REVELANDO A PAISAGEM ATRAVÉS DA ELABORAÇÃO DE MAPAS GEOMORFOLÓGICOS: PRÁTICAS PEDAGÓGICAS DE ENSINO

Autores

Silva, T. (UFRJ) ; Pimenta, M.L. (UERJ-FFP; UFRJ) ; Pocidonio, E. (UFRJ)

Resumo

Mapas geomorfológicos têm importante papel em estudos ambientais aplicados. Este trabalho procura mostrar práticas pedagógicas no processo de ensino-aprendizagem de mapeamentos segundo metodologias distintas que utilizam cartas topográficas, imagens de satélite e/ou MDEs. Os mapas produzidos exemplificaram variações no registro geomorfológico, ressaltando que o pesquisador deve procurar adequar o mapeamento de acordo com os objetivos da pesquisa realizada.

Palavras chaves

metodologias mapeamento ; recursos didáticos; Rio de Janeiro

Introdução

O mapeamento geomorfológico registra informações sobre formas e materiais de superfície (solos e rochas), processos superficiais e, em alguns casos, a idade das formas (COOKE e DOORNKAMP 1991). A busca pela representação do relevo não é assunto recente na literatura, datando do início do século XIX (TROPPMAIR e MNICH 1969), e sua importância foi enfatizada devido à necessidade de compreensão dos sistemas ambientais após a II Grande Guerra Mundial (TROPPMAIR 1970). Desde esse período busca-se por melhores formas de representação do relevo em mapas, de forma a contribuir com um documento cartográfico que traduza as relações processuais pretéritas e atuais. Neste contexto, o ensino de metodologias de mapeamento geomorfológico procura embasar e apresentar formas de realização desse registro, fornecendo ao corpo discente o conhecimento tão necessário e utilizado no uso e manejo do solo nas mais diversas áreas da ciência geográfica. Este trabalho é um relato da experiência vivenciada no ensino de diferentes técnicas de mapeamento geomorfológico na disciplina denominada Tópicos Especiais em Geomorfologia/Mapeamento Geomorfológico, ministrada no Curso de Graduação em Geografia/UFRJ no segundo semestre de 2013, e que teve como meta discutir fundamentos, importância e objetivos de mapeamentos geomorfológicos, além de enfatizar o ensino e a prática de algumas técnicas de mapeamento no reconhecimento de unidades do relevo. O ensino de metodologias de mapeamento visou ressaltar a importância do conhecimento proporcionado pela Geomorfologia no entendimento da dinâmica do relevo e sua interação com os demais componentes do espaço geográfico, procurando ressaltar a aplicação do ato do reconhecimento de diferentes feições morfológicas, procurando compreender sua herança histórica e, assim, entender que a morfologia atual é resultado de fatos pretéritos sobre o qual o espaço geográfico se organiza e com o qual a sociedade deve interagir.

Material e métodos

A área selecionada para a realização dos mapeamentos geomorfológicos foi a bacia hidrográfica da Baixada de Jacarepaguá, localizada na Região Metropolitana do Rio de Janeiro (RMRJ). Essa área apresenta uma diversidade de formas de relevo bastante interessante (desde feições serranas – maciços costeiros –, a feições de morros, colinas e planície fluviomarinha, com presença de cordões litorâneos, lagoas, etc.), sendo bastante didática para aplicação da prática proposta. Ressaltamos que a escala espacial para a realização dos mapeamentos procurou ser sempre a mesma, 1: 50.000. A primeira metodologia de mapeamento geomorfológico trabalhada foi a que utiliza cartas topográficas denominada “compartimentação geomorfológica”, proposta por Meis et al. (1982) e adaptada por Silva (2002). Consiste em calcular a amplitude altimétrica (Δh) pela diferença entre a altitude superior (Δhmáx) e a inferior (Δhmín) de bacias de drenagem de primeira e segunda ordem até à sua confluência com a rede coletora. A bacia é considerada unidade básica de reconhecimento de diferentes classes de amplitude altimétrica por ser o recorte espacial fundamental de evolução geomorfológica e de compreensão das relações entre área-fonte, zona de transporte e zona de deposição. O mapa elaborado reflete o grau de encaixamento fluvial, refletindo variações litológicas e/ou tectônicas. Outras metodologias empregadas utilizaram produtos cartográficos digitais: modelos digitais de elevação (MDEs) provenientes do projeto TOPODATA (VALERIANO et al., 2009) e imagens de satélite TM-LANDSAT, disponibilizados gratuitamente no sítio eletrônico oficial do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (http://www.dsr.inpe.br). Foi proposta aos alunos a elaboração de um mapeamento a partir do relevo sombreado do MDE, onde por interpretação visual pudessem identificar e delimitar as feições de planícies, colinas, morros e serras a partir de chaves de interpretação trabalhadas em sala de aula.

