ANÁLISE DE IMPACTOS MORFOLÓGICOS DE TEMPESTADE E RESILIÊNCIA DE PRAIAS ARENOSAS DO LITORAL CENTRO-NORTE DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO

Autores

Maluf, V. (UNIVERSIDADE FEDERAL FLUMINESE) ; Figueiredo, M.S. (UNIVERSIDADE FEDERAL FLUMINESE) ; Rocha, T.B. (UNIVERSIDADE DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO)

Resumo

O principal objetivo deste trabalho é verificar, por meio da análise de parâmetros morfométricos extraídos de perfis topográficos transversais, a resiliência de trechos expostos de quatro praias arenosas do litoral centro-norte fluminense a partir dos impactos morfológicos de uma ressaca excepcional. Os trechos foram classificados como resilientes ou não resilientes e concluiu-se que praias refletivas se mostraram menos resilientes a impactos de tempestades do que praias dissipativas.

Palavras chaves

Morfodinâmica de praias; impactos de tempestade; resiliencia

Introdução

As praias representam subambientes da área costeira, caracterizando-se como sistemas abertos altamente dinâmicos sujeitos a trocas constantes de matéria e energia por forçantes oceanográficas. Neste sentido, ondas geradas por tempestades excepcionais são consideradas as principais causadores de alterações morfológicas a curto prazo, repercutindo, muitas vezes, em danos a edificações e infraestruturas. A área de estudo conta com 16 pontos de monitoramento contínuo (PMCs) e consiste nas praias de Cabo Frio (6 PMCs), Peró (4 PMCs), Costa Azul (3 PMCs) e Mar do Norte (3 PMCs). Estas prais estão localizadas no litoral centro-norte do Estado do Rio de Janeiro, que está sob constante influência da Célula de Alta Pressão do Altântico Sul, e por isso predominam os ventos de leste e nordeste (alíseos) e ondas de sul-sudeste durante boa parte do ano (FERNANDEZ, 2008 e FERNANDEZ et al., 2008). Tais condições são associadas a situações de tempo bom, de modo que inversões nos padrões de ventos e ondas em direção ao quadrante sul estão ligados à passagem de sistemas frontais, associados ao fortalecimento Anti- Ciclone Subtropical do Atlântico Sul e mais frequentes durante o inverno (RODRIGUES et al., 2004, BULHÕES et al., 2010 e FERNANDEZ et al., 2011). Em tais ocasiões, podem ser geradas eventuais tempestades e ressacas, cujos efeitos de erosão costeira podem se reverter em impactos sociais e econômicos na orla (RODRIGUES et al., 2004). Assim, os principais objetivos deste trabalho são: avaliar os impactos morfológicos causados por uma ressaca excepcional ocorrida em Abril de 2010 em trechos expostos da área de estudo e verificar as condições de resiliência.

Material e métodos

A metodologia de trabalho consistiu na análise dos impactos morfológicos decorrentes da ressaca de Abril de 2010 e recuperação posterior a partir de dados morfométricos extraídos de perfis topobatimétricos tranversais à linha de costa. A aquisição de dados em campo foi realizada com Estação Total (modelo Trimble Series 5500) e haste com prisma. A partir de pontos iniciais associados à referenciais de nível (RNs) pré-estabelecidos, a coleta de dados contemplou as feições da parte emersa, extendendo-se à zona submarina adjacente. Em laboratório os dados topográficos foram processados em Microsoft Office Excel 2003. As cotas dos RNs foram amarrados ao nível médio do mar, conforme a metodologia sugerida por Muehe (2003). Para este trabalho foram selecionados os pontos mais expostos de cada arco de praia da área de estudo às ondulações vindas do quadrante sul. São os seguintes: Ponto 6 da Cabo Frio; Ponto Norte do Peró; Ponto 5 de Costa Azul; Ponto 3 de Mar do Norte. Para o estudo da resiliência das praias estudadas foram definidos os seguintes parâmetros morfométricos: Posição da crista da berma: Distância entre a crista da berma e o RN. Limite do pós-praia: Distância do RN ao ponto de contato entre a berma e a feição de estabilidade que delimita seu limite interno (dunas frontais, vegetação, etc.). O período considerado para a análise dos dados está compreendido entre Fevereiro de 2010 e Março de 2013, de maneira que os resultados, discussões e conclusões apresentadas são referentes apenas a este intervalo de tempo. Conforme os resultados, os trechos selecionados foram classificados da seguinte maneira: Resiliente: Situação de recuperação total das feições morfológicas da praia. Houve retorno às condições pré-ressaca dos parâmetros considerados. Não resiliente: Situação de recuperação parcial ou não recuperação das feições morfológicas da praia. Não houve retorno às condições pré-ressaca dos parâmetros considerados.

Resultado e discussão

A Figura 1 ilustra os resultados das aquisições de campo para os dois parâmetros morfométricos definidos. Cabo Frio P6: A posição da crista da berma mostrou que durante a ressaca de Abril de 2010 houve um significativo recuo de aproximadamente 65 metros em relação ao registrado em fevereiro de 2010. Desta forma, a partir do recuo da crista da berma assume-se que o processo erosivo ocasionou a remoção subaérea dos sedimentos da praia, considerando que a berma seria a feição construtiva ou destrutiva derivada da ação de ondas. Em Março de 2013 a feição encontrava-se recuperada e 15 metros mais projetada que nas condições pré-ressaca. Durante o evento não foi detectado que o alcance máximo das ondas tivesse atingido o limite do pós-praia, indicando que as pequenas flutuações verificadas possivelmente são resultado de ação eólica. Peró Norte: Considerando a posição da crista da berma, o recuo entre Fevereiro e Abril de 2010 foi de 20 metros, mostrando que a ressaca representou um papel importante no impacto morfológico nesta praia. No entanto, em Março de 2011 a berma já encontrava-se recuperada e 5 metros mais projetada em relação a Fevereiro de 2010. O recuo do limite do pós-praia durante a resaca foi da ordem de aproximadamente 8 metros, indicando que processos de espraiamento na face praial tiveram energia suficiente para ultrapassar o pós-praia e solapar o sistema de dunas frontais durante a tempestade. Isto sugere maior vulnerabilidade do ponto Norte da praia do Peró ao ataque de ondas de maior energia, por apresentar pós-praia mais estreito e mais baixo que o ponto 6 de Cabo Frio, e o efeito de amortização da energia das ondas pela extensão da berma é menor. As aquisições subsequentes mostram recuperação gradual, de modo que em Fevereiro de 2012 a base das dunas frontais encontrava-se totalmente recuperada. Costa Azul P5: Durante a ressaca foi observado um recuo de mais de 40 metros da crista da berma. A partir disto, pode-se inferir que os impactos morfológicos neste feição foram significativos. A partir de Maio de 2010 registrou-se contínua recuperação desta feição até Dezembro de 2012, quando a crista da berma estava 17 metros mais projetada do que o observado em Fevereiro de 2010, mostrando completa recuperação em relação aos impactos morfológicos da tespestade. É possível presumir que tal registro foi consequência da incorporação sedimentar na parte emersa por ação das ondas durante condições de tempo bom. A tempestade de 2010 causou um recuo de 29 metros no limite do pós-praia, mostrando que o solapamento das ondas sobre essa feição foi significativo. As aquisições subsequentes mostram que não houve a recuperação dessa feição, o que possivelmente se explica pelo fato de que a ação eólica neste trecho, composto por areias médias, não tem energia suficiente para transportar os sedimentos da face de praia para o pós-praia. Além disso, foram registrados leques de transposição durante a ressaca, de modo que sedimentos depositados no reverso da barreira talvez não tenham retornado ao estoque sedimentar do sistema. Mar do Norte P3: A aquisição de Abril de 2010 mostrou que a crista da berma encontrava-se quase 4 metros mais projetada que em Fevereiro de 2010. No entanto, possivelmente este registro não reflete os impactos morfológicos causados pela ressaca, de forma que a berma pode ter sido reconstruída anteriormente ao momento da aquisição. As aquições posteriores mostram um comportamento instável, mostrando flutuações com amplitude da ordem de 6,35 metros. De maneira distinda, a ressaca não alterou a morfologia do limite do pós-praia neste trecho da praia de Mar do Norte possivelmente em função da presença de afloramentos localizados mais ao sul, que atuam na dissipação da energia de ondas vindas do quadrante sul. Por fim, os resultados mostram que entre Fevereiro de 2010 e Março de 2013 apenas o ponto 5 de Costa Azul foi classificado como não resiliente, em função da não recuperação do limite do pós-praia (Tabela 1).

