DINÂMICA DOS SEDIMENTOS EM BACIA DO SEMIÁRIDO: CONECTIVIDADE E A RELAÇÃO COM O ESCOAMENTO SUPERFICIAL COMO SUPORTE PARA A GESTÃO DOS RECURSOS HÍDRICOS LOCAL

Autores

Barros, A.C.M. (UFPE) ; Almeida, J.D.M. (UFPE) ; Souza, J.O.P. (UFPE) ; Correa, A.C.B. (UFPE)

Resumo

A crescente demanda por alternativas que sejam capazes de suprir a escassez do abastecimento de água no semiárido pernambucano impulsiona estudos sobre a dinâmica fluvial em escala local, como suporte à gestão dos recursos hídricos. Portanto, o presente artigo tem como objetivo analisar a dinâmica fluvial na bacia do Riacho Grande (Serra Talhada – PE) através da perspectiva da conectividade da paisagem relacionada ao escoamento superficial e a capacidade de infiltração de água no solo.

Palavras chaves

Conectividade da paisagem; Escoamento Superficial; Dinâmica Fluvial

Introdução

A crescente demanda por soluções que supram a escassez de água no semiárido pernambucano propõe a iniciativa de pesquisas científicas aplicadas de suporte aos órgãos públicos e à população. Desta forma, trabalha-se em escala de bacia hidrográfica visando à compreensão do comportamento dos sistemas fluviais semiáridos, relacionando o sistema físico das bacias aos sistemas antrópicos proporcionando um planejamento baseado nas características do sistema fluvial, não apenas restrito aos usos da água (SOUZA e CORREA, 2012). E dentro da complexa dinâmica dos ambientes fluviais envolvendo produção, transporte e deposição de sedimentos têm-se a perspectiva da conectividade da paisagem, colocada como possibilidade de interação e circulação de energia e matéria entre os compartimentos da paisagem (BRIERLEY, FRYIRS & JAIN, 2006), controlando a evolução dos ambientes fluviais, como também dinâmicas de formação e destruição de paisagens e potencialidades de recuperação (BLANTON e MARCUS, 2009; SOUZA e CORREA, 2012). Através da análise de conectividade da paisagem pretende-se identificar os elementos que influenciarão na transmissão de energia, impedindo ou incrementando o fluxo (FRYIRS et al., 2007; SOUZA e CORREA, 2012). O presente artigo analisou a dinâmica dos sedimentos na bacia do Riacho Grande, com área de 316 km², situada na microrregião do Pajeú, Sertão de Pernambuco, englobando em partes os municípios de Serra Talhada, Calumbi e Flores, através da proposta de conectividade da paisagem como suporte para a gestão dos recursos hídricos local, através da identificação da cobertura e usos do solo, de modo a entender a sua dinâmica, relacionando-os a capacidade de infiltração da água de precipitação no solo e ao escoamento superficial, este fornecendo massa e energia ao sistema fluvial.

Material e métodos

Uso/cobertura e Textura do solo A identificação das texturas dos solos partiu do mapa existente para a área na escala de 1:100.000, disponível através do projeto ZAPE da EMBRAPA. A análise levou em consideração a distribuição dos solos no semiárido a partir de atributos topográficos, como declividade, elevação e distância/influência da rede de drenagem, o que pode ser feito a partir da utilização de modelos digitais de elevação. Para identificar o atual padrão do uso/ocupação do solo foram utilizados pontos de obtidos em campo e imagens QUICKBIRD atualizadas. Uma das especificidades foi o uso de imagens de diferentes períodos do ano, possibilitando identificar as diferenças intra-anuais de uso, como a relação cultura de ciclo curto, pasto e solo nu, que ocorre em grande parte das áreas utilizadas na bacia (SOUZA, 2011), com foco nos usos que afetam diretamente elementos como infiltração, escoamento superficial e fornecimento de sedimento. Conectividade da paisagem e áreas de captação efetiva O mapeamento da conectividade da paisagem consiste em identificar os elementos que influenciam na transmissão de energia, tanto impedindo ou diminuindo o fluxo quanto incrementando o mesmo (FRYIRS, BRIERLEY, et al., 2007b). A identificação dos elementos desconectantes foi realizada, a partir do mapa de declividade, do mapa geomorfológico e do mapeamento de uso dos solos. Posteriormente foram incluídas na analise, elementos e informações obtidas em campo e a partir das imagens QUICKBIRD identificando o transporte na bacia, diante dos vários impedimentos existentes sob a influência dos eventos chuvosos (FRYIRS, BRIERLEY, et al., 2007a; FRYIRS, BRIERLEY, et al., 2007b). O trabalho consiste ainda na análise do nível de conexão de cada sub-bacia, acrescentando à análise o volume de escoamento gerado em cada uma delas para posteriormente mensurar o volume de escoamento/sedimento (m³), este foi calculado a partir de balanço hídrico seqüencial diário (1993-2011).

