• 14° SINAGEO – Simpósio Nacional de Geomorfologia
  • Corumbá / MS
  • 24 a 30 de Agosto de 2023

PEDODIVERSIDADE E PEDOSSÍTIOS DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO

Autores

  • CAROLINE OLIVEIRA LIRAENCEEmail: carolinelira.ence@gmail.com
  • ROSANGELA GARRIDO MACHADO BOTELHOIBGEEmail: rgmb2008@hotmail.com

Resumo

A pedodiversidade trata da variedade dos tipos de solos em uma determinada área, logo, quanto maior o conhecimento dos solos de um dado espaço, maior a acurácia nesta representação. O objetivo deste trabalho é a avaliação da pedodiversidade e inventariação dos pedossítios do Estado Rio de Janeiro, considerando sua representatividade. O trabalho consiste na análise dos dados de solos existentes no Banco de Dados e Informações Ambientais (BDIA) do IBGE. No Estado, ocorrem 12 das 13 grandes classes de solo, não havendo registro da ordem dos Vertissolos. Foram avaliados todos os 40 pontos de amostragem, sendo 29 identificados como pedossítios representativos dos 104 tipos de solos até o quarto nível taxonômico do SiBCS que ocorrem no Rio de Janeiro. Considerando sua área territorial, que representa apenas 0,51% do país, o Estado pode ser considerado como tendo alta pedodiversidade, que pode ser melhor representada em novos pedossítios a partir de novos dados de solos.

Palavras chaves

Solos; Inventário; Pedopatrimônio; Pedodiversidade; Pedossítio

Introdução

Novas abordagens teóricas e metodológicas ligadas ao conceito de Geoconservação têm surgido para corresponder a um novo paradigma ou corrente do pensamento voltado para a valorização do meio natural (BAPTISTA, 2016). Dessa forma, a Geoconservação tem como objetivo preservar a geodiversidade relacionada aos importantes processos e feições geológicas (substrato), geomorfológicas (paisagem) e de solos, garantindo a manutenção da história de sua evolução em termos de velocidade e magnitude (SHARPLES, 2002 apud MANSUR, 2010). Por este motivo, a geoconservação busca garantir o acesso da sociedade às informações que contam a história da Terra. Seus maiores benefícios vêm com a “reserva” de áreas naturais para o futuro, com ganhos econômicos e sociais para os lugares, a ciência e o bem-estar das pessoas (MANSUR, 2010). A proteção do patrimônio natural de um país é de extrema importância para que haja equilíbrio ambiental, sobretudo com a proteção de geossítios. Para tal, tem-se elaborado inventários a respeito do patrimônio geológico com o objetivo de assegurar sua conservação às gerações futuras. Nesse sentido, parte desse patrimônio refere-se aos solos e, ainda que alguns países, como o Brasil, apresentem grande variedade pedológica, raramente encontram-se registros de pedossítios, que precisam ser valorizados e valorados como patrimônio natural, geológico e cultural, tendo como foco seu uso como recurso geoeducativo para a conservação (PEREIRA et al., 2016). O pedossítio é um tipo de geossítio onde o solo é o elemento abiótico em destaque. Pode ser definido como um local específico onde um perfil de solo tem um valor científico reconhecido com base em critérios claros e bem definidos (BRILHA, 2016; BOTELHO; BRILHA, 2022). O registro do patrimônio pedológico é visto como escasso no panorama nacional e mundial, ou seja, é raro o reconhecimento da importância de pedossítios, uma vez que os solos podem registrar a recente história da Terra e suas mudanças, por meio da sua organização em horizontes, de seus atributos e feições e de sua posição na paisagem, o que lhe garante potencial valor científico necessário para ser considerado um geopatrimônio e, como tal, ser protegido (BOTELHO; BRILHA, 2022). Os solos, portanto, podem ser considerados patrimônio e para sua proteção há a necessidade de investir em conhecimento sobre sua distribuição e classificação nos seus mais distintos sistemas. Para além disso, é também importante inventaria-los com fins educacionais e dentre as áreas de interesses para tais estudos existem as unidades de conservação, que garantem um maior grau de preservação e a possibilidade de serem usados como espaços educativos (FONSECA FILHO et al., 2019). É necessário, portanto, detalhar e avaliar geossítios que constituem patrimônio pedológico. Nesse sentido, o inventário e a avaliação quantitativa das ocorrências valiosas da geodiversidade são etapas essenciais em qualquer estratégia de geoconservação e no estabelecimento de prioridades na gestão de um sítio (BRILHA, 2016). O presente trabalho tem como objetivo apresentar avaliar a pedodiversidade e inventariar dos pedossítios do Estado do Rio de Janeiro, que constitui parte de uma pesquisa maior dedicada ao inventário do patrimônio pedológico do Estado, a partir de uma metodologia pré-existente. Em última análise, a pesquisa visa a divulgação, valorização e conservação dos solos em escala estadual, apresentando, além da totalidade de pedossítios, sua distribuição territorial e representatividade.

