Anais: Geomorfologia fluvial

ANÁLISE DA PAISAGEM COMO SUBSÍDIO AO ZONEAMENTO AMBIENTAL DO SETOR ORIENTAL DO BAIXO CURSO DO RIO XINGU (PA)

AUTORES
Freire, L.M. (UFPA)

RESUMO
O setor oriental do baixo curso do Rio Xingu é a região a qual sofre intensas interferências humanas que tem se processado neste território pela abertura da rodovia transamazônica (BR-230) nos anos 1970, e mais recentemente pela implantação da Usina Hidrelétrica de Belo Monte. A presente pesquisa busca evidenciar alguns desses problemas, onde a metodologia utilizada é a análise da paisagem, que se apresenta como subsídio para realização de zoneamento ambiental de bacias hidrográficas.

PALAVRAS CHAVES
Paisagem; Zoneamento Ambie; Rio Xingu

ABSTRACT
The eastern sector of low course Xingu River is a region under Strong human stresses originated by BR-230 highway in the 70’s, and recently by the implantation of Belo Monte Hydroelectric Plant. This research aims to evidence some of these problems, where the method used is landscape analysis. It is used as tool for the environmental zoning of hydrographic basins.

KEYWORDS
Landscape; Environmental Zoning; Xingu River

INTRODUÇÃO
A região amazônica é rica em feições geomorfológicas resultantes da interação sistêmica entre clima, relevo, solos, hidrologia, vegetação e ação antrópica que moldam a paisagem e a dinâmica natural (ROSS, 1997). Destacam-se ali as bacias hidrográficas, que reúnem um conjunto de elementos naturais combinados entre si, caracterizando todo o sistema desta região, acessível à intervenção humana, cada vez mais atraída pelos usos diversos. Sabe-se que as bacias hidrográficas são sistemas ambientais vulneráveis ao uso e ocupação do seu espaço, pois se tratam de sistemas abertos dinâmicos movidos pelo ciclo hidrológico. O presente projeto de pesquisa busca evidenciar alguns desses problemas, ao passo que a utilização da análise da paisagem oferece ferramenta metodológica como subsídio para realização de zoneamento ambiental de bacias hidrográficas, aqui do setor oriental do baixo curso do Rio Xingu. O território assim delimitado justifica-se por ocorrer mudanças aceleradas na paisagem.

MATERIAL E MÉTODOS
O referencial teórico da pesquisa fundamenta-se na discussão sobre o conceito de paisagem e suas relações com o estudo de bacias hidrográficas e uso de ferramentas oferecidas pela geotecnologia, além do levantamento de informações sobre região estudada. As informações referentes ao setor oriental do baixo curso do rio Xingu são adquiridas com base na análise de material bibliográfico e cartográfico produzido por instituições oficiais (tais como IBGE, IBAMA, ICMBio, CPRM, Projeto RADAM Brasil-DNPM e AAI e EIA-RIMA Aproveitamento Hidrelétrico de Belo Monte - ELETRONORTE). Estão sendo abordados no decorrer da pesquisa os seguintes elementos: a investigação da estrutura e dinâmica da paisagem; a análise das condições de uso e ocupação da terra; a avaliação ambiental dos elementos da paisagem (qualidade da água e solo); e zoneamento ambiental da paisagem. Os trabalhos de campo visam à caracterização e à avaliação do meio ambiente, abordando os seguintes aspectos: o contexto geológico-geomorfológico de formação; a caracterização e classificação da morfologia e estruturas paisagísticas; as formas de uso e ocupação do solo; as condições de acesso; a qualidade dos recursos naturais; e a fragilidade e vulnerabilidade ambiental. Haverá, também, aplicação de entrevistas à população local, órgãos e instituições públicas governamentais, a fim de se obter um levantamento dos aspectos socioeconômicos e dos principais fatores de degradação ambiental. O procedimento cartográfico constituir-se na utilização dos softwares livres Spring 5.2 e Quantum GIS 1.7.4, onde há a elaboração de mapeamento básico e temático, realizado na escala de interpretação de imagens de satélite disponíveis pelo INPE, em seu catálogo de imagens CBERS e no Projeto PRODES. A proposta de escala do mapeamento final é de 1:250.000.