Resultado e discussão

O análise de uso de solo da bacia do Riacho Grande identificou 3 padrões de uso/ocupação; vegetação conservada, degradada e uso misto, neste encontram-se agrupados as áreas de pecuária e uso agrícola de modificações intra-anuais e áreas de solo exposto. Na bacia ainda foram identificadas 4 principais classes de solo, constando-se o agrupamento de neossolos, luvissolos, planossolos e argissolos. O desempenho dos solos no aumento da capacidade de infiltração depende da textura, através da permeabilidade e porosidade do solo; e estrutura do solo, pela agregação das partículas, promovendo uma rápida infiltração se soltas ou abertas. Seguindo estes aspectos os solos que apresentam uma maior capacidade de infiltração são os solos arenosos, por se tratarem de solos mais permeáveis, enquanto os solos argilosos têm a capacidade de infiltração reduzida pela sua compactação mecânica em contato com água da chuva. Os neossolos predominantes se enquadram em relação à permeabilidade, pelo fato de conterem, em sua maioria, os menores teores de argila, além de constituir áreas na bacia em que a cobertura vegetal se mantém preservada, o que contribui ao aumento da capacidade de infiltração. A cobertura vegetal mantém relação também ao escoamento superficial, quando degradada contribui ao aumento do escoamento, e quando preservada o processo é retardado (BIGARELLA & SUGUIO, 1979). O escoamento superficial influencia o regime dos rios ao passo que onde há condições favoráveis ao escoamento, o fluxo se mantém variável, em períodos de cheia e outros de menores volumes, em situação contrária, onde as condições favorecem a capacidade de infiltração de água no solo, o fluxo permanece estável. As áreas que predominam a degradação da vegetação e a exposição do solo o escoamento superficial é mantido durante o período chuvoso. Áreas em que a vegetação permanece conservada predominam o aumento da capacidade de infiltração de água no solo, contribuindo para o regime regular dos canais fluviais. A capacidade de água no solo foi definida com o auxílio do cálculo de Álgebra de Mapas, através da ferramenta Raster Calculation do software ArcGis 10. As informações anteriores de uso/ocupação do e textura de solo foram transformadas em arquivos Raster, e posteriormente foram atribuídos valores fixos para cada classe. Os valores foram baseados em trabalhos de Alfonsi (1990) e Souza (2014), dos quais para classes de uso e ocupação do solo consideram-se valores fixos de Zona Radicular média (Zr) em cm, considerando 100cm à caatinga preservada, 50cm para caatinga degradada e 40cm para o uso misto; e para as texturas do solo foram atribuídos valores fixos de CAD médio em mm/cm, sendo 0,6mm/cm aos solos arenosos, 1,4mm/cm textura média e 2,0mm/cm aos argilosos. Desta forma foram gerados 8 valores de CAD máximo, agrupados em 4 valores de maior expressão à bacia: 30 mm, 80 mm, 100 mm e 200 mm (figura 01). Os valores de CAD máximo assumem relação inversa ao escoamento superficial a medida que quanto maior o CAD máximo, maior será a capacidade de infiltração da água no solo, enquanto que os menores valores estão em áreas mais propensas ao escoamento superficial. Verificou-se que na bacia em questão que áreas de CAD 200 mm possuem a vegetação preservada e solos arenosos, no entanto as áreas de CAD 30 mm predominam solos de textura média, com volume escoado razoável considerando-se a sua espacialização na bacia (4,41%). O CAD 80 mm apresentou maior volume escoado (5,79%) e representa áreas com predominância de solo exposto. O volume do fluxo escoado é retido por impedimentos de transmissão de energia e matéria dentro do sistema, que funcionam como elementos desconectores. Os impedimentos caracterizam-se por: canal preenchido conservado, canal descontínuo, planícies de inundação, barramentos (lagos artificiais), rodovias e ferrovias (figura 02). Devido aos impedimentos cerca de 10% a 40% do volume escoado é retido dentro do sistema, alterando o regime do canal principal.