Resultado e discussão

Os mapas realizados permitiram aos alunos observarem que através de diferentes bases topográficas e produtos espectrais do sensoriamento remoto é possível identificar detalhes distintos do relevo, mesmo utilizando-se uma mesma escala de trabalho (1:50.000). No mapeamento realizado pela técnica de compartimentação geomorfológica, foi possível reconhecer unidades morfológicas de colinas e morros isolados e distribuídos na planície fluviomarinha (Fig. 1), assim como delimitar, com precisão, o limite entre a planície e as demais feições do relevo como morros, serras reafeiçoadas e escarpadas, que caracterizam os maciços costeiros que contornam a Baixada de Jacarepaguá. Ressalta-se que, por utilizar cartas topográficas, o limite entre a planície e as demais feições foi estabelecido através do reconhecimento das rupturas de declive existentes, definindo assim o limite entre a área de retenção da sedimentação quaternária e as áreas em que predominam processos erosivos. Esta técnica demanda um tempo significativo para delimitação das unidades de relevo (delimitação de bacias de drenagem e cálculo da amplitude altimétrica) o que acaba por exigir uma dedicação maior dos alunos e, portanto, sendo considerada exaustiva e trabalhosa. No mapa elaborado a partir do MDE TOPODATA foi reconhecido um menor número de unidades do relevo (Fig. 2) e utilizada a interpretação visual para delimitação dos contornos dos diferentes polígonos representantes de formas distintas, a partir da observação dos aspectos de mudanças na textura e da sensação de suavização da morfologia, sendo, portanto, considerada como uma técnica mais prática pelo corpo discente. Apesar das duas metodologias empregadas classificarem as unidades de relevo de forma bastante próximas à delimitação dos polígonos, acabam por produzir um diferencial nos mapeamentos realizados, devendo ser avaliado pelo profissional dependendo dos objetivos da pesquisa realizada em uma determinada área. Foram utilizados ainda produtos multiespectrais que através das suas características de discernimento das propriedades físico-químicas dos alvos, os alunos puderam ter um novo olhar sobre os processos geomorfológicos atuantes nas formas anteriormente identificadas, de acordo com o comportamento espectral dos constituintes da superfície terrestre, podendo ser pormenorizadas áreas onde predominam processos litorâneos de encostas ou fluviais. Além destes mapas, foi realizado ainda um mapeamento por interpretação visual de imagem de radar em escala 1:250.000, com o objetivo de localizar a Baixada de Jacarepaguá em um contexto mais regional. Apesar de terem sido reconhecidas as mesmas unidades de relevo, os alunos puderam perceber que em uma escala com menos detalhe há dificuldade de apreensão de alguns polígonos das unidades morfológicas da paisagem, constituindo em maior generalização aplicável a objetivos de reconhecimento. A última etapa da experiência no processo de ensino-aprendizagem referiu-se à realização de um trabalho de campo para visitação da área de estudo que proporcionou a visualização do relevo e que os alunos discretizaram em seus mapas, tendo a oportunidade para dirimir dúvidas, validar seus resultados e trocar experiências. Ressalta-se que em uma mesma área com legendas similares, foram verificadas diferenças significativas na confecção final dos mapeamentos. Este fato ocorre justamente por ser utilizada a interpretação visual do corpo discente para realização dos mapas, a qual se apresenta de forma diferenciada para cada indivíduo, sendo observadas maior ou menor acurácia na delimitação dos objetos definidos em cada atividade. Entende-se que para equidade e maior precisão em mapeamentos geomorfológicos, atividades como as apresentadas são importantes ferramentas de aprendizado, aperfeiçoando/condicionando o aluno por meio de treinamentos constantes, diminuindo a subjetividade e facilitando a confecção de mapas futuros.

Fig. 1:

Mapa de compartimentação geomorfológica da Baixada de Jacarepaguá realizado - metodologia de análise de cartas topográficas na escala 1:50.000.

Fig. 2

Mapa de compartimentação geomorfológica da Baixa de Jacarepaguá realizado - interpretação visual do relevo sombreado do MDE na escala 1:50.000.

Conclusões

A elaboração de mapeamentos geomorfológicos com apoio de diferentes bases cartográficas e metodologias distintas propiciou tanto o aprendizado quanto a discussão de diferentes formas de aplicação dos mapas realizados, estimulando o corpo discente a dimensionar a importância de considerar este documento cartográfico em políticas de manejo e uso do solo. Na área em estudo foi possível observar e exemplificar, através dos mapas realizados em diferentes escalas cartográficas, que o geógrafo pode contribuir de forma mais efetiva para compreensão da dinâmica evolutiva, podendo tanto subsidiar o reconhecimento de feições distintas do relevo (escalas espaciais mais abrangentes) e, assim, inferir a atuação de controles litológicos e/ou estruturais, quanto aos aspectos mais dinâmicos do relevo, a partir de mapas realizados em escala de semidetalhe e, portanto, reconhecer feições de distintas suscetibilidades aos processos erosivos e/ou deposicionais.

Agradecimentos

Referências

COOKE, R.V.; DOORNKAMP, J.C. Geomorphology in environmental management: a new introdution. 1991. Oxford: Oxford Clarendon Press. 410p.
MEIS, M.R.; MIRANDA, L.H.G.; FERNANDES, N.F. 1982. Desnivelamento de altitude como parâmetro para a compartimentação do relevo: bacia do médio-baixo Paraíba do Sul. In: Congresso Brasileiro de Geologia, 32, 1982, Salvador, BA. Anais... Salvador: SBG. 4: 1489-1509.
SILVA, T.M. A Estruturação Geomorfológica do Planalto Atlântico no Estado do Rio de Janeiro. Tese (Doutorado). 2002. Rio de Janeiro. Programa de Pós-Graduação em Geografia –IGEO/UFRJ. 265p.
TROPPMAIR, H. Estudo comparativo de mapeamentos geomorfológicos. Notícia Geomorfológica. 1970. Campinas, SP. 10(20): 3-11.
TROPPMAIR, H.; MNICH, J. Cartas Geomorfológicas. Notícia Geomorfológica. 1969. Campinas, SP. 9(17): 43-51.
VALERIANO, M. M.; ROSSETTI, D. F.; ALBULQUERQUE, P. C. G. TOPODATA: desenvolvimento da primeira versão do banco de dados geomorfométricos locais em cobertura nacional In: Simpósio Brasileiro de Sensoriamento Remoto, 14, 2009, Natal, RN. Anais... São José dos Campos, São Paulo: INPE. p. 5499-5506. Disponível em: http://marte.sid.inpe.br/col/dpi.inpe.br/sbsr@80/2008/11.14.21.06/doc/5499-5506.pdf. Acesso realizado em: 10.8.2013.


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