Os compartimentos de relevo e a ocupação urbana em São Sebastião no Litoral Norte de São Paulo

Autores

Machado, M.D. (IG/UNICAMP)

Resumo

Objetiva-se com este trabalho apresentar as relações entre os compartimentos de relevo e os processos resultantes de uma ocupação carente de conhecimento sobre a dinâmica de evolução das formas. O conhecimento sobre os compartimentos de relevo se apresenta como fundamental nas possibilidades de leitura de cenários de fragilidade ambiental. O processo de urbanização requer um olhar atento. Algumas situações são irreversíveis e as consequências para a população do contexto podendo ser extremas.

Palavras chaves

População; Fragilidades; Urbanização

Introdução

Não é possível um planejamento e uma gestão coerente sem o binômio base teórico-metodológica e nas tecnologias da informação (ROSS, 2009), assim como, não é possível, na Geografia, produzir um estudo sobre a gestão e planejamento ambiental sem este par. O espaço geográfico, uma produção da intervenção humana, é dinâmico. O homem intervem sobre um espaço natural rompendo seus limites de equilíbrio por razões múltiplas, mas o mesmo não é capaz de romper com funcionamento geral do sistema terrestre que tende e seguir sua dinâmica na busca por um reequilíbrio que passar por uma nova organização do que foi desestabilizado e, sobre esta dinâmica se encontra a sociedade e seus interesses e técnicas. Delpoux (1974) afirma que este sistema é composto por duas categorias elementares: suporte e cobertura e que qualquer parte, sem exceção da superfície terrestre constitui uma paisagem, um setor, ou um mosaico de paisagens. Sobre este sistema, se encontram os ecossistemas que por sua vez realizam troca de matéria e energia. Esta troca é desequilibrada pela ação humana e, esta ação altera a cobertura e não o suporte. As fragilidades são expostas/ intensificadas por alterações causadas pela ação antrópica, assim gerando cenários de desequilíbrio. A noção de troca de energia e matéria descrita por Delpoux (1974) é também parte do pensamento de Tricart (1977), onde, a organização do espaço e o entendimento sobre ele somente é possível a partir de uma ótica dinâmica, portanto, não existindo formas, sistemas ou quaisquer que sejam as denominações, isoladas. As noções de estabilidade e instabilidade das formas estão ligadas a leitura de dinâmica do relevo. A ação antrópica causa ativação/intensificação morfodinâmica, destruindo rapidamente, como exemplo, os solos e intensificando processos de desequilíbrio que resultam em formas típicas. Em suma, não é possível estudar somente uma componente do relevo ou da paisagem, há de se deter sobre suas trocas dinâmicas com as demais componentes.

Material e métodos

Este estudo foi realizado com base em levantamento bibliográfico e cartográfico; da elaboração de material cartográfico; e da interpretação dos resultados. O levantamento das informações bibliográficas e cartográficas constitui-se das contribuições de Suguio e Martin (1975), IG/SP(1996), RadamBrasil (1983), Silva (1975) e extração da rede viária com auxílio do Google Earth e da base cartográfico Fornecida pela Prefeitura de São Sebastião em escala 1:150.000. Os compartimentos de relevo identificados foram divididos em: Cinturão Orogênico do Atlântico; Bacias Sedimentares Cenozóicas e Formações do Quaternário. A estrutura de ocupação urbana foi mantida sobre o mapa final para a observação do objetivo de confrontar os espaços ocupados pela urbe e o suporte ali encontrado. A relação ocupação e suporte pode ser a chave que explique processos de degradação e intensificação das fragilidades do meio em questão.

Resultado e discussão

A identificação de formas e feições que indicam um desequilíbrio do sistema nos espaços costeiros esta diretamente ligada a composição da paisagem em questão. O município de São Sebastião no Litoral Norte de São Paulo apresenta uma Geomorfologia com compartimentos diversos, dentre eles destacamos: Cinturão Orogênico do Atlântico [Planaltos, Escarpas Litorâneas, Formas Isoladas, Morrarias]; Bacias Sedimentares Cenozóicas [Planícies Fluviais; Planícies Flúvio-lagunares de baías; Planícies Marinhas] e as Formações do Quaternário [Depósitos Coluvionares e Correlatos]. A ocupação urbana de São Sebastião se inicia numa faixa pequena próxima a linha de costa e avança em direção aos compartimentos interiores, no entanto esta linha de costa é bastante heterogênea onde, em trechos, ela é próxima da escarpa, já em outros fica distante[Fig.1]. A linha de costa é definida pelo entrelaçamento das Planícies Marinhas e Flúvio-lagunares de baías com esporões das Escarpas Litorâneas. Sobre estes compartimentos esta localizada a ocupação urbana e sua dinâmica que intensifica processos de desequilíbrio sobre os espaços. Destacamos que há uma variação dos processos de desequilíbrio aparente nestes compartimentos, onde nas Escarpas e seus respectivos Depósitos Coluvionares e Correlatos, se observam processos mais intensos e numerosos. As áreas onde são observados estes processos são marcadamente aquelas que circundam ás Planícies Marinhas ocupadas por assentamento urbano. O processo de ocupação impeliu sobre o meio a retirada da cobertura natural do solo e sobre este vem se instalando processos erosivos. Destacamos sobre este ponto que os processos são intensos também devido ás características pluviais do município que no ano de 2013 marcou um acumulado de 1289 mm (CEPAGRI/UNICAMP) definindo um clima tropical chuvoso, com inverno seco [Am na classificação climática de Koeppen]. A figura.2 apresenta um exemplo destes processos e suas formas: Como destaca a fig.2, os processos erosivos se apresentam como deslocamento de massas, também são observadas ravinas e voçorocas de pequeno porte. Destacamos que em São Sebastião a existência do Parque Estadual de Serra do Mar garante em parte uma maior preservação das áreas que estão sobre esta judice, visto que o parque representa 83% da área do município. Este parque barra a ocupação das áreas, aqui identificadas como Planaltos e Escarpas Litorâneas. Os processos de erosão que ocorrem naturalmente nestes compartimentos são indicativos de que a área é dinâmica, ou seja, é natural destes os processos de erosão e deposição ocorrendo e, suas marcas são aparentes e devem ser respeitadas pelos gestores. Segundo a classificação taxonômica de Ross (1991), os padrões de formas morfológicas do Município de São Sebastião se dividem em dois tipos: Acumulação, representado por planícies de distintas gêneses, e Denudação, representado por morros, colinas, serras e formas aplainadas entre outras (RODRIGUEZ, 2010). Identificamos que basicamente a ocupação urbana de São Sebastião se dá nas áreas de Acumulação, isso condiciona uma ocupação com menores riscos ligados a declividade do terreno, no entanto, as atividades pluvias devem ser geridas de maneira a não possibilitar que sejam construídos estabelecimentos nas áreas tidas como potenciais a inundações. Natureza e sociedade são mutações permanentes. A cada momento se apresentam de uma forma que as diferencia do momento anterior. “Os processos naturais buscam manter ou recompor o equilíbrio em um sistema dinâmico que está em contínua transformação” (AFONSO, 2006, p. 33). Estas transformações naturais entram em um embate permanente com, as também constantes, transformações produzidas pelas relações sociais.

