Macro Captura Fluvial no nordeste do Planalto Central: resultados preliminares

Autores

Cherem, L.F.S. (UFG) ; Zancopé, M.H.C. (UFG) ; Bayer, M. (UFG)

Resumo

Nesse trabalho é identificada, caracterizada e analisada uma macro captura fluvial, da ordem de 3.500km², na borda interplanáltica do NE do Planalto Central. Os resultados demonstram que as grandes capturas não se restringem a dinâmica de margem passiva e evidenciam que o mesmo modelo evolutivo dessas margens pode ser aplicado a essa captura. A frente da escarpa recuou ~6km, tendo canal com fluxo invertido e incisão do canal capturado ao longo de 50km rumo a montante.

Palavras chaves

morfodinâmica; escarpa; Planalto Central

Introdução

As capturas fluviais são feições que, normalmente, ocorrem próximas aos limites de bacias hidrográficas com altimetria média e níveis de base diferentes, sendo marcadas por um vale seco no interflúvio e um cotovelo na drenagem principal oposta a esse vale. Essas feições são evidências de uma mudança abrupta da direção no fluxo de um canal que passa a ser drenado por uma bacia hidrográfica diferente de sua bacia original. No Brasil, grande parte das capturas fluviais já estudadas é localizada ao longo do relevo serrano do sul-sudeste brasileiro (Planaltos e Serras do Atlântico Leste-Sudeste), compreendido pela Província Geotectônica Mantiqueira [1], por, em geral, essas capturas estarem associadas à morfodinâmica de margem passiva com controle do nível de base geral (mar) [2]. Embora essas feições sejam mais comumente associadas à morfodinâmica de margens passivas, nas proximidades das coordenadas -16,5°; -47,5° (divisas de GO, DF e MG), existem feições típicas a uma captura fluvial. Essa área localiza-se nos limites das grandes bacias hidrográficas dos rios São Marcos, afluente do Rio Paraná, e Preto, afluente do Rio São Francisco (FIG1), estando no limite entre diferentes unidades de relevo: (i) o Planalto Central Goiano/Chapadão Ocidental do São Francisco, com cotas altimétricas médias de ~900m, e (ii) a Depressão Sanfranciscana, com cotas de ~550m. Assim, esse trabalho objetiva identificar, caracterizar e inserir essa captura fluvial no contexto morfodinâmico do Continente Sulamericano.

Material e métodos

A metodologia adotada é semelhante a utilizada na análise realizada por Cherem et al. [1], compreendendo a descrição das feições observadas nas folhas topográficas e daquelas observadas em imagens de satélite de alta resolução. A análise cartográfica baseou-se na interpretação de modelos digitais de elevação (MDE) gerados a partir de dados SRTM e de folhas topográficas de escala 1:100.000 do IBGE. Na análise cartográfica foi descrita a atual geometria da rede de drenagem por meio da interpretação de perfis longitudinais e transversais dos canais fluviais. A descrição das imagens de satélites concentrou-se na descrição dos vales fluviais e dos pontos de captura, sendo descritos os vales e os canais adjacentes aos canais capturados, conforme metodologia proposta por Oliveira e Queiroz Neto [3]. A morfologia dessas capturas foi descrita individualmente, sendo consideradas as características do canal captor, do canal capturado, do canal capturado com fluxo invertido e do vale seco.