Figura 1.

Medições do parâmetros "posição da crista da berma" e "limite do pós-praia" entre fevereiro de 2010 e março de 2013.

Tabela 1.

Classificação final dos pontos da área de estudo e seus estados morfodinâmicos.

Conclusões

A análise dos impactos de tempestade e recuperação morfológica das praias estudadas a partir de dados morfométricos extraídos dos perfis topobatimétricos se mostrou satisfatória para os objetivos deste trabalho, que só se tornou possível pela realização do monitoramento contínuo da área de estudo. O comportamento morfodinâmico das praias estudadas influenciou no processo de recuperação morfológica pós-ressaca. A morfologia de praias dissipativas foi mais afetada na largura da berma. Praias refletivas se mostraram mais sensíveis e menos resilientes a eventos de tempestade. Alterações mais evidentes na morfologia destes trechos foram registrados a partir da posição do limite do pós-praia. No ponto 5 de Costa Azul os impactos morfológicos da ressaca foram mais intensos do que no ponto 3 de Mar do Norte. Por fim, vale ressaltar que existem diferenças nos mecanismos morfodinâmicos atuantes na resiliência dessas praias.

Agradecimentos

Agradecimentos à Capes e ao CNPq pela concessão de bolsas de pós-graduação e pesquisa, respectivamente.

Referências

FERNANDEZ, Guilherme Borges. Indicadores Morfológicos para a Origem e Evolução das Barreiras Arenosas Costeiras no Litoral do Estado do Rio de Janeiro. In: VII Simpósio Nacional de Geomorfologia, Belo Horizonte, MG: UFMG, 2008.

BULHÕES, Eduardo Manoel da Rosa; FERNANDEZ, Guilherme Borges; ROCHA, Thais Baptista. Efeitos Morfológicos nas Barreiras Costeiras do Litoral Centro-Norte do Estado do Rio de Janeiro: Resultado do Evento de Tempestade de Abril de 2010. Revista de Geografia. Recife. UFPE – DCG/NAPA, v. especial VIII SINAGEO, n.2, 2010.

FERNANDEZ, Guilherme Borges; BULHÕES, Eduardo Manoel da Rosa, ROCHA; Thais Baptista. Impacts of Severe Storm Occurred in April 2010 along Rio de Janeiro coast, Brazil. Journal of Coast Research, SI 64, p. 1850-1854, 2011.

MALUF, Victor; FIGUEIREDO, Mariana Silva; ROCHA, Thais Baptista da; FERNANDEZ, Guilherme Borges. Caracterização morfodinâmica e determinação de resiliência ao impacto de tempestades em praias arenosas no litoral centro-norte do estado do Rio de Janeiro. In: Anais do XV Simpósio Brasileiro de Geografia Física Aplicada. Vitória, ES. 2013. pg 192-201.

RODRIGUES, Maria Laura Guimarães; FRANCO, Davide; SUGAHARA, Shigetoshi. Climatologia de Frentes Frias no Litoral de Santa Catarina. Revista Brasileira de Geofísica, n°22, vol. 2, 135-151, 2004.


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