Mapa de Compartimentos do Relevo do Município de São Sebastião

Figura.1: Mapa dos Compartimentos do Relevo do Município de São Sebastião no Litoral Norte do estado de São Paulo. Organização: MACHADO, 2014.

Processos erosivos

Figura.2: Processos erosivos em evolução sobre as Escarpas e seus respectivos depósitos correlatos. Fonte: MACHADO, 2014.

Conclusões

A partir desta análise pode-se afirmar que ocupação urbana de São Sebastião se dá da linha de costa em direção as escarpas litorâneas. Estabelecida basicamente sobre as áreas de acumulação. Em alguns setores do município esta ocupação avança sobre os depósitos coluvionares e correlatos e mesmo sobre as escarpas. Esta variação do estrato/suporte ocupado indica uma complexidade dos processos que somados as condições pluviais indicam condicionantes de fragilidade dos espaços. Uma variação de ambientes ocupados que, em razão de suas dinâmicas de evolução, podem acarretar em situações geográficas de risco e vulnerabilidade às populações ali residentes. As fragilidades apresentadas pelos ambientes naturais devem ser estudadas quando da implantação de um planejamento sobre a área. A atuação do homem sobre o meio deve ser testada de modo a proporcionar o entendimento sobre as possibilidades de desequilíbrio que possam acontecer, uma vez que tal desequilíbrio pode ser permanente (ROSS, 1996).

Agradecimentos

A CAPES [Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior] pela bolsa de mestrado concedida. A meu orientador Prof. Dr. Antonio Carlos Vitte. E a todos aqueles, pessoas e instituições, que contribuem para a construção deste importante seguimento da Geografia Brasileira, aqui lembradas nestas: Suguio e Martin (1975), IG/SP(1996), RadamBrasil (1983), Silva (1975).

Referências

AFONSO, C. M. A paisagem da Baixada Santista: urbanização, transformação e conservação. São Paulo: EDUSP, FAPESP, 2006.
DELPOUX, M. Ecossistema e Paisagem. In: Métodos em Questão IGEOG-USP, 1974.
INSTITUTO GEOLÓGICO. Carta de Risco a Movimentos de Massa e Inundação no Município de São Sebastião. Relatório Técnico. São Sebastião, 1996.
MINISTÉRIO DAS MINAS E ENERGIA. Levantamento dos Recursos Naturais: Geologia, Geomorfologia, Pedologia, Vegetação e Uso Potencial da Terra. Projeto RadamBrasil. Folhas SF.23/24, Rio de Janeiro e Vitória. Rio de Janeiro: Ministério das Minas e Energia, Secretaria Geral. v.32, 1983.
RODRIGUEZ. A, C, M. Geotecnologias na Análise da Legislação Ambiental de São Sebastião (SP). São Paulo: Humanitas, 2010.
ROSS, J. L. S. Análises e Sínteses da Abordagem Geográfica para o Planejamento Ambiental. Revista do Departamento de Geografia. Nº9. FFLCH-USP: São Paulo, 1991.
ROSS, J. L. S. Geomorfologia aplicada aos Eias-Rimas. In: Geomorfologia e Meio Ambiente GUERRA, A. J. T; CUNHA, S. B. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 1996.
ROSS, J. L. S. Ecogeografia do Brasil: subsídios para o planejamento ambiental. São Paulo: Oficina de Textos, 2009.
SILVA, A. C da. O litoral norte do Estado de São Paulo (Formação de uma região periférica). IGEOG – USP. Série Teses e Monografias – nº20. São Paulo: USP, 1975.
SUGUIO, K.; MARTIN, L. Mapa geológico do litoral paulista - Escala 1:100.000. São Paulo: DAEE, USP, 1975.
TRICART, J. Classificação Ecodinâmica do meio ambiente. In: Ecodinâmica – FIBGE – Rio de Janeiro, 1977.


APOIO
CAPES UEA UA UFRR GFA UGB