RESULTADOS E DISCUSSÃO
A Região Norte do Brasil é ocupada em grande parte pela floresta amazônica e a exploração dos recursos naturais tem apresentado crescimento progressivo, evidenciado pelos índices anuais de desmatamento da mata nativa, “reflexo do modelo de desenvolvimento adotado para a Região Amazônica na década de 1970, que priorizou o crescimento econômico em detrimento da preservação ambiental e do bem-estar social” (GORAYEB, 2009, p.60). No Estado do Pará, além dos desmatamentos referentes à retirada de madeira e produção pecuária, há uma discussão a respeito da instalação de empreendimentos hidrelétricos, como o Aproveitamento Hidrelétrico (AHE) Belo Monte, na Bacia Hidrográfica do Rio Xingu, mais especificamente em seu baixo curso. A área total do rio Xingu é de aproximadamente 509.000 km², o qual se desenvolve no sentido sul-norte, desde o Estado de Mato Grosso, aproximadamente no paralelo 15º S, até o paralelo 3º S, no Estado do Pará. Está situado entre as bacias hidrográficas do rio Tapajós, a oeste, e rios Araguaia e Tocantins, a leste. (AAI Belo Monte, 2009; IBGE, 2000). Entretanto, o presente projeto apresenta como área de estudo o setor oriental do baixo curso do Rio Xingu (Fig. 01), região a qual sofre intensas interferências humanas que tem se processado neste território pela abertura da rodovia transamazônica (BR-230) nos anos 1970, e mais recentemente pela implantação da Usina Hidrelétrica de Belo Monte. De acordo com Coelho Neto (2009, p.97-98), Bacia Hidrográfica ou “bacia de drenagem é uma área da superfície terrestre que drena água, sedimentos e outros materiais dissolvidos para uma saída comum, num determinado ponto de um canal fluvial”. São assim consideradas unidades de paisagem que apresentam uma delimitação metodológica eficaz para os estudos geográficos e planos de manejo e gestão ambiental. Campos (2010, p.16) acrescenta “A bacia hidrográfica, como unidade territorial para gestão ambiental, se constitui num sistema natural regido e subordinado pela força gravitacional que a delimita nos interflúvios por meio dos fluxos de energia e massa. Estabelece limites superficiais claros, quando arbitrados os seus limites, em que as interações são integradas e proporciona uma relativa facilidade para a sua interpretação”. Sendo assim, no tocante da investigação científica, a visão sistêmica está implícita na adoção desta unidade fundamental, uma vez que envolve elementos ecológicos e sociais no entendimento da dinâmica dessa paisagem. É importante saber que existe uma estrutura hierarquizada, fazendo com que assim possam ser identificadas bacias de diferentes extensões que se interligam entre sim. Para Santana (2003, p.32) “As bacias podem ser desmembradas em um número qualquer de sub-bacias, dependendo do ponto de saída considerado ao longo do seu eixo-tronco ou canal coletor. Cada bacia hidrográfica interliga-se com outra de ordem hierárquica superior, constituindo, em relação à última, uma sub-bacia. Portanto, os termos bacia e sub-bacias hidrográficas são relativos”. O fato de ter sido delimitado o setor oriental do baixo Xingu justifica-se pelas fases de ocupação ocorrentes nesse território durantes o século XX. A primeira gerada pelo ciclo da borracha na Região Amazônica. A segunda fase se dá a partir da década de 1970, com a consolidação da BR-230, mais conhecida como Rodovia Transamazônica, e com a implantação da Política de Colonização da Amazônia, que se tratava de iniciativa do governo em busca de consolidar a ocupação territorial dos chamados “vazios demográficos”. A tendência atual continua de aumento demográfico, haja vista a instalação da Usina Hidrelétrica de Belo Monte que prevê um acréscimo de mais de 90 mil habitantes em toda a área afetada, tendo como principal município atingido Altamira (ELETRONORTE, 2009).

