Anais: Geomorfologia fluvial

PRODUÇÃO DE SEDIMENTOS NA BACIA HIDROGRÁFICA DO RIO CUBATÃO DO NORTE – SC

AUTORES
Gonçalves, F.T. (UFPR) ; Modesto, M.E.P. (UFPR) ; Haak, L. (UFPR) ; Oliveira, F.A. (UFPR)

RESUMO
O estudo visa o entendimento do comportamento hidrossedimentológico da bacia hidrográfica do rio Cubatão do Norte, na região nordeste de Santa Catarina, por meio do monitoramento mensal da vazão, turbidez e carga de sedimentos suspensos, numa relação com o uso do solo. Os resultados mostraram variação das taxas de transporte ao longo da bacia devido às atividades identificadas. O trabalho estimou uma carga média de transporte sedimentar de 1.978 kg/dia na área de estudo.

PALAVRAS CHAVES
sedimentos suspensos; uso do solo; turbidez

ABSTRACT
The objective of study is to understand the hydrosedimentological behavior of the Cubatao Norte watershed, in northeast Santa Catarina, through monthly monitoring of flow, turbidity and suspended sediment concentration and its relation to land use. The results show a variation in sediment transport along the basin due to the human activities. The study estimates an average sediment transport of 1.978 kg / day in the study area.

KEYWORDS
suspended sediments; land use; turbidity

INTRODUÇÃO
A Bacia Hidrográfica do Rio Cubatão do Norte – (BHRCN) - localiza-se a nordeste de Santa Catarina, possui 492 km², sendo 80% pertencente ao município de Joinville, e o restante a Garuva. A área pesquisada possui 406km² e abrange o médio e alto rio Cubatão, com ponto jusante a aproximadamente 16 km de sua foz, na Baía da Babitonga. A BHRCN se constitui o mais importante manancial de abastecimento da cidade de Joinville, atendendo aproximadamente 70% da demanda de água da população. No alto curso da bacia há atividade de silvicultura de Pinus. No baixo curso do rio Quiriri, principal afluente do rio Cubatão, e na zona rural do médio curso do Cubatão, destacam-se a bananicultura e piscicultura. A agricultura na bacia ocorre principalmente do médio ao baixo curso do rio Cubatão desde o final do século XIX, com predominância da pequena propriedade familiar, que utiliza as águas dos rios para a produção de bananas, hortaliças e culturas de subsistência sazonais (Pereira, 2005). Ações antrópicas podem agravar os processos erosivos. O material erodido de uma bacia pode causar o assoreamento de rios e reservatórios. Além disso, as partículas transportadas pela água, em uma área agrícola, podem estar impregnadas de defensivos agrícolas e contaminar as águas dos rios. O desmatamento e a erosão dos solos podem provocar o desaparecimento de mananciais, bem como acentuar os efeitos das inundações (Guerra, 1994). O entendimento das causas e efeitos dos fenômenos atuantes nas bacias hidrográficas torna-se necessário para que haja um planejamento regional correto, e assim permita predizer as consequências de qualquer alteração no sistema ecológico da bacia hidrográfica (Christofoletti, 1981). Neste âmbito, a presente pesquisa tem como objetivo entender o funcionamento da dinâmica sedimentar fluvial na bacia do rio Cubatão do Norte, à luz do uso do solo.

MATERIAL E MÉTODOS
Efetuou-se coletas de amostras de água para a quantificação dos sedimentos em suspensão e leitura de turbidez em 4 pontos distribuídos ao longo da bacia, em caráter mensal, no período de agosto de 2011 a maio de 2012.Os pontos de coleta foram distribuídos de modo a abranger os três compartimentos topográficos da bacia: planalto catarinense, Serra do Mar e planície costeira. O ponto 1 situa-se 28 km a jusante da nascente do rio Cubatão do Norte, inserido no planalto catarinense; o ponto 2 localiza-se em ambiente próximo à escarpa da Serra do Mar, no maior tributário do canal principal, o rio Quiriri; o ponto 3 encontra-se logo após a confluência dos rios Quiriri e Cubatão; o ponto 4, está localizado junto à barragem do canal de derivação do rio Cubatão, em ambiente de planície costeira.A coleta de amostras foi realizada segundo adaptação do método de Igual Incremento de Largura (IIL) em amostrador adaptado do modelo isocinético modelo US DH-81 (Oliveira, 2006). A medição de vazão ocorreu somente no ponto 4, onde há uma barragem composta por 3 vertedouros. Utilizou-se uma equação para vertedouro retangular com contração (Santos et al., 2001 apud Oliveira, 2006), a qual permite a mensuração da vazão com a tomada da altura da coluna d´água.Uma vez coletadas, as amostras são transferidas do amostrador para garrafas plásticas tipo PET e levadas para análises laboratoriais.Para a quantificação da carga de sedimentos suspensos (CSS) utilizou-se o método adaptado da proposta de Carvalho (2000). Foram filtradas amostras de 250ml em membranas de éster de celulose de 0,45µm, capazes de reter argila fina. Realizou-se adicionalmente a leitura da turbidez média das amostras de cada ponto de coleta.Para análises de uso do solo utilizou-se o mapeamento efetuado via classificação supervisionada por Oliveira (2006).

RESULTADOS E DISCUSSÃO
Durante o período de pesquisa foram coletadas 71 amostras, sendo 31 de frequência diária nos meses de novembro e dezembro de 2011. Observou-se que o material retido nas membranas equivale às frações silte e argila. Diversos autores convergem ao afirmar que a predominância destas partículas é favorável a uma boa relação turbidez x CSS (Geraldes, 1984 apud Guimarães, 2010). A relação foi empregada em 67 amostras. Obteve-seforte correlação positiva, com coeficiente de 94%, tornando satisfatório o uso desta variável para análise de variação da CSS.A bacia foi dividida em 4 sub-bacias a partir dos pontos de coleta. Apesar de as sub-bacias 3 e 4 serem a jusante das anteriores, levou-se em conta as sub-bacias de modo independente, uma vez que as respectivas áreas de entorno exercem maior influência sobre os pontos de coleta. (Figura 1). A área compreendida por cada classe de uso e cobertura do solo nas sub-bacias está representada na Figura 2. Percebe-se a grande presença de campos naturais nas sub-bacias 1 e 2, em função da altitude elevada destas áreas. Por conta dos solos rasos e da presença constante de vento e neblina, os campos de altitude apresentam vegetação herbácea e rasteira (White, 1963, apudKoehler, 2001). A classe mata é majoritária, havendo variações entre as sub-bacias, com ocorrência de densas florestas primárias e secundárias (Oliveira, 2006). A silvicultura de Pinus sp. abrange grandes áreas no trecho de planalto catarinense da sub-bacia 1. A classe agricultura e pastagem, caracterizada por cultivo de banana, mandioca, cana-de-açúcar e pequenas pastagens, prevalece na sub-bacia 4. Com base nos dados apresentados foram correlacionadas a CSS de cada sub-bacia e a área proporcional das classes mata e campos. Estas classes foram agrupadas por serem nativas da região. A correlação foi, como o esperado, moderada negativa, equivalente a 79% negativo. A princípio as classes agricultura/pastagem e reflorestamento foram agrupadas por serem associadas a atividades antrópicas. A relação destas classes e CSS obteve correlação moderada positiva de 74%. Com intuito de comparação, foi relacionada CSS e a classe agricultura/pastagem. Obteve-se correlação forte positiva de 98%, evidenciando a influência da agricultura e pastagens na produção e transporte de sedimentos suspensos e mostrando uma tendência de não relação entre silvicultura de Pinus sp. e produção de sedimentos. Com o intuito de comprovar esta hipótese, calculou-se a produção específica de sedimentos (PES) para cada sub-bacia, numa adaptação do método do cálculo de vazão específica. A PES foi obtida com a divisão da CSS média pela área de cada sub-bacia (Figura 2). Há, entre as sub-bacias 1, 2 e 3, similaridade no valor médio de PES, comprovando que a diferença proporcional de uso do solo entre essas bacias não caracteriza nenhuma fonte de produção significativa. Deve-se ressaltar a grande abrangência da silvicultura na sub-bacia 1 (10,7%), enquanto que nas sub-bacias 2 e 3 esta atividade é muito baixa ou nula.A sub-bacia 4 apresenta aumento de PES de 380% em relação às demais, coincidindo com a área proporcional de agricultura e pastagem 394% superior às sub-bacias 1, 2 e 3. O presente estudo conclui, portanto, que a silvicultura de Pinus sp. empregada na bacia hidrográfica do rio Cubatão do Norte não contribui significativamente para a produção de sedimentos suspensos transportados pelos rios da bacia e que o valor de 1.978 kg de CSS diária da bacia está possivelmente associado à pouca proteção do solo proporcionada pelas pequenas pastagens, plantações de banana, cana-de-açúcar e mandioca localizadas na planície costeira da BHRCN.

Figura 1

Localização da área da pesquisa e sub-bacias estudadas.

Figura 2

CSS média, proporção de uso pela área e PES para cada sub-bacia

CONSIDERAÇÕES FINAIS
Os resultados apresentam uma forte relação entre a produção de sedimentos e o uso da terra. Em ambientes mais preservados como as sub bacias 1, 2 e 3 a produção de sedimentos é menor, na sub bacia 4 a produção de sedimentos tem um aumento significativo estando relacionada principalmente com a atividade antrópica que ocorre nesta região. A metodologia apresentada demonstrou um resultado satisfatório ao evidenciar a relação que ocorre entre a produção de sedimentos em suspensão e a ocupação desta bacia hidrográfica. Estudos hidrossedimentológicos propiciam informações de cunho qualitativo e, desta forma, se prestam como instrumento de prevenção, norteando a definição de políticas conservacionistas para uma gestão integrada dos recursos naturais. Novas abordagens vêm sendo empregadas no estudo da bacia, como a caracterização da carga de fundo, expandindo ainda mais o número de dados e possibilitando um melhor aprofundamento da área em estudo.

AGRADECIMENTOS
Ao CNPq, à Fundação Araucária e à CAPES pelo apoio financeiro na forma de bolsas de estudos. À Comfloresta, pelo apoio logístico.Aos colegas do Laboratório de Engenharia Ambiental (LABEAM) do Departamento de Hidráulica e Saneamento da UFPR pela solidariedade e presteza, assim como à Profª. Drª. Maria Cristina Braga por ceder este espaço essencial aos estudos aqui publicados.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICA
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