Autores

Pereira, J.S. (UNIOESTE) ; Paisani, J.C. (UNIOESTE) ; Fugita, R.H. (UNIOESTE) ; Pontelli, M.E. (UNIOESTE) ; Hendges, E.R. (UNIOESTE) ; Cavazini, A.J. (UNIOESTE)

Resumo

Objetivando contribuir para a reconstrução paleoambiental continental do sul do Brasil, este trabalho apresenta uma caracterização preliminar das formações superficiais das superfícies de São José dos Ausentes (RS)/ São Joaquim (SC). Em campo obteve-se o levantamento de 114 locais de observação com sua localização com GPS. Para a espacialização dos pontos foi utilizado o aplicativo Spring no qual se realizou o mapa da área de estudo, apresentado à distribuição dos locais observados em faixas hipsométricas. Na área de estudo é possível reconhecer, preliminarmente, quatro superfícies geomórficas: a) Varia (RS)/Lages (SC) entre 900 a 1.000 m de altitude; b) Bom Jesus (RS) entre 1.000 a 1.100 m; c) São José dos Ausentes (RS)/ São Joaquim (SC) entre 1.100 a 1.300 m; e d) Bom Jesus da Serra (SC)/Urubici (SC) acima de 1.500 m de altitude. Com as observações de campo foi possível concluir que os materiais encontrados são basicamente alóctones na categoria de colúvios.

Palavras chaves

superfície geomórfica; colúvio; paleocanal

Introdução

A paisagem geomorfológica, mais especificamente o relevo, são resultados de sucessivos estágios evolutivos ocorridos em diversas escalas ao longo do tempo no espaço (PAISANI, et al., 2008), várias são as pesquisas que se preocupam em compreender a sequência de eventos que levaram a formação de diferentes paisagens. Estudar a paisagem geomorfológica a fim de compreender os eventos que levaram a formação de determinada superfície sempre foi o principal objetivo do grupo de pesquisa “Gênese e Evolução de Superfícies Geomórficas e Formações superficiais”, formado na Universidade Estadual do Oeste do Paraná (UNIOESTE) e cadastrado no CNPq. Nos últimos anos, membros do grupo de pesquisa vêm realizando estudos referente ao Planalto das Araucárias no Sudoeste do Paraná e noroeste de Santa Catarina Palmas (PR)/Água Doce(SC), com levantamento sistemático de seções estratigráficas (PAISANI et al., 2012), a fim de entender a evolução desta paisagem geomorfológica. Através dos inúmeros estudos nesta área constata-se que a sequência estratigráfica contendo sedimentos e paleossolos revelou que os depósitos coluviais colmataram os paleofundos de vales a partir da transição Pleistoceno/Holoceno (EIM 2/1) e evidenciam a ação da morfogênese na área durante a maior parte do Holoceno (> 1000 anos AP - Paisani et al., 2013). Porém, algumas dúvidas ainda persistem a respeito da geodinâmica superficial desta área, como por exemplo, na tentativa de saber se os fenômenos identificados ao longo destas superfícies são regionais ou locais. Portanto, com o objetivo de contribuir para esta reconstrução paleoambiental continental do sul do Brasil, necessitou-se expandir a área de estudo, com o intuito de levantar em outra área correlata novos registros estratigráficos que confirme tais fenômenos identificado na superfície geomórfica de Palmas/ Água Doce, assim optou-se em estuda a região sudeste de Santa Catarina e Nordeste do Rio Grande do Sul, entre São Joaquim (SC)/São José dos Ausentes (RS). A superfície geomórfica da região de São José dos Ausentes/São Joaquim é unidade de relevo contida no Planalto das Araucárias situada entre os estados de Santa Catarina e Rio Grande do Sul (MONTEIRO, 1963). A região está inserida na porção sul da Bacia do Paraná, que se define por ser uma bacia intracratônica desenvolvida completamente sobre crosta continental que cobre a porção centro-oriental da América do Sul, pertencentes ao grupo Grupo Serra Geral (MINEROPAR, 2013). Esta porção do relevo consiste em terrenos mais ou menos elevados e a maior elevação chega a aproximadamente 1800 metros de altitude, e são fortemente dissecados pelo sistema hidrográfico do rio Pelotas (PELUSO JUNIOR, 1986). No que corresponde ao clima, esta região possui uma temperatura baixa e alto índice pluviométrico durante o ano, porém, a maior ocorrência de chuva se concentra do verão sendo que no inverno a chuva diminui apresentando um clima mais seco que no verão. Este trabalho subsidiará trabalhos seguintes que responderam as dúvidas referentes se as formações superficiais são de origem autóctones ou alóctones, haja vista que para o Planalto de Palmas/Água Doce com litologia, altitude e regime climático similar, foram reconhecidas predominantemente alóctone preenchendo fundos de vales modernos, rampas de colúvios e paleofundos de vales (baixa ordem e cabeceiras). Neste sentido, neste trabalho é apresentado a caracterização preliminar das formações superficiais das superfícies de São José dos Ausentes (RS)/ São Joaquim (SC), o qual servirá de informações preliminares para trabalhos seguintes.

Material e métodos

A metodologia utilizada para este trabalho se baseou em Paisani et al. (2008). Primeiramente se realizou o levantamento de locais de observação das formações superficiais em cortes de estrada. Ao todo foram levantados 114 locais de observação com a localização com GPS (Global Positioning System) e anotação das coordenadas. Procedeu-se também o registro fotográfico assim como a verificação da gênese autóctone ou alóctone dessas formações conforme a disposição dos materiais e a respectiva unidade de relevo associada. A espacialização dos pontos para a realização do mapa da área de estudo de foi realizada no aplicativo SPRING (Sistema de Processamento de Informações Geográficas), desenvolvido pelo Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE). O aplicativo SPRING, constitui-se num sistema organizado em Banco de Dados Geográficos, composto por um Projeto, dividido por sua vez num conjunto de níveis, camadas ou Plano de Informações, que varia em número, tipos de formatos e de temas, conforme as necessidades de cada usuário (CAMARA et al., 1996). Com base de dados referencial, foi utilizado o Banco de Dados Geográfico denominado de Atlas Brasil 2008, que traz informações como malhas vetoriais dos limites estaduais, municipais, a localização da sede dos municípios brasileiros, as principais drenagens, as principais vias de acesso, dentre outras informações. O referido Banco de Dados Geográfico foi elaborado e é disponibilizado pelo INPE. Além das informações já contidas no Banco de Dados, foram importadas, como modelo de dados Temático, as coordenadas dos locais de observação em campo associando- as a respectiva classe temática observada a campo, como por exemplo: SJ1 - Relevo Residual; SJ3 Afloramento Linha Blocos; SJ12 Rampa de Colúvio; SJ61 Colúvio Arenoso; SJ95 Afloramento de Basalto Alterado; etc. Na sequência procedeu-se a elaboração MNT (Modelo Numérico do Terreno) que configurou como base topográfica em que foram plotados os locais de observação. Esse produto resultou da importação dos dados do sobrevôo da Shuttle Radar Topography Mission (SRTM) da National Aeronautics and Space Administration (NASA, Agência Espacial Estadunidense) referente a área de estudo envolvendo parte dos Estados do Rio Grande do Sul e Santa Catarina, com resolução espacial aproximada de 90m (a rigor, 3’’ ou 0,000833o), no Datum e o Elipsóide de referência são WGS84, com dados de z em metros inteiros (VALERIANO, 2004). Os dados do SRTM foram obtidos no site http://www.ecologia.ufrgs.br/labgeo/ do laboratório de Geoprocessamento do Centro de Ecologia da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). Foram estabelecidas faixas hipsométricas em classes hipsométricas com equidistâncias distintas (0-100m; 100-300; 300-600; 600-800; 800-900; 900-1.000; 1.000-1.100; 1.100-1.200; 1.200-1.300; 1.300-1.400; 1.400-1.500; 1.500-1.600; 1.600-1.700; 1.700- 1.818).

