Autores

Bueno, K.E.M. (UFPR)

Resumo

A bacia do rio Jacareí – Serra do Mar Paranaense, foi afetada por um evento de precipitação extrema em março de 2011, o qual ocasionou uma série de deslizamentos e fluxos de detritos que atingiram quilômetros de distância desde a zona de ruptura, alcançando regiões planas e provocando sérios danos socioeconômicos na região. Este trabalho tem como objetivo aplicar o índice RDE (relação declividade-extensão) para canais selecionados na bacia do rio Jacareí, onde ocorreram fluxos de detritos, a fim de identificar possíveis regiões de deposição de fluxos de detritos, tendo em vista que o material proveniente da zona de ruptura foi transportado por canais fluviais íngremes.O índice RDE permitiu avaliar as características dos canais analisado, porém não identificou regiões de deposição de material proveniente dos fluxos de detritos. O resultado foi comparado com o mapeamento dos fluxos de detritos realizado para a área de estudo, classificando o processo em zona de ruptura, zona de transporte e zona de deposição.

Palavras chaves

Fluxos de detritos; Perfil longitudinal; índice RDE

Introdução

Os fluxos de detritos são uma forma de movimento de massa rápido, induzidos pela ação da gravidade, intermediário entre deslizamentos e inundações Costa (1984). Suas principais características são: a grande mobilidade de material e alto poder destrutivo, aumentando seu volume por erosão, sendo capaz de transportar desde árvores a grandes blocos de rocha Rocha (2011). Segundo Berti e Simoni (2007), métodos para analisar fluxos de detritos variam de acordo com o tipo do fluxo, avaliação e qualidade dos dados, pesquisas já existentes e da ação do poder público. Desta forma, diversas técnicas analíticas para determinar o alcance do fluxo de detritos têm sido aplicadas, podendo ser classificadas em empíricas ou dinâmicas. Em março de 2011, um evento extraordinário de precipitação atingiu o Litoral e a Serra do Mar Paranaense, desencadeando uma série de movimentos de massa e inundações, os quais ocasionaram danos socioeconômicos significativos na região. A bacia hidrográfica do rio Jacareí foi uma das regiões mais afetadas, pois ocorreram fluxos de detritos que atingiram quilômetros de distância desde a zona de ruptura até a planície. Os fluxos de detritos na bacia do rio Jacareí foram transportados e ganharam magnitude em virtude dos canais fluviais íngremes existentes na área. Sendo assim, o objetivo deste trabalho é identificar as características de relevo dos canais e possíveis regiões de deposição de material, comparando com o mapeamento do processo na área de estudo. Para isso, serão identificados os principais atributos morfométricos; elaborados perfis longitudinais; e aplicado o índice RDE (relação declividade-extensão) para cada rio selecionado.

Material e métodos

Área de estudo A bacia do rio Jacareí está localizada na Serra do Mar Paranaense, entre os municípios de Morretes e Paranaguá (Figura 1). A área da bacia é de 23,9 km², delimitada até a ponte da BR 116 para fins de pesquisa do Laboratório de Hidrogeomorfologia – UFPR. Essa bacia foi escolhida em virtude de ser uma das mais afetadas pelos deslizamentos e fluxos de detritos no evento pluviométrico ocorrido em 11 de março de 2011. Os fluxos de detritos na bacia do rio Jacareí foram mapeados subdividindo-os em quatro zonas distintas, que são: zona de ruptura, zona de transporte, zona de deposição de material fino e zona de deposição de material grosseiro. A Figura 2 representa a área e percentual abrangido por cada uma dessas zonas. No total, 22% da bacia foi afetada pelos fluxos. Perfis longitudinais As informações necessárias para elaboração dos perfis longitudinais foram extraídas da hidrografia e das curvas de nível em escala 1:25000. Utilizou-se o software Quantum Gis 2.4.0 para localizar a interseção da hidrografia com as curvas de nível, especificamente a ferramenta interseção de linhas. Em seguida, utilizou-se a ferramenta Split line at point para recortar a hidrografia e vários segmentos de rio para uma análise mais precisa. Tendo em mãos a hidrografia recortada de acordo com a interseção entre as curvas de nível e a hidrografia, gerou-se o perfil longitudinal dos rios principais de cada sub-bacia afetada pelos fluxos de detritos. Os perfis longitudinais de cada rio foram elaborados no software Excel 2013, levando em consideração a frequência acumulada do comprimento de cada segmento de canal e a altitude. Por fim, o perfil longitudinal de cada rio foi construído considerando o mapeamento das zonas de ruptura, transporte e deposição de fluxos de detritos para a área de estudo, considerando as cotas altimétricas do início e fim de cada uma destas zonas no canal. O índice RDE: Relação declividade-extensão O índice RDE (Relação declividade-extensão) ou SL (Slope s. Leght) foi elaborado por Hack (1973). De acordo com Etchebehere et al. (2004), este índice possibilita a análise de perfis longitudinais de rios e de trechos selecionados, e o estabelecimento de comparações entre cursos d’água de ordem e de porte diferentes. O RDE leva em consideração a declividade de um curso d’água ou trechos de drenagem, multiplicada pela extensão total do curso, ou pela distância entre determinado trecho e a nascente. Este índice pode ser calculado da seguinte maneira: RDE = (∆h/∆l). L Onde: Δh é a diferença altimétrica entre dois pontos extremos de um seguimento ao longo do curso d’água; Δl é a projeção horizontal da extensão do referido segmento; L é o comprimento total do curso d’água a montante do ponto para o qual o índice está sendo calculado. O índice RDE possui correlação com os níveis de energia da corrente (streampower), que consiste na capacidade da mesma de erodir o substrato rochoso e de transportar a carga sedimentar (SOUZA et al, 2010). Neste trabalho, o RDE foi aplicado para cada trecho da hidrografia em interseção com as curvas de nível com espaçamento de 10 metros. Os rios selecionados para a aplicação do índice são: rio 1, rio 2, rio 3, rio Gigante e rio 5.

