Análise da evolução morfológica do estuário do rio Aracatimirim, Itarema-Ceará, e adjacências no período entre 1985 e 2013.

Autores

Mesquita, A.F. (UNIVERSIDADE FEDERAL DO CEARÁ) ; Moreira Damasceno, A. (UNIVERSIDADE FEDERAL DO CEARA) ; Duarte, C.R. (UNIVERSIDADE FEDERAL DO CEARÁ) ; Silva Filho, W.F. (UNIVERSIDADE FEDERAL DO CEARÁ)

Resumo

O estuário do rio Aracatimirim sofreu mudanças morfológicas nos últimos 28 anos. A partir de imagens Landsat coletadas entre os anos de 1985 e 2013 foi possível a identificação de cinco fases nessa evolução. O estuário anteriormente construído por barra evoluiu a um estuário de planície costeira, acompanhado pela progradação da praia de Torrões e aglutinação de “barriers spits” ao continente.

Palavras chaves

Estuário; Evolução costeira; Rio Aracatimirim

Introdução

Estuários são feições geomorfológicas comumente desenvolvidas em planícies costeiras de médias latitudes, encontrados sobre as mais variadas condições de marés, ondas e climas. (Rosseti, 2008; Silva, 2000). Nessa interface continente-oceano, há uma contínua alteração na remobilização de sedimentos e morfologia de linha de costa, na qual, tais alterações possuem grande variabilidade espaço-temporal devido aos processos continentais e marinhos como ação de ondas, marés, correntes costeiras e também ação fluvial (Silva et al., 2004). O presente trabalho apresenta uma análise multitemporal da evolução geomorfológica do estuário do Rio Aracatimirim e zonas de praia adjacentes, ao longo de 28 anos. A foz do rio Aracatimirim localiza-se no município de Itarema próxima ao distrito de Moitas, a aproximadamente 224km de Fortaleza-CE (Figura 1). É caracterizada como uma região de baixa descarga fluvial com praias adjacentes de caráter dissipativo (por vezes intermediárias-dissipativas), mesomarés (1,48 m de amplitude), dominada por ondas com alturas médias de 0,56m e gradiente topográfico variando entre 0,024º e 0,249° (Aguiar et.al, 2013). Segundo Souto (2009) e Ximenes et.al (2013), para análise da dinâmica sedimentar e evolução de áreas costeiras a utilização de dados multitemporais de imagens orbitais, permite o acompanhamento das modificações na morfologia costeira por meio da linha de costa. Esses mesmos autores afirmam que séries históricas fornecem informações qualitativas, por vezes quantitativas, a partir da interseção das imagens em uso.

Material e métodos

No presente estudo foram utilizadas imagens orbitais da série Landsat 5, Landsat 7 e Landsat 8, sensor TM, ETM+ e OLI respectivamente, disponíveis gratuitamente através dos portais do USGS (United States Geological Survey) e INPE (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais). Foram empregadas cinco cenas imageadas no período entre junho e agosto de cada ano, com um intervalo de 28 anos. As respectivas cenas foram capturadas em 25/06/1985 (Landsat 5 – TM), 10/06/1991 (Landsat 5 – TM), 02/07/1999 (Landsat 7 – TM+), 11/08/2008 (Landsat 5 – TM) e 02/08/2013 (Landsat 8 – OLI). As cenas obtidas foram georreferenciadas através de uma imagem GEOCOVER 2000 e melhoradas pela correções atmosférica, utilizando o software ENVI 4.8. A correção atmosférica consiste numa técnica que suaviza o efeito de dispersão da energia eletromagnética nas partículas de água suspensas na atmosfera, possibilitando que todos os alvos sejam interpretados da mesma forma. O processo empregado nesse trabalho foi o do "DarkSubtract" onde foram extraídos os valores de pixels mais escuros, em tese com valores zero de refletância ou o mais próximo a esse. Foram geradas composições coloridas em RGB, buscando-se realçar a faixa de areia molhada, a fim de definir a linha de costa pelo espraiamento máximo das ondas no momento de captura da imagem pelo sensor. Segundo Souto (2004) a composição que emprega as bandas do infravermelho médio, do infravermelho próximo e do vermelho em RGB, respectivamente, realça feições subaéreas ou submersas temporariamente, limitadas pelo máximo espraiamento da onda no momento de captura da imagem ou pela zona de berma. Foram então elaborados os produtos cartográficos para análise.