Material e métodos

Para alcançar os objetivos, o presente trabalho aplicou a metodologia apresentada por Botelho (2021) e Botelho e Brilha (2022). Desse modo, foi levantado o aspecto da pedodiversidade para identificação do pedopatrimônio in situ do Estado do Rio de Janeiro. Nesta primeira etapa, focou-se na identificação da pedodiversidade com base no critério da representatividade, que corresponde ao tipo de solo mais representativo de determinada classe de nível hierárquico considerado. Foram levantados os dados de solos existentes no Banco de Dados e Informações Ambientais (BDIA) do IBGE e as classes de solo pela sua Ordem até o quarto nível taxonômico do Sistema Brasileiro de Classificação dos Solos (SiBCS, 2018) para o recorte do Estado do Rio de Janeiro. Os dados tabulares foram exportados do BDIA e trabalhados no software Excel. Dessa forma, verificaram-se todas as classes existentes em cada ordem de solo e selecionou-se um pedossítio para cada classe. Na ocorrência de dois ou mais perfis de uma mesma classe de solo, selecionou-se o perfil com maior representatividade, seguindo os subcritérios, hierarquizados na sequência de aplicação de acordo com Botelho (2021) e Botelho e Brilha (2022): 1. Maior completude dos dados (1.1. classificação até o quarto nível taxonômico; 1.2. descrição do horizonte diagnóstico; 1.3. análises morfológicas, físico-químicas e mineralógicas); 2. Presença da camada R (rocha) ou do horizonte ou camada C descrita; 3. Maior número de horizontes no perfil; 4. Menor intensidade de erosão; 5. Localização do perfil; 6. Maior profundidade. Nessa pesquisa, além dos pontos de solo, foram considerados como tipos de solo que ocorrem no Estado do Rio de Janeiro todos os componentes descritos nas unidades de mapeamento de solos, até as inclusões. Botelho (2021) e Botelho e Brilha (2022) geraram três índices que expressam numericamente a representatividade das classes de solo e de pedossítios no território e num banco de solos. A diversidade interna de uma classe é importante por refletir a sua pluralidade dentro de um determinado nível taxonômico em um recorte espacial. Logo, para avaliar as classes com maior diversidade interna no Estado do Rio de Janeiro, calculou-se o Índice de Diversidade Espacial de Classes de Solos (IDECS) no nível hierárquico mais elevado do SiBCS – Ordem. Para o IDECS é necessário considerar a área ocupada por cada uma das classes; assim, o cálculo é a razão entre o número de classes da ordem considerada e a área do território por ela ocupada. Essa relação mostra que quanto mais alto o índice, maior será a diversidade espacial da classe no terreno. Já o Índice de Diversidade de Classes de Solo (IDCS), que representa a razão entre o número de pedossítios e o total de classes de solo do nível hierárquico considerado, reflete quantas classes de solos definidas pelo SiBCS foram representadas nos pedossítios selecionados. E o Índice de Diversidade de Perfis de Solos (IDPS), que expressa a razão entre o número de pedossítios e o total de pontos amostrais existentes no banco de solos, indicando a diversidade de tipos de solos amostrados que puderem ser identificados como pedossítios.

