado para a análise, Δl é a projeção horizontal da extensão do trecho selecionado do rio e Ln é o Logarítmo nepriano) – ETCHEBEHERE et al. (2004). Tais parâmetros foram utilizados na análise das características morfológicas da bacia, a fim de detectar aspectos de possíveis movimentações tectônicas recentes na paisagem, e, assim, sugerir áreas mais susceptíveis ao desencadeamento de processos erosivos que serão investigados com maior detalhe em campo.

RESULTADOS E DISCUSSÃO
Através dos perfis longitudinais realizados, tanto no rio Guapi-Açu como em seus principais afluentes, foi possível a identificação de Níveis de Base Locais (NBLs) bem marcados, que podem indicar a presença de controles litológico e/ou estrutural. Tais se mostram de maneiras mais abruptas (como, por exemplo, no rio Manoel Alexandre localizado na margem esquerda - figura 1) ou de modo mais sutil (como, por exemplo, no rio Iconha localizado na margem direita). Há correspondência direta destes com falhas já mapeadas (DRM, 1983), que correspondem a um forte indicativo de controle estrutural na origem destes NBLs. Outro indício de atividade tectônica na área foi identificado através dos perfis de relevo transversais às bacias, que permitiram a constatação de assimetrias das sub-bacias que compõe a bacia de Guapi-Açu, onde sub-bacias localizadas a margem direita têm uma acentuada concavidade de seus perfis, quando comparados aos perfis da margem esquerda, que são muito mais suaves. Este aspecto demonstra que os rios da margem direita estariam em estágio de maior ‘equilíbrio’ se comparados com os pertencentes à margem esquerda. Tais perfis transversais indicam também um basculamento interno às sub-bacias onde estes não ocorrem de maneira uniforme. Um exemplo deste á a bacia do rio Iconha onde no alto curso temos uma migração do rio principal para a esquerda (da montante para a jusante), no médio curso este migra para a direita, no baixo curso, o canal principal volta a migrar para a esquerda e já bem próximo a sua desembocadura este volta a migrar para a direita. A análise dos parâmetros morfométricos calculados permitiram fazer as seguintes observações: a) Os FABD e de FSTT indicaram basculamentos de blocos do relevo significativos e não uniformes ao longo de uma mesma bacia (identificado pelo cálculo do FSTT). Desta forma, percebemos a complementaridade destes parâmetros morfométricos, onde o FABD pode mascarar características de não uniformidade em uma mesma bacia, havendo necessidade de se realizar cálculo do FSTT para melhor se conhecer o comportamento estrutural de uma bacia de drenagem, e se há ou não uma possível influência de controles estruturais. P. ex. para a bacia do rio Guapi-Açu o valor próximo de 50 do FABD, indicaria pouca ou nenhuma atividade tectônica, porém, valores de FSTT demonstram elevados índices de assimetria, principalmente, em seu alto curso; b) Já o RDE indica a presença de trechos encachoeirados (NBLs) em vários trechos das sub-bacias em estudo, indicando a presença de controles lito e/ou estruturais, que merecem ser melhor investigados. Todos estes parâmetros permitem sugerir um basculamento geral da bacia para a direita, que podem, por sua vez, estar associado a atividades de deslocamentos de blocos por efeito da tectônica, ou mesmo de recuo acentuado de litologias distintas. A tabela 1 apresenta os valores dos parâmetros morfométricos obtidos, e que demonstram a distinção dos resultados para bacias localizadas à margem direita em relação àqueles da margem esquerda. A presença destes basculamentos identificados, tanto pelos perfis transversais quanto pelos resultados dos parâmetros morfométricos, são de extrema importância para o estudo da dinâmica de uma bacia, pois estes são agentes predisponentes à geração de condições essenciais para a ocorrência de processos erosivos, devido ao aumento da declividade das encostas em áreas naturalmente caracterizadas por elevados valores índices pluviométricos.

PerPerfil longitudinal do rio Manoel Alexandre

Perfil longitudinal do rio Manoel Alexandre com destaque o NBL com desnível abrupto.

Tabela Parâmetros Morfométricos

Parâmetros Morfométricos de algumas sub-bacias estudadas.

CONSIDERAÇÕES FINAIS
Os perfis longitudinais configuraram-se como uma análise preliminar sobre a constatação de NBLs, sendo estes a base para a análise através do cálculo do RDE; bem como os perfis transversais que subsidiaram uma análise preliminar da morfologia, demonstrando basculamentos tanto da bacia como um todo, quanto das sub-bacias que a compõe. Os aspectos da organização da rede de drenagem permitiram inferir presença de locais com acentuado controle estrutural, identificados pela presença de NBLs, assimetria de bacias, blocos basculados, e elevados índices de RDE (demonstrando a presença de trechos encachoeirados (NBLs)) e que possuem, também, estreitas relações com o basculamento de blocos de relevo. A morfometria de bacias se mostrou como uma técnica bastante eficiente para a detecção da investigação de movimentações tectônicas recentes na paisagem, servindo para corroborar com as informações qualitativas coligidas através dos simples perfis topográficos e longitudinais realizados.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICA
MONTEIRO, K. A. MISSURA, R.; SILVA, H. A.; CORREA, A. C. B. Aplicação do índice de Hack – ou Relação Declividade Extensão (RDE) – na bacia do rio Tracunhaém, Pernambuco, Brasil. Revista de Geociências, São Paulo, 2010, vol. 29, nº 4. Disponível em: http://ppegeo-local.igc.usp.br/scielo.php? script=sci_arttext&pid=S0101-90822010000400009&lng=es&nrm=iso.
ETCHEBEHERE, M.L.; SAAD, V.J.; FULFARO, V.J.; PERINOTTO, J.A.J. 2004. Aplicação do Índice “Relação Declividade-Extensão – RDE” na Bacia do Rio do Peixe (SP) para detecção de Deformações Neotectônicas. Revista do Instituto de Geociências – USP, São Paulo. v. 4, p. 43-56.
MARTINEZ, M. Aplicação de parâmetros morfométricos de drenagem na bacia do rio Pirapó: o perfil longitudinal. Dissertação (mestrado). Departamento de Geografia do Centro de Ciências Humanas, Letras e Artes da Universidade Estadual de Maringá, 2005. 96 p.
MONTEIRO FILHO, C.J. 2009. Manual técnico de geomorfologia - IBGE, Coordenação de Recursos Naturais e Estudos Ambientais. – 2. ed. - Rio de Janeiro: IBGE.
SALAMUNI, E.; EBERT, H.D.; HASUI, Y. 2004. Morfotectônica da Bacia Sedimentar de Curitiba. Revista Brasileira de Geociências, São Paulo. v.34, p.469-478.