Cartas de Derivações Ambientais e Transgressões Legais: destaque as áreas de planície e terraços fluviais no “antigo” e no “novo” código florestal.

Autores

Silveira, A. (CEETEPS) ; Cunha, C.M.L. (UNESP RC)

Resumo

O trabalho tem por objetivo analisar as áreas de preservação permanente (APP) relacionadas aos setores de planície e terraços fluviais (APTF) definidas de acordo com o “antigo” e “novo” Código Florestal. Para isso foram organizadas Cartas de Derivações Ambientais e Transgressões Legais a partir da adaptação da proposta cartográfica de Moroz, Canil e Ross (1994). Pode-se constatar que a nova legislação é potencialmente conivente ao desencadeamento de derivações ambientais.

Palavras chaves

Derivações Ambientais; Transgressões Legais; Código Florestal

Introdução

Fazendo uso de recursos da ciência cartográfica a partir da análise da geografia e geomorfologia, Moroz, Canil e Ross (1994) propuseram a configuração de um produto cartográfico de síntese intitulado como Carta de Derivações Ambientais e Transgressões Legais. Para Ross (1995), a Carta de Derivações Ambientais e Transgressões Legais representa uma análise sintética sobre os tipos de intervenções feitas pelos homens nos sistemas naturais, avaliando os impactos ambientais gerados na natureza, além das transgressões à legislação ambiental incidente. A proposta visa à combinação de informações contidas em produtos cartográficos intermediários como as Cartas de Cobertura Vegetal e Uso da Terra, de Declividade ou Clinográfica, além de informações referentes à legislação ambiental (MOROZ, CANIL e ROSS, 1994). O presente trabalho adaptou a proposta cartográfica mencionada produzindo dois documentos referentes aos anos de 1978 e 2005. A organização de tais documentos foi realizada a partir de artigos do “antigo” Código Florestal e Resoluções CONAMA (para o cenário de 1978), bem como do “novo” Código Florestal (para o cenário de 2005). Dessa forma, o principal objetivo do trabalho foi analisar as áreas de preservação permanente (APP) relacionadas aos setores de planície e terraços fluviais (APTF) definidas de acordo com o “antigo” e “novo” Código Florestal. Para atingir tal objetivo foi realizada uma análise comparativa entre os documentos cartográficos produzidos. A bacia do Córrego das Ondas, situada no município de Piracicaba (SP) foi a área selecionada para estudo. Estabelecida entre as latitudes 22º38’30’’e 22º41’’30’’ S, e as longitudes 47º41’15’’ e 47º43’30’’ W, a Bacia do Córrego das Ondas constitui-se em afluente pela margem direita do rio Piracicaba. Do ponto de vista geomorfológico, está estabelecida na Unidade Morfoescultural da Depressão Periférica Paulista - na Zona do Médio Tietê (ROSS e MOROZ, 1997).

Material e métodos

As cartas de Derivações Ambientais e Transgressões Legais da bacia do Córrego das Ondas foram organizadas com adaptações a proposta de Moroz, Canil e Ross (1994). Foi necessária a utilização dos seguintes documentos cartográficos intermediários: carta de Declividade ou Clinográfica, cartas de Cobertura Vegetal e Uso da Terra (cenários 1978 e 2005) e cartas Geomorfológicas (cenários 1978 e 2005) elaboradas por Silveira (2013). Somaram-se a estes documentos, legislações ambientais específicas de interesse à pesquisa. Com o intuito de comparar um cenário representando o “antigo” Código Florestal e Resoluções CONAMA, com um cenário representando o “novo” Código Florestal, foram selecionadas as seguintes leis para os cenários de 1978 e 2005 (este, com atualização em trabalhos de campo de uso e ocupação e geomorfológico realizados nos anos de 2011 e 2012). Para o cenário 1978: - Lei Federal 4.771/1965 - Código Florestal (BRASIL, 1965), assim como as Resoluções CONAMA (2002) 302 e 303; - Lei Federal 6.766/1979 - Lei Lehmann (BRASIL, 1979) e Lei Complementar Municipal 204/2007 (PIRACICABA, 2007). Para o cenário de 2005: - Lei Federal 12.651/2012 - Código Florestal (BRASIL, 2012), que revoga a Lei 4.771/1965; - Lei Federal 6.766/1979 - Lei Lehmann (BRASIL, 1979), e Lei Complementar Municipal 204/2007 (PIRACICABA, 2007). Também no que tange à legislação ambiental, para o cenário de 2005, foram acrescentados no documento cartográfico produzido os limites das Macrozonas Urbanas, contidas na Lei Complementar Municipal 186/2006, que regulamenta a Revisão do Plano Diretor, em seu Título II, Capítulo I, que fixa as regras de ordenamento do território, definindo as áreas adensáveis e não adensáveis, de acordo com a infraestrutura e a preservação do meio ambiente (PIRACICABA, 2006).