Resultado e discussão

Dos tipos de solos representados nas unidades de mapeamento do BDIA, foram contabilizadas 104 classes distintas até o 4º nível taxonômico do SiBCS, de 12 ordens diferentes de solo. Apenas a ordem dos Vertissolos não tem registro de ocorrência no Estado do Rio de Janeiro, de acordo com o banco de dados considerado. Foram avaliados todos os 40 pontos amostrais de solo existentes no BDIA para o Estado do Rio de Janeiro, sendo 29 deles identificados como pedossítios (Tabela 1). Há classes de solos nas unidades de mapeamento que não apresentam pontos amostrais e, por isso, não tiveram indicação de pedossítio representativo. Verificou-que que Argissolos e Latossolos predominam em área territorial, número de perfis de solo e em número de pedossítio no Estado, mas não apresentam os maiores Índice de Diversidade Espacial de Classes de Solo (IDECS) (Tabela 2). Os dados da Tabela 2 mostram que apesar dos Argissolos serem os que possuem maior diversidade interna de classes, com 26 espécimes até o quarto nível taxonômico, o Chernossolo foi aquele que apresentou o maior Índice de Diversidade Espacial de Classes de Solo (IDECS = 15,87). Contudo, este valor é reflexo da existência de apenas uma classe de solo em uma área muito pequena. O Planossolo, por sua vez, possui o segundo maior IDECS e mostra que é uma classe que possui bastante diversidade espacialmente, significando que sua variação no terreno é alta. Por outro lado, o Argissolo apresenta IDECS relativamente baixo, por ocupar uma área grande e, portanto, possuir baixa variabilidade espacial. Nesse sentido, é interessante destacar que o Estado do Rio de Janeiro possui um litoral bastante expressivo e isso se reflete diretamente nos tipos de solos que podemos encontrar na zona costeira. Em razão disso, o IDECS nos mostra que espacialmente os solos comuns em área litorânea têm ocorrência expressiva, como os Planossolos, Neossolos (Quartzarênicos) e Gleissolos. O IDCS foi calculado para expressar numericamente a representatividade dos pedossítios em relação ao total de classes de solo que ocorrem no recorte. Dessa forma, o Chernossolo obteve o valor máximo de 1 para este índice, porém, isso se deve ao fato de ter apresentado apenas um pedossítio e uma classe de solo. Por outro lado, o Cambissolo, por exemplo, obteve índice de 0,40, ou seja, das cinco classes que ocorrem no Estado, duas estão representadas como pedossítios. Já o IPDC, foi calculado, porém, diante do baixo número de pontos de amostragem da maioria das classes no nível taxonômico considerado, não conseguiu expressar de modo eficaz a diversidade de perfis. Assim, acredita-se que este um índice pode não se aplicar bem em um determinado recorte. Do total das 104 classes de solo no quarto nível hierárquico que ocorrem no Estado do Rio de Janeiro, 28% estão representadas nos 29 pedossítios identificados. O resultado indica que grande parte dessas classes se encontra como componente e inclusão. Quanto à sua distribuição no território, percebe-se que os pedossítios estão relativamente bem distribuídos (Figura 1), com destaque para as regiões Norte e Noroeste Fluminense, que abrigam 11 dos 29 pedossítios do Estado.

Tabela 1

Número de pontos de amostragem e pedossítios representativos das classes de solo no 1º nível taxonômico do SiBCS (EMBRAPA, 2018) no Rio de Janeiro.

Tabela 2

Área, nº de classes de solo, Índice de Diversidade Espacial das Classes de Solo (IDECS) e Índice de Diversidade de Classe de Solo (IDCS) no RJ.

Figura 1

Pedossítios representativos das classes de solo no Estado do Rio de Janeiro, por mesorregião geográfica.

Considerações Finais

Ao compararmos a aplicação da metodologia de inventariação de pedossítios por pedodiversidade proposta por Botelho (2021) e Botelho e Brilha (2022) para o Brasil e sua aplicação no Estado do Rio de Janeiro, verifica-se que, para o caso de um recorte, é preciso levantar os tipos de solo que ocorrem no mesmo. No caso do país, todas as classes existentes no SiBCS, obviamente, ocorrem em todo o território nacional, o que facilita também a representação dos Índices de Diversidade. O número de pontos amostrais existentes no banco de dados considerando um recorte específico também precisa ser visto com cuidado, pois a validade dos Índices se dá de forma mais efetiva quando se tem disponível um maior número de pontos amostrais dos tipos de solos presentes. No caso do IDECS, que expressa a diversidade de classes na área do território por ela ocupada, quando há apenas uma classe de solo na ordem considerada, não se deve aplicar o índice, pois não será representativo da realidade. Além disso, quando se usa um recorte, as características do próprio território, em termos de especificidades climáticas, de relevo ou influência marinha, por exemplo, ganham importância, pois se refletem nos tipos de solo que irão ocorrer. Levando estas questões em conta, pode-se afirmar que, no Rio de Janeiro ocorrem 104 dos 938 tipos de solo do Brasil, considerando o quarto nível taxonômico do SiBCS. Tal fatorevela a alta pedodiversidade que o Estado possