Anais: Geotecnologias e mapeamento geomorfológico

Compartimentação geomorfológica das bacias hidrográficas dos rios Macacu e Caceribu - Recôncavo da Baixada da Guanabara /RJ

AUTORES
Dantas, M.E. (CPRM - SERVIÇO GEOLÓGICO DO BRASIL) ; Renk, J.F.C. (CPRM - SERVIÇO GEOLÓGICO DO BRASIL) ; Shinzato, E. (CPRM - SERVIÇO GEOLÓGICO DO BRASIL) ; Calderano, S.B. (EMBRAPA SOLOS) ; Vargas, L. (CPRM - SERVIÇO GEOLÓGICO DO BRASIL) ; Aranda, C.C.C. (CPRM - SERVIÇO GEOLÓGICO DO BRASIL)

RESUMO
A geomorfologia das bacias dos rios Macacu e Caceribu revela um mosaico de paisagens condicionado pela tectônica Cenozoica e pela variação do nível relativo do mar. Sua compartimentação compreende 10 unidades geomorfológicas: escarpa da serra dos Órgãos; espigão das serras de Santana e da Botija; maciços da Região dos Lagos; maciços alcalinos de Tanguá, Rio Bonito e Soarinho; alto platô da serra dos Órgãos; superfície aplainada da Região dos Lagos; bacia de Macacu; e baixada da Baía de Guanabara

PALAVRAS CHAVES
Mapeamento Geomorfológico; Planejamento Territorial; Bacia da baía deGuanabara

ABSTRACT
The geomorphology of the Macacu and Caceribu river basins reveals a landscape mosaic controlled by Cenozoic tectonics and sea-level fluctuations. Were described ten geomorphological units: Serra dos Órgãos scarp range; Lagoon Region Coastal Massifs; Santana and Botija Ridges; Tanguá, Rio Bonito and Soarinho alkaline intrusive massifs; Lagoon Region Erosion Surface; Macacu Basin tablelands; and Guanabara Bay lowlands.

KEYWORDS
Geomorphological Mapping; territorial management; Guanabara Bay basin

INTRODUÇÃO
A área de estudo, com cerca de 1.640 km2 de extensão, situa-se no segmento oriental da Região Metropolitana do Rio de Janeiro e caracteriza-se por uma grande diversidade fisiográfica (desde mangues e brejos das planícies fluviomarinhas alagáveis até os cimos e cumes das escarpas e altos platôs revestidos por floresta atlântica e campos de altitude). A geomorfologia e a evolução tectônica do Sudeste do Brasil, no qual encontra-se inclusa a área compreendida pela bacia do rio Macacu foi amplamente estudada desde a década de 1940 por diversos pesquisadores, tais como Ruellan (1944), Ab’Saber & Bernardes (1956), Lamego (1964), Asmus & Ferrari (1978), Riccomini (1989) e Almeida & Carneiro (1998), dentre os principais. Por outro lado, a bacia do rio Macacu testemunhou distintas formas de intervenção humana no ambiente, que remontam desde meados do século XVI (Lamego, 1964; Amador, 1997; Cabral, 2007). A área de estudo situa-se relativamente próxima da cidade do Rio de Janeiro, compondo a porção mais afastada de sua hinterlândia (Abreu, 1997). Sendo assim, durante estes cinco séculos, a bacia do rio Macacu foi submetida a sucessivas alterações de suas paisagens naturais. A bacia do rio Macacu exibe um histórico legado de drásticas e cumulativas transformações ambientais que estão firmemente impressas em sua paisagem geográfica. A implantação de um pólo petroquímico de grandes dimensões (capaz de processar mais de 300 mil barris diários de petróleo pesado) consiste em mais um importante capítulo de transformação ambiental dessa bacia hidrográfica. Deste modo, o mapeamento das unidades geomorfológicas da bacia do rio Macacu é de grande relevância para avaliação do impacto decorrente de cada tipo de intervenção e para subsidiar propostas básicas de diagnóstico ambiental e de planejamento territorial. A análise de cada uma dessas unidades deve abranger processos atuantes e feições erosivas e deposicionais inerentes, com o intuito de se obter um produto de caráter aplicado.

MATERIAL E MÉTODOS
A elaboração deste estudo está claramente inspirado na metodologia de mapeamento geomorfológico empreendido por Dantas (2000) no âmbito do Projeto Rio de Janeiro, este executado pela CPRM – Serviço Geológico do Brasil. Deste modo, objetiva-se, primeiramente, proceder a uma análise geomorfológica da área de estudo enfatizando a gênese e evolução do conjunto das formas de relevo. Para definição e mapeamento das unidades geomorfológicas do estado do Rio de Janeiro, adotou-se a metodologia de Ross (1990). Foram utilizados apenas os dois primeiros taxons por ele propostos, com base em interpretação de mosaico de ortofotos digitais acopladas com modelo digital de terreno em escala 1:50.000. Dessa forma, foram individualizadas as unidades morfoestruturais e morfoesculturais na área de estudo. Com base no mosaico de ortofotos digitais acopladas com modelo digital de terreno e com o apoio de cartas topográficas (escala 1:50.000) e fotografias aéreas (USAF – escala 1:60.000), foram identificados e delimitados os sistemas de relevo existentes na Bacia do rio Macacu. Juntamente com o mapeamento desses sistemas, foram calculados, por amostragem, em áreas selecionadas que demonstram um padrão típico para cada sistema de relevo, os seguintes parâmetros morfométricos: amplitude altimétrica; gradiente; geometria de topos e vertentes; densidade de drenagem; padrão de drenagem e coberturas inconsolidadas. Essa abordagem proposta por Ponçano et al. (1979), consiste na separação, por fotoanálise, de conjuntos de formas de relevo com textura e padrão semelhantes. A partir das informações obtidas através da etapa de aferição de modelos em campo, realizou-se o refinamento da interpretação preliminar das ortofotos digitais com MDT, através da correção dos modelos de sistemas de relevo propostos, quando estes não conferiam com as observações de campo. Todo mapeamento geomorfológico foi executado em forma de SIG com o uso do Programa ArcGis 9.3.

RESULTADOS E DISCUSSÃO
O registro de imponentes escarpamentos com desnivelamentos, por vezes superiores a 2.000m, alternados com depressões e bacias sedimentares (Bacias de Itaboraí e de Macacu), reflete uma marcante influência da tectônica na compartimentação do relevo. (Almeida, 1976; Riccomini, 1989). Silva & Ferrari (1997), baseados numa compartimentação geomorfológica de toda a Baixada Fluminense e áreas montanhosas adjacentes e o reconhecimento de extensos lineamentos estruturais de direções NE-SW e ENE-WSW, enfatizaram o papel da tectônica Cenozóica na geração de uma vasta depressão, representada pela porção central da bacia hidrográfica do rio Macacu, parcialmente entulhada pela sedimentação flúvio-marinha Quaternária (Monteiro et al., 1974). A Escarpa da Serra dos Órgãos consiste em uma muralha montanhosa, alçada por tectônica, que delimita o recôncavo da bacia da baía da Guanabara, entre Petrópolis e Nova Friburgo, como um paredão monolítico que sustentam cotas entre 1.200 e 2.000 metros, até as cabeceiras do rio Macacu. O Espigão das Serras de Santana e Botija consiste em um proeminente alinhamento serrano, de orientação SSW-NNE que se projeta da serra do Mar, próximo às cabeceiras do rio Macacu, em direção às baixadas litorâneas, sustentando cotas entre 500 e 900 metros. Este alinhamento montanhoso sofreu um recuo erosivo menos acentuado em relação ao escarpamento principal da serra do Mar devido ao fato de estar protegido à retaguarda dos maciços intrusivos alcalinos. Os Maciços da Região dos Lagos consistem num conjunto de alinhamentos serranos que se prolongam a leste da baía da Guanabara. Atuam como zona dispersora de águas entre o relevo colinoso que converge para a bacia do rio Caceribu e as baixadas confinadas dos sistemas lagunares de Piratininga-Itaipu, Maricá e Saquarema, com elevações sempre superiores a 300m, com picos que atingem mais de 800m. Os Maciços Alcalinos Intrusivos de Soarinho, Tanguá e Rio Bonito compreendem um conjunto de maciços montanhosos de rochas alcalinas geradas num período de atividade vulcânica entre o final do Cretáceo e o início do Terciário (Almeida, 1976). No estado do Rio de Janeiro, esse alinhamento magmático de direção WNW-ESE estende-se do maciço do Itatiaia à ilha de Cabo Frio. Esses maciços intrusivos têm, em geral, uma forma dômica, parcialmente ou bastante erodidos, demonstrando uma drenagem radial e centrífuga, com alta densidade de drenagem. Os Altos Platôs da Serras dos Órgãos situam-se ao longo de uma superfície composta pelos topos mais elevados da serra dos Órgãos, entre Petrópolis e Teresópolis, atingindo altitudes superiores a 2.000m. Nesta área salienta-se uma extensa superfície rochosa aplainada ou com solos muito rasos, dominada por campos de altitude e relevo praticamente plano, bruscamente delimitada por paredões subverticais. A superfície aplainada da Região dos Lagos consiste de colinas de baixa amplitude de relevo, entre 50 e 120 metros de altitude, localizados a leste da baía da Guanabara e compreendidos entre as os maciços costeiros e a escarpa da serra do Mar. Destacam-se extensas planícies fluviais e rampas de alúvio-colúvio em compartimentos alveolares nos fundos de vales que cortam essa superfície. Os tabuleiros da Bacia de Macacu consistem de colinas tabulares e alongadas de baixa amplitude de relevo e extensas planícies fluviais resultantes da dissecação dos tabuleiros. Situadas no recôncavo da baía da Guanabara, as colinas tabulares atingem cotas entre 30 e 50m, enquanto as colinas do substrato pré-cambriano adjacente atingem elevações entre 80 e 150m. A Baixada da Baía da Guanabara consiste em importantes áreas de acumulação flúvio-marinha que preenchem a vasta depressão do recôncavo dessa baía. Resultam de uma sucessão de eventos de regressão e transgressão do nível relativo do mar que modelaram sua morfologia original e que, posteriormente, foi modificada pela intervenção humana (Amador, 1997).

CONSIDERAÇÕES FINAIS
A expansão urbana de São Gonçalo e Itaboraí tem acarretado em graves problemas de natureza socioambiental decorrentes do expressivo “inchaço populacional” verificado nas últimas décadas. A degradação ambiental instalada é proveniente da má disposição de resíduos sólidos, da falta de saneamento básico, do desmatamento das encostas, do assoreamento dos canais e da ocupação inadequada do solo. Todos esses fatores incrementam o assoreamento da baía da Guanabara. Tal cenário ambiental pode ser agravar com a instalação da Comperj na região caso não haja um sério planejamento e ordenamento do crescimento das cidades com a implantação de obras estruturas de infra-estrutura urbana, de transporte viário e de logística. Deve-se enfatizar sobretudo, cuidados preventivos sobre os recursos hídricos, tendo em vista que a área de captação de água do sistema Imunana-Laranjal e os manguezais da APA de Guapimirim, situam-se imediatamente a jusante da área da instalação do pólo industrial da Comperj.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICA
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