VULNERABILIDADE FÍSICA DO SOLO NA SERRA DO TEPEQUÉM-RR: ANÁLISE DA ATIVIDADE EROSIVA LINEAR

Autores

Beserra Neta, L.C. (UFRR) ; Tavares Júnior, S.S. (UFRR) ; Lima da Costa, M. (UFPA)

Resumo

A serra do Tepequém foi palco de intensa atividade garimpeira diamantífera que ao longo das últimas décadas tem contribuído com o processo erosivo revelado através de feições lineares. Além da influência antrópica, a vulnerabilidade física, química e mineralógica dos solos foi determinante na formação e evolução das voçorocas. O objetivo do estudo foi identificar e descrever os principais fatores de vulnerabilidade física, química e mineralógica do solo envolvidos no processo erosivo.

Palavras chaves

Voçorocas; serra Tepequém; processo erosivo

Introdução

A serra do Tepequém localizada na porção norte do Estado de Roraima se encontra sob intensa atividade erosiva linear, que se instalaram nas planícies intravales. As voçorocas são uma das manifestações mais visíveis na paisagem da serra e destacam-se devido a sua magnitude e ampla distribuição. A deflagração desses fenômenos erosivos tem sido atribuída a atividade garimpeira diamantífera e a vulnerabilidade física dos solos. O presente trabalho tem como objetivo identificar e descrever os principais fatores de vulnerabilidade física do solo envolvidos no processo erosivo. A serra constitui uma feição sedimentar do Paleoproterozóico, representada pela Formação Tepequém (CPRM, 1999) constituída por conglomerados, arenitos, siltitos, argilitos (BORGES; D’ANTONA, 1988). O arranjo estrutural da serra foi elaborado por falhas normais e fraturas de direção NE-SW, concordantes com o arranjo estrutural regional. Este arranjo desempenha um notável controle na organização da rede de drenagem e no modelado do relevo. A drenagem está representada pelos rios Paiva e Cabo Sobral, formam nas escarpas da borda oeste, as cachoeiras do Paiva e Funil. A serra do Tepequém com cerca de 70 Km2 de superfície, constitui um bloco alongado em direção E-W com mergulho suave para sudoeste e contorno de bordas soerguidas guardando a morfologia de uma sinclinal (GUERRA, 1957). No topo os desníveis altimétricos variam de 575 a 1.100 metros. No interior da serra, se destacam planícies intravales, circundadas por morros de cristas alongadas que se apresentam alinhadas a direção NE-SW (BESERRA NETA et al., 2007). A vegetação de savanas estépica graminosa, ocorre preferencialmente nas planícies intravales no topo da serra, contrastando com a floresta ombrófila densa que recobre as bordas íngremes de entorno da serra. O clima em toda região é do tipo (Am) quente e úmido segundo a classificação de Köppen, com precipitação média em torno de 2.250 mm/ano.

Material e métodos

O presente trabalho envolveu as seguintes atividades: - Levantamento de dados bibliográficos e cartográficos- carta plani-altimétrica da folha vila Tepequém - 1:100.000 (IBGE, 1983) e interpretação de imagem do LANDSAT-5/TM - 5R 4G 2B, órbita/ponto 233/57 de 1995. - Sobrevôo na serra do Tepequém e seu entorno, com aeronave Cesna monomotor, com obtenção de dados aéreo-fotográfico, que serviram de base na interpretação do registro das ocorrências de voçorocas, uso e ocupação humana. - Mapeamento e descrição dos perfis de solos e rochas que constituem a superfície da planície intermontana e seu entorno, fazendo uso principalmente das exposições rochosas encontradas nas voçorocas, seguida de coleta de amostras de solos para análises de matéria orgânica, granulometria e mineralogia. Essas análises foram realizadas nos laboratórios do Instituto de Geociências -UFPA. - As características morfométricas das voçorocas foram adquiridas através de medições de profundidade, largura, comprimento e direção do canal principal.