Resultado e discussão

O canal capturado corresponde à cabeceira decapitada do Rio S. Marcos (pertencente à bacia do Rio Paraná) que foi apreendido por uma das cabeceiras do Rio Preto (bacia do Rio São Francisco) (FIG1). O canal captor flui sobre a escarpa por 3,5 km entre a crista (790 m) e a base (660 m). Embora o canal captor flua sobre a escarpa, o ponto de inflexão da drenagem superior, o que indica a ocorrência de incisão fluvial do canal capturado (FIG2) e o consequente recuo da escarpa em cerca de 0,6 km. Por sua vez, as cabeceiras de drenagem ainda se encontram na mesma cota altimétrica que o planalto superior (950 m) e as alterações atingem 50 km de distância do ponto de captura. Essas feições revelam como o canal capturado é afetado pelo novo nível de base, enquanto suas cabaceiras ainda preservam seus vales e encostas semelhantes ao trecho não capturado da bacia do Rio S. Marcos. A captura apresenta, além do curso principal capturado, a inversão de um trecho de 9km da drenagem de seu vale decapitado (beheaded valley) com canal desajustado (underfit stream) (FIG2). O trecho do canal desajustado do Rio S. Marcos ultrapassa 10km de extensão, quando esse canal tem padrão entrelaçado. Nos mapas geológicos CPRM [4] de escala regional, as vertentes das bacias capturada e decaptada são recobertas por coberturas detríticas consideradas neógenas. As configurações morfológica e morfográfica do relevo regional atestam para a existência da captura fluvial com cerca de 3.500km² de área, podendo ser classificada como uma hierárquica espacial macro e, inerentemente, uma escala temporal superior ao Quaternário (107a). As características correspondem ao mesmo estágio da Captura de Carandaí (MG) [1], um estágio intermediário no modelo evolutivo proposto por Cherem et al. [1]. Essa captura pode ser associada a abertura da Depressão Sanfranciscana, a um dos ciclos erosivos de formação das superfícies aplainadas Sulamericana 1 ou 2 [5]. Observa-se ainda que essa captura é evidência que a bacia do Rio São Francisco tem ganhado área sobre a bacia do Rio Paraná. Assim, essa bacia tem perdido área para a bacia do Rio Doce [6], bacia do Rio Paraíba do Sul [7] e também do Rio São Francisco.

FIgura 1

Localiação da área de estudo

Figura 2

Compartimentação da captura fluvial estudada

Conclusões

Essa existência dessa captura no limite de grandes bacias hidrográficas no interior do continente abertura abre discussão para entender os controles tectônico e climáticos na evolução de escarpas, por os resultados indicarem que, em geral, as grandes capturas fluviais são comuns nos limites das bacias hidrográficas brasileiras. Assim, permite novas frentes de pesquisa científica para entender a dinâmica erosiva de longo termo em interflúvios continentais. No ponto de captura existe a represa de uma pequena central hidroelétrica, o que inviabiliza reconhecer e identificar características morfológicas e faciológicas dos canais envolvidos na captura, assim, a interpretação se atem a imagens de satélites anteriores a instalação dessa represa.

Agradecimentos

Referências

[1] CHEREM, LFS et al. O papel das capturas fluviais na morfodinâmica de bordas interplanalticas do sudeste do Brasil. Revista Brasileira de Geomorfologia, v.14, n.4, p.299-308, 2013.
[2] SUMMERFIELD, M. Global Geomorphology: na introduction to the study of landforms. London, Longman. 538p, 1991.
[3] OLIVEIRA, D.; QUEIROZ NETO, J. P.. Evolução do relevo na Serra do Mar no estado de São Paulo a partir de uma captura fluvial. GEOUSP - Espaço e Tempo, v. 22, p. 73-88, 2007.
[4] CPRM, 2003. Mapa geológico do estado de Minas Gerais. CPRM, Belo Horizonte.
[5] VALADÃO, R.C. Evolução de longo-termo do relevo do Brasil oriental desnudação, superficies de aplanamento e soerguimentos crustais. Tese de Doutorado, UFBA, Salvador, 243 p., 1998.
[6] SALGADO, A.A.R. et al. . Estudo da evolução da escarpa entre as bacias do Doce/ Paraná em Minas Gerais através da quantificação das taxas de desnudação, Revista Brasileira de Geomorfologia, v. 13, n. 2, 213-222, 2012.
[7] CHEREM, L.F.S. et al. Lorg-term relief evolution of denudational escarpments in Southeastern Brazil. Geomorphology, 173-4, 118-127. 2012.


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