Resultado e discussão

Os 114 pontos de observação levantados em campo abrangeu a área correspondente ao sudeste de Santa Catarina e nordeste do Rio Grande do Sul entre os municípios como Lages (SC), São Joaquim (SC), Bom Jardim da Serra (SC), São José dos Ausente (RS), Bom Jesus (RS) e Vacaria (RS) (Figura 1). Essa área envolve o setor serrano dos referidos estados do sul do Brasil e apresentam superfícies geomórficas contidas no Planalto das Araucárias (ALMEIDA, 1956). Essa área é drenada pelo sistema hidrográfico do rio Pelotas, em seu alto vale, cujas águas fluem de leste para oeste. O MNT gerado para a área de estudo, disposto em faixas hipsométricas, está representado na figura 1. Ele mostra a distribuição espacial das 14 classes hipsométricas previamente definidas. A oeste predominam as classes abaixo de 1.000 m de altitude, enquanto que a leste as classes com mais de 1.500 m de altitude. Os locais de observação plotados nessa base cartográfica se encontram, em sua maioria, entre as cotas altimétricas de 900 a 1.500 m de altitude, embora alguns locais de observação foram obtidos nas altimetrias acima de 1.500 m. Analisando o MNT, com base nas observações da paisagem em campo, é possível reconhecer, de forma preliminar, quatro superfícies geomórficas: a) superfície de Varia (RS)/Lages (SC) entre 900 a 1.000 m de altitude se encontra; b) superfície de Bom Jesus (RS) entre 1.000 a 1.100 m; c) superfície de São José dos Ausentes (RS)/ São Joaquim (SC) entre 1.100 a 1.300 m; e d) superfície de Bom Jesus da Serra (SC)/Urubici (SC) acima de 1.500 m de altitude. Destas se destaca a superfície de São José dos Ausentes (RS)/ São Joaquim (SC), onde houve o maior número de locais de observação. A seu respeito, percebeu-se que a porção catarinense mostra-se fortemente dissecada pelos sistemas hidrográficos tributários do rio Pelotas. Ela é caracterizada por relevos residuais mantidos por derrames vulcânicos ácidos, fases sã e hidrotermal, desmantelados pela erosão (pseudotors) (Figura 2). Ombreiras embutidas nos fundos de vales são mantidas ora por basalto ora por fase hidrotermal. São comuns vales orientados por fraturas/falhamentos de direção NE-SW, cachoeiras, fundos de vales < 4ª ordem com baixo gradiente hidráulico e rampas de colúvio contendo materiais gerados por fluxos de detritos (Figura 3). Na porção riograndense o relevo é suavemente ondulado com fundos de vales de baixo gradiente hidráulico. Relevos residuais, colinas de topo convexo e encostas suaves a íngremes, fundos de vales sem canais incisivos são morfologias similares àquelas verificadas na superfície de Palmas(PR)/Água Doce (SC) (Paisani et al., 2014). Em São José dos Ausentes as formações superficiais levantadas até o momento mostra-se alóctones, formadas principalmente por delgadas camadas coluviais dispostas em rampas e holow de cabeceiras de drenagem. Essas camadas coluviais, por vezes, se encontram colmatando canais de baixa ordem hierárquica (paleocanais) e soterraram solos hidromórficos (Figura 4).

Figura 1: Localização da área de estudo e distribuição dos locais de o

Localização da área de estudo com a distribuição dos pontos observados conforme hipsometria do terreno.

Figura 2: Relevo Residual

Relevo Residual mantido por derrame vulcânico ácido

Figura 3: Materiais gerados por fluxos de detritos

colúvio contendo materiais gerados por fluxos de detritos

Paleossolo hidromórfico enterrado (Material branco)

Paleossolo hidromórfico enterrado (Material branco localizado na base)

Considerações Finais

Este trabalho apresentou a caracterização preliminar das formações superficiais encontradas na superfície de São José dos Ausentes (RS)/ São Joaquim (SC). A metodologia utilizada se baseou no levantamento de locais de observação das formações superficiais localizadas em cortes de estrada, ao todo foram 114 locais observados estabelecendo sua localização com GPS. Através das coordenadas dos locais de observação elaborou-se o mapa da área de estudo no aplicativo SPRING que mostrou a distribuição dos pontos observados conforme a hipsometria do terreno, sendo estabelecidas 14 faixas hipsométricas. Foi possível verificar através do mapa que a maioria dos locais observados abrangeu altitudes que variam entre 1.000 a 1.400. Com as observações de campo pode-se estabelecer e descrever uma síntese dos materiais observados, ou seja, eles são basicamente alóctones na categoria de colúvios. Na porção de Santa Catarina foi possível observar que o relevo se apresenta mais dissecado, com fundos de vales de baixo gradiente hidráulico apresentado materiais formados por movimentos de massa como rampas de colúvio com materiais gerados através dos fluxos de detritos. Na porção do Rio grande do Sul também contem fundos de vales com baixo gradiente hidráulico. Em São José dos Ausentes (RS) as formações superficiais se mostraram alóctones, onde as camadas coluviais por vezes colmataram canais de baixa ordem hierárquica podendo observar em alguns casos paleossolos hidromórficos enterrados.

Agradecimentos

Ao CNPq (Proc.300902/2015-8 / Proc. 441647/2014-6) pelo apoio financeiro e bolsa de IC, a CAPES/Programa de Pós-Graduação em Geografia por bolsa de Mestrado e a Universidade Estadual do Oeste do Paraná, Campus Francisco Beltrão, pelo apoio aos trabalhos de campo.

Referências

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