Resultado e discussão

A partir da comparação entre as imagens orbitais utilizadas foi possível a identificação de cinco principais fases evolutivas até a formatação que o estuário do rio Aracatimirm apresenta atualmente. A Figura 2 apresenta as fases e modificação da morfologia dos estuários e praias adjacentes ao longo do período em análise. As fases encontradas são: I – A foz do rio Aractimirim apresentava um estuário construído por barra, sobre o qual Miranda et.al (2002) representa vales primitivos inundados pela última transgressão marinha, onde a sedimentação holocênica proporcionou a formação de barras. Essa sedimentação, segundo o mesmo autor pode ser oriunda devido aos: (i) processos erosivos, onde grandes quantidades de sedimentos são retrabalhados pelas ondas e transportados por correntes litorâneas formando canais e lagunas extensas no seu interior; (ii) o rio ou sistema de rios que nutrem estes estuários podem apresentar variação na descarga fluvial, variando com a estação do ano, podendo transportar grande concentração de sedimentos em suspensão, modificando a geometria da barra ou de sua entrada. Em alguns sistemas observam-se a erosão da barra em função do aumento da descarga, até mesmo completamente, restabelecendo-se quando cessa o período de chuvas mais intensas. Entretanto não foi observado para esse estuário, onde na imagem de 1991, a barra foi completamente destruída. II – Essa fase caracterizou-se pela formação de “barrierspits” e canais de maré associados no setor adjacente do estruário, na Praia de Torrões. Segundo Claudino-Sales & Peulvast (2003) essas feições podem ser formadas pela: (i) existência de grande abundância de sedimentos na zona litorânea; (ii) morfologia de praia plana e pouco profunda na zona infralitorânea, e; (iii) espaço para acomodação de sedimentos na bacia receptora. Entretando, somente os dois últimos fatores estão presentes na região, se consideramos a baixa descarga de sedimentos pelo rio e o déficit de sedimentos disponíveis na zona litorânea (Moura & Morais, 2011). III – Representa a fase de aglutinação da barra ao continente e consequentemente a formação de uma lagoa costeira e progradação da Praia de Torrões. IV – Nesta fase o estuário passa a ser classificado como estuário de planície costeira. Esses estuários geralmente são rasos, raramente ultrapassando os 30 m de profundidade e apresentam uma morfologia em funil em direção ao rio. Acontece também a estabilização da Praia de Torrões, com a implantação de campos de dunas frontais. V – Essa fase representa o estuário atualmente, onde a morfologia de planície costeira permanece e não existem grandes variações de morfologia de costa. A mudança na morfologia da foz do rio de estuário construído por barra para de planícies costeiras apresenta uma questão quanto ao controle da dinâmica sedimenta nesse setor, visto que o déficit sedimentar associado à baixa descarga sedimentar do rio na zona infralitorânea, além dos regimes de micromaré, não seria suficiente para a formação de barras arenosas e progradação da Praia de Torrões. Mesmo em estuários construídos por barra, a dinâmica do clima na erosão e reposição da barra em períodos de maior e menor pluviometria deveria ser preservada, o que não foi observado, se considerarmos que os coeficientes morfodinâmicos (ondas, maré, correntes longitudinais) não sofreram grandes alterações nesse período de tempo. Entretanto a geração de espaço de acomodação da bacia receptora é uma hipótese a ser ponderada na modificação geomorfológica desse estuário e setores adjacentes. No entanto, estudos mais detalhados devem ser realizados na região a fim de elucidar essas questões.

Figura 01

Mapa de localização da área de estudo no estuário do rio Aracatimirim. Projeção: Universal Transversa de Mercator. Datum: WGS 84 Zona 24 Sul. Imagem:

Figura 02

Evolução morfológica do estuário do rio Aracatimirm no período entre 1985-2013. UTM, Datum: WGS 84 Zona 24 Sul.

Conclusões

O estuário do rio Aracatimirm apresentou cinco fases de modificações morfológicas, desde um estuário constituído por barra, ano de 1985, passando pela formação de “barrierspits”, progradação da praia de Torrões até a morfologia de estuário de planície costeira, ano de 2013. O controle de sedimentação que proporcionou essa mudança ainda é um pouco controverso, visto que fatores como disponibilidade de sedimentos, alta descarga pluviométrica e mudanças nos fatores morfodinâmicos não são encontrados segundo a bibliografia disponível. Entretanto, uma hipótese a ser ponderada e testada é a destruição de espaço de acomodação da bacia receptora, possibilitando a formação de barreiras, praias progradantes e modificação de morfologia do estuário em estudo.

Agradecimentos

Os autores agardecem a CAPES pelo fornecimento da bolsa de estudo ao primeiro autor e aos membros do Laboratório de Geoprocessamento - GEOCE pelo apoio.

Referências

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