Resultado e discussão

A morfologia do relevo no topo da serra do Tepequém é constituída por níveis altimétricos que variam de 575 a 1.100 m, representado por vertentes íngremes, morros residuais e superfícies aplainadas, com declividade variando de 40 a 200. Nas planícies intravales concentra intenso processo erosivo linear (Figura 1), os solos dominantes na área são neossolo litólico distrófico e argissolo vermelho amarelo. Nos perfis de solos estudados, foram identificados do topo para a base os seguintes horizontes: "A" de textura síltica arenosa, com baixo acúmulo de matéria orgânica; horizonte saprolítico, de textura areia síltica, baixa coesão, com aspecto mosqueado vermelho preservando na base a estrutura da rocha (arenitos e siltitos). Entre os horizontes foi encontrada uma concentração de "linha de pedra", com 20 a 40 cm de espessura, formada por seixos de quartzo leitoso de 10 a 25 mm de diâmetro, subarredondados a arredondados, em matriz arenosa. Também foi encontrado linhas de pedras formada por fragmentos lateríticos ferroaluminosos, de 5 a 20 mm de diâmetro, angulosos, envoltos em matriz arenosa. Os solos do tipo neossolo litólico distrófico e argissolo vermelho amarelo dominantes na área são constituídos predominantemente de quartzo, contendo ainda muscovita e caulinita (Figura 2). Estes solos supracitados das planícies localizadas no topo da serra do Tepequém mostram domínio em SiO2, pela abundância de quartzo. São ainda significativos os teores de Al2O3, Fe2O3 e K2O representados pelos minerais, caulinita, muscovita e goethita/hematita. Os teores de K2O mostram que a caulinita é de fato bastante expressiva nestes sedimentos, a qual é encontrada nas rochas do substrato. Os maiores valores de Al2O3 e Fe2O3 encontrados foram ao longo das linhas de pedra, constituídas de fragmentos de crostas lateríticas ferroaluminosas. O conteúdo de matéria orgânica (MO), nos solos dos perfis investigados, variou de menos de 0,1 a 4,7% e concentra-se fundamentalmente no horizonte superficial, decrescendo abruptamente para o horizonte inferior. Os valores de pH dos solos investigados, determinados em H2O e KCl, variaram de 3,0 a 6,7, demonstrando que são solos ácidos a moderadamente ácidos. As voçorocas estão concentradas ao longo das planícies, situadas entre os vales dos rios Cabo Sobral (a norte) e Paiva (a sul). Estas chegam atingir até 1.20 Km de extensão, com larguras de até 24 m e profundidade entre 2 a 10 m. A morfologia dos canais das voçorocas compreende três tipos: (a) canal linear, com vale na forma de “V” e taludes com inclinação de 43° a 50°, podendo apresentar alargamento na base, em forma de “U”, quando atinge o substrato rochoso; (b) canal ramificado com reentrâncias que evoluem e formam canais dígitos. Estes canais a montante são mais afunilados, enquanto a jusante alarga-se no contato com o canal principal. Os taludes apresentam inclinação de 45° a 80° e a base do canal formato tipo “V” e (c) em forma de leque, estas apresentam cabeceiras com formato semicircular e canal estreito de formato linear. A inclinação dos taludes situa-se na ordem de 85° e exibe formato tipo “U” na base do canal. A orientação das voçorocas apresenta canais lineares alinhados principalmente na direção NE-SW (73 %) e secundariamente nas direções NW-SE (18 %) e N-S (9 %), mostrando forte controle estrutural. Os dutos são feições erosivas observadas nas cabeceiras (base do talude) e ao longo dos degraus da parede das voçorocas distinguem dois tipos: (a) os mais superficiais, de 30 a 50 cm de profundidade, com formato alongado e dimensões entre 5 e 15 cm, os quais são associados à presença de formigueiros; (b) os dutos bem desenvolvidos, situados na base dos taludes em profundidades de 1,4 e 4 m, exibem formato circular e dimensões que variam entre 12 e 50 cm e estão associados ao fluxo aquoso subsuperficial. A grande profusão de dutos favorece a formação de vazios que se interligam entre si e promovem o colapso do teto e o avanço da frente erosiva.

Figura 1

Voçoroca localizada nas planícies intravales da serra do Tepequém, apresenta-se alinhada a direção NE-SW, com canal em forma de "V".

Figura 2

Identificação dos minerais por DRX em solos estudados na serra do Tepequém-RR

Conclusões

As características granulométricas, mineralógicas e químicas dos solos do topo da serra do Tepequém indicam que são de alta vulnerabilidade física aos processos erosivos. São solos com domínio da fração areia a síltica, com baixa coesão. A mineralogia dos solos mostrou-se homogênea com predomínio de quartzo, muscovita e caulinita. Também são encontradas gibbsita, goethita e hematita em perfis lateríticos e nas linhas de pedra. Esta composição mineralógica reflete as características dos lateritos, e arenitos da Formação Tepequém. Solos com essas características quando submetidos a um lençol freático raso e um relevo inclinado, promovem forte fluxo subsuprficial, criando dutos e voçorocas. Associados às características físicas e mineralógicas dos solos da serra Tepequém, deve-se considerar as elevadas precipitações em média 2.250 mm anuais e à baixa densidade de cobertura vegetal que deixa o solo mais exposto à ação erosiva da chuva, facilitando o transporte das frações finas do solo.

Agradecimentos

Referências

BESERRA NETA, L. C., COSTA, M. L., BORGES, M. S. A planície intermontana Tepequém, Roraima, e sua vulnerabilidade erosiva. In: Rosa-Costa, L. T, Klein, E. L., Viglio, E. P. (Eds.). Contribuições à Geologia da Amazônia. Belém: SBG - Núcleo Norte, v.5, 2007, p.89-100.

BORGES, F. R., D’ANTONA, F. J. G. Geologia e Mineralizações da serra Tepequém-RR. In: Congresso Brasileiro de Geologia, 35, 1988, Belém. Anais, Belém: SBG, 1998. p.155-163.

COMPANHIA DE PESQUISA DE RECURSOS MINERAIS. Serviço Geológico do Brasil. Roraima Central. Folha NA.20-X/NA.21-V, Roraima, Manaus: CPRM, Escala 1:500 000, 1999. CD Rom.

GUERRA, A. T. Estudo Geográfico do Território Federal de Roraima. Rio de Janeiro: IBGE, 1957, 252 p.

INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA. Carta plani-altimétrica vila Tepequém - Folha NA.20-X-A-III-MI-25. Rio de Janeiro, Escala 1:100.000, 1983.


APOIO
CAPES UEA UA UFRR GFA UGB