Sub Bacia do Baixo Xingu

Fig.01: Representação, à esquerda, da Sub Bacia do Baixo Xingu (BRASIL/MME, 2009) e Mosaico LandSat 2011 (AMZ/INPE), à direita.

CONSIDERAÇÕES FINAIS
Diante do exposto, o presente estudo tem a aspiração de contribuir para o planejamento e gestão do uso e ocupação da terra na área compreendida pela bacia hidrográfica do Xingu, em especial no setor oriental, subsidiando ao zoneamento ambiental, a partir de trabalhos de campo minuciosos e produção de mapeamento condizente com a realidade regional. O uso da bacia hidrográfica como unidade paisagística fundamental possibilita uma visão sistêmica e integrada da realidade dos seus coponentes físicos e antrópicos. Em meio a tantos transtornos ambientais, é evidente que haja a discussão em torno dessa conjunção de problemas, procurando, pois, formas de equilibrar o meio ambiente. Entre os diversos profissionais envolvidos nessa cruzada, o geógrafo tem crescente participação. O estudo das questões ambientais busca a compreensão do ser em relação ao seu entorno, isto é, da sociedade humana relacionando-se com o meio em que vive. Isto é o papel da Geografia.

AGRADECIMENTOS
Ao meu companheiro Joselito Santiago de Lima, pelo apoio ao meu crescimento profissional e ajuda nos campos desta pesquisa. Aos meus amigos geógrafos Paulo Henrique Gomes de Oliveira Sousa, Lutiane Queiroz de Almeida e Yarnel de Oliveira Campos, pelas contribuições científicas e incentivo para o desenvolvimento desta pesquisa. À Universidade Federal do Pará, campus de Altamira, pela ajuda operacional.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICA
AB´SABER, A. Os Domínio de Natureza no Brasil: potencialidades paisagísticas. São Paulo, SP: Ateliê Editorial, 2003.
BECKER, B. K.; EGLER, C. A. G. Detalhamento da Metodologia para Execução do Zoneamento Ecológico-Econômico pelos Estados da Amazônia Legal. Brasília: SAE-Secretaria de Assuntos Estratégicos/ MMA-Ministério do Meio Ambiente, 1996
BERTRAND, Georges. Paisagem e Geografia Física Global - esboço metodológico. Caderno de Ciências da Terra. São Paulo, SP: Instituto de Geografia – USP, 1972
BERTRAND, G.; BERTRAND, C. Uma Geografia transversal e de travessias: o meio ambiente através dos territórios e das temporalidades. Organizador Messias Modesto Passos. Maringá, PR: Ed. Massoni, 2007.
BOTELHO, R. G. M.; SILVA, A. S. Bacia Hidrográfica e Qualidade Ambiental. In: GUERRA, A. J. T.; VITTE, A. C. (Org.). Reflexões Sobre a Geografia Física no Brasil. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2004. p. 153 – 192.
BRASIL. DEPARTAMENTO NACIONAL DE PRODUÇÃO MINERAL (DNPM). Projeto Radam. Folha SA.22 Belém: geologia, geomorfologia, solos, vegetacäo e uso potencial da terra. Rio de Janeiro: DNPM/MME, 1974.
BRASIL. MINISTÉRIO DE MINAS E ENERGIA (MME). AAI – Avaliação Ambiental Integrada Aproveitamentos Hidrelétricos da Bacia Hidrográfica do Rio Xingu. Volumes I e II. São Paulo: Eletrobrás, 2009.
BRASIL. Plano Amazônia Sustentável – PAS: diagnóstico e estratégia, v.1. Brasília: Ministério da Integração Nacional; Ministério do Meio Ambiente, 2004.