Resultado e discussão

As cartas de Derivações Ambientais e Transgressões Legais estão apresentadas na figura 1. Conforme se pode observar, os 30 metros de faixas marginais de matas ciliares (APPs), bem como os 50 metros ao redor das nascentes, garantidas por ambas legislações, não vêm sendo respeitadas. A cor laranja, que representa transgressão legal aos 30 metros de APP, bem como a cor vermelha, que representa transgressão aos 50 metros ao entorno de nascentes são nitidamente destacáveis. O cenário de 2005, em relação ao cenário de 1978, apresenta um pequeno aumento de mata. Já os setores de nascentes, em ambos cenários, continuam sofrendo a pressão tanto das áreas rurais, bem como nos setores urbanos. Destacam-se como derivações ambientais, nos cenários mapeados, feições erosivas como sulcos, ravinamentos e voçorocamentos, áreas de mineração, áreas com solos expostos e canalização fluvial (esta última para o cenário 2005). Em ambos os cenários, foram detectadas áreas de acumulação de planície fluvial e terraço (APTF). Dessa forma, merece destaque o posicionamento das faixas de APP nas legislações mencionadas (“antigo” e “novo” Código Florestal) nas áreas mapeadas como APTF. O “antigo” Código Florestal considera que a faixa marginal de APP deve ser preservada a partir do nível mais alto do canal fluvial, ou seja, a partir da APTF: Art 3º - Constitui Área de Preservação Permanente a área situada: I – em faixa marginal, medida a partir do nível mais alto, em projeção horizontal, com largura mínima de [...] Já o “novo” Código Florestal, considera que a faixa marginal de APP deve ser mantida a partir da borda da calha do leito regular. Portanto, exclui a área de APTF, considerando que a mesma é externa ao leito regular. Art. 4o Considera-se Área de Preservação Permanente, em zonas rurais ou urbanas, para os efeitos desta Lei: I - as faixas marginais de qualquer curso d’água natural perene e intermitente, excluídos os efêmeros, desde a borda da calha do leito regular, em largura mínima de [...] Na Figura 2, a partir das setas verdes, pode-se verificar que no cenário de 1978 (2a), que considera o “antigo” Código Florestal, as áreas de APTF, mesmo que totalmente desprovidas de vegetação, são sobrepostas pela faixa marginal derivada da legislação. Já no cenário 2005 (2b), que considera o “novo” Código Florestal, as áreas de APTF, muitas vezes, extrapolam os limites da faixa destinadas as APPs. Ou seja, as áreas de APTF extrapolam os 30 metros indicadas como APP a partir do leito regular. Tal fato pode comprometer o resguardo das áreas de APTF, tendo em vista que, do ponto de vista geomorfológico, são áreas frágeis, suscetíveis a processos erosivos devido ao caráter pouco consolidado dos materiais de superfície. A manutenção da vegetação, com o resguardo da legislação, pode favorecer a inibição destes processos. Além disso, as áreas de APTF também são susceptíveis a inundações, fato que pode gerar impactos as áreas antropizadas. Dessa forma, pode-se constatar que o “novo” Código Florestal é potencialmente permissivo as derivações ambientais.







Conclusões

Por meio da análise comparativa das Cartas de Derivações Ambientais e Transgressões Legais nos cenários 1978 e 2005, respectivamente, representando o “antigo” Código Florestal e o “novo” Código Florestal, destacou-se a relação legal, no que tange as faixas marginais de APPs com as áreas de APTF. Foi possível observar que no cenário representativo do “novo” Código Florestal as áreas de APTF extrapolam os limites das faixas destinadas as APPs, no caso, os 30 metros destinados a vegetação. Tal fato se sucede em virtude de o mesmo considerar a área de APP a partir da borda do leito regular. Evidencia-se, portanto, que em relação a preservação das suscetíveis áreas de APTF, a nova legislação é flexível em relação a legislação anterior, além de ser potencialmente conivente ao desencadeamento de derivações ambientais.

Agradecimentos

Referências

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ROSS, J.L.S; MOROS, I.C. Mapa Geomorfológico do Estado de São Paulo. São Paulo: FFLCH – USP/ IPT/ FAPESP, 1997.
SILVEIRA, A. Proposta Metodológica para Avaliação dos Níveis de Restrição do Relevo ao Uso Urbano. Tese (Doutorado em Geografia – Organização do Espaço) – Instituto de Geociências e Ciências Exatas - IGCE, Universidade Estadual Paulista - UNESP, Rio Claro, 2013.


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