Conclusões

A bacia do Riacho Grande apresentou parte de sua vegetação degradada pelo desenvolvimento de atividades agropecuárias de caráter temporário, além de solos expostos, contribuindo ao escoamento superficial, que apresenta uma relação direta a dinâmica fluvial, influenciando o fluxo dos canais. Este fluxo é alterado por impedimentos de transmissão de energia e matéria dentro do sistema. O fluxo escoado é retido nestes pontos dificultando-o de alcançar o canal principal, alterando o seu regime, porém estudos associados a fontes alternativas de abastecimento de água trabalham a idéia de reaproveitamento da água retida, sobretudo em bolsões de areia das planícies de inundação, logo, a análise da conectividade da paisagem deve ser aplicada fornecendo dados em escala detalhada aos gestores dos recursos hídricos e planejamento territorial.

Agradecimentos

Os autores agradecem à FACEPE (Fundação de Amparo a Ciência e Tecnologia do Estado de Pernambuco) pelo apoio financeiro concedido.

Referências

ALFONSI, R. R. et al. Métodos agrometeorológicos para controle da irrigação. Campinas: Instituto Agronômico, 1990.
BRIERLEY, G.; FRYIRS, K.; JAIN, V. Landscape connectivity: the geographic basis of geomorphic applications. Area (2006) 38.2, 165-174.
BIGARELLA, J. J.; SUGUIO, K.; BECKER, R. D. Ambiente Fluvial. Curitiba: Ed. Universidade Federal do Paraná, 1979.
BLANTON, P.; MARCUS, W. A. Railroads, roads and lateral disconnection in the river landscapes of the continental United States. Geomorphology, v. 112, p. 212-227, 2009.
EMBRAPA. Sistema Brasileiro de Classificação de Solos. 2ª Ed. Rio de Janeiro, 2006
FRYIRS, K. A. et al. Catchment-scale (dis)connecti¬vity in sediment flux in the upperHunter catchment, New South Wales, Australia. Geomorphology, v. 89, p. 297-316, 2007
MULDER, V. L. et al. The use of remote sensing in soil and terrain mapping - A review. Geoderma, n. 162, p. 1-19, 2011.
SOUZA, J. O. P. Sistema fluvial e açudagem no semi-árido, relação entre a conectividade da paisagem e dinâmica da precipitação, na bacia de drenagem do riacho do saco, Serra Talhada, Pernambuco. (Dissertação de mestrado) - Recife, 2011.
SOUZA, J. O. P.; CORREA, A. C. B. Conectividade e área de captação efetiva de um sistema fluvial semiárido: bacia do riacho Mulungu, Belém de São Francisco-PE. Sociedade e Natureza, Uberlândia, ano 24, n. 2, 319-332, mai/ago, 2012.
SOUZA, J. O. P. Modelos de Evolução da Dinâmica Fluvial em Ambiente Semiárido – Bacia do Riacho do Saco, Serra Talhada, Pernambuco. Tese de Doutorado: UFPE – Recife, 2014.


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