Resultado e discussão

A Figura 2 apresenta os resultados obtidos para os rios 1, 2, 3, Gigante, e 5; relacionando o perfil longitudinal com as zonas de ruptura, transporte e deposição dos fluxos de detritos; e o índice RDE. De acordo com os gráficos, o índice RDE não apresentou relação direta com a zona de deposição do fluxo de detritos. O índice apresentou quedas consideráveis no perfil do gráfico, ainda na zona de transporte mapeada, porém em trechos curtos do canal. Em contrapartida, percebe-se que ocorrem quedas nos gráficos em um comprimento de canal maior nos trechos considerados como “zonas de deposição”, com exceção do rio 3.A Tabela 3 apresenta o RDE médio das zonas de ruptura, transporte e deposição de cada rio selecionado, onde pode-se perceber que os valores praticamente não variam da zona de transporte para a zona de deposição. Em relação as características de cada canal, percebe-se que de acordo com o índice RDE (relação declividade-extensão), os rios analisados apresentam oscilações consideráveis entre picos e quedas ao longo do gráfico. Muitas regiões de queda encontram-se nas zonas de transporte, ou seja, zonas onde não foi identificada deposição de acordo com o mapeamento. Isso pode ser explicado pela magnitude dos fluxos de detritos, a dimensão do material transportado vertente abaixo e pela alta declividade do trecho, fazendo com que o material transportado não fosse depositado nessas depressões. Os rios 5 e 3 foram os que menos apresentaram oscilação do índice RDE no gráfico. Este resultado pode ser explicado por serem rios com menor amplitude altimétrica dentre os rios selecionados. Já os rios 1 e 2 apresentaram as maiores variações no gráfico, apresentando cotas elevadas.

Figura 1

Localização da bacia do rio Jacareí

Figura 2

Área abrangida por cada zona específica dos fluxos de detritos.

Figura 3

RDE médio de cada zona dos fluxos de detritos para cada rio analisado.

Figura 4

Perfil longitudinal contendo as respectivas zonas de ruptura, transporte e deposição e índice RDE, para cada rio analisado.

Considerações Finais

A técnica de análise morfométrica dos índices RDE’s pode ser caracterizada como simples e rápida. Além disso, o índice RDE pode ser eficiente para avaliações mais detalhadas do comportamento de canais fluviais e até mesmo identificação do comportamento morfoestrutural. Alguns trabalhos comprovam sua eficiência para detecção de deformações neotectônicas como consta em Guedes et. al. (2009), Souza et al. (2010), Fugita et al. (2011), Etchebehere et al. (2004). Para avaliar possíveis regiões de deposição de fluxos de detritos, este índice não apresentou resultados satisfatórios, tendo em vista que os valores não variaram consideravelmente que o comportamento no gráfico também não permitiu análises precisas em relação ao processo mapeado na área de estudo. Índices envolvendo outras características morfométricas e hidrológicas, assim como modelos e relações empíricas mais específicas, podem ser eficientes para avaliar fluxos de detritos na região. Portanto, novos testes e simulações serão realizadas na área de estudo.

Agradecimentos

Referências

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