CAMPOS, Y. de O. Gestão Ambiental: Complexidade Sistêmica em Bacia Hidrográfica. Tese (Doutorado em Geografia) Programa de Pós-Graduação em Geografia – Instituto de Geografia. Uberlândia, UFU, 2010.
ELETRONORTE. Aproveitamento Hidrelétrico Belo Monte: Estudo de Impacto Ambiental. Brasília: Centrais Elétricas do Norte do Brasil (ELETRONORTE), 2009.
EMBRAPA. Centro Nacional de Pesquisa de Solos. Sistema brasileiro de classificação de solos. 2. ed. Rio de Janeiro: Embrapa Solos, 2006. 306 p.
GORAYEB, A.; LOMBARDO, M. A; PEREIRA, L. C. C. Condições Ambientais em Áreas Urbanas da Bacia Hidrográfica do Rio Caeté – Amazônia Oriental – Brasil. Revista da Gestão Costeira Integrada 9(2), 2009. p. 59-70.
GORAYEB, A. Análise Integrada da Paisagem na Bacia Hidrográfica do Rio Caeté – Amazônia Oriental – Brasil. Tese (Doutorado em Geografia) Universidade Estadual Paulista, Instituto de Geociências e Ciências Extatas. Rio Claro: UNESP, 2008.
GUERRA, A. T.; GUERRA, A. J. T. Novo dicionário geológico – geomorfológico. Rio de Janeiro, RJ: Bertrand Brasil, 2001.
MENDONÇA, F.; KOZEL, S. (org.) Elementos de Epistemologia da Geografia Contemporânea. Curitiba, PR: Editora da UFPR, 2004.
MONTEIRO, C. A. F. Geossistemas: A História de uma Procura. São Paulo, SP: Contexto, 2000.
NASCIMENTO, F. R.; SAMPAIO, J. L. F. Geografia Física, Geossistemas e Estudos Integrados da Paisagem. Revista Casa da Geografia de Sobral, Sobral, v. 6/7, n.1, p.167-179, 2004/2005.
PROJETO RADAMBRASIL. Levantamento integrado dos recursos naturais do Brasil. Ministério das Minas e Energia-MME, Rio de Janeiro, 1981.
RODRIGUEZ, J. M.; SILVA, E. V. DA; CAVALCANTI, A. P. B. Geoecologia das Paisagens: uma visão geossistêmica da análise ambiental. Fortaleza: Edições UFC, 2004.
RODRIGUEZ, J. M. M.; SILVA, E. V; LEAL, A. C. Planejamento Ambiental em Bacias Hidrográficas. In: SILVA, E. V.; RODRIGUEZ, J. M. M.; MEIRELES, J. A (org.). Planejamento Ambiental e Bacias Hidrográficas. Fortaleza: Edições UFC, 2011.
ROSS, J. L. S. Ecogeografia do Brasil: subsídios para o planejamento ambiental. São Paulo: Oficina de Textos, 2006.
______. Geomorfologia, Ambiente e Planejamento. São Paulo: Ed. Contexto, 1997.
ROSSATO, M. S.; BELLANCA, E. T.; FACHINELLO, A. (org.). Terra - feições ilustradas. Porto Alegre: Editora da UFRGS, 2003.
SANTANA, D.P. Manejo Integrado de Bacias Hidrográficas. Sete Lagoas: Embrapa Milho e Sorgo, 2003.
SAUER, C. O. A Morfologia da Paisagem. In. CORRÊA, R. L.; ROSENDAHL, Z. (org.) Paisagem, Tempo e Cultura. Rio de Janeiro, RJ: EdUERJ, 2004, pp. 12-74.
SCHNEIDER, et al. Amazônia Sustentável: limitantes e oportunidades para o desenvolvimento rural. Brasília: Banco Mundial; Belém: Imazon, 2000.
SOTCHAVA, V. B. Por uma teoria de classificação de geossistemas da vida terrestre. São Paulo: Instituto de Geografia USP, 1978.
______. O estudo de geossistemas. São Paulo: Instituto de Geografia USP, 1977.
TRICART, J. Ecodinâmica. Rio de Janeiro, RJ: IBGE, SUPREN, 1977.
VASQUES, M. L.; ROSA-COSTA, L. T. (Orgs.). Geologia e Recursos Minerais do Estado do Pará: Sistema de Informações Geográficas – SIG: texto explicativo dos mapas Geológico e Tectônico e de Recursos Minerais do Estado do Pará. Organizadores, Escala 1:1.000.000. Belém: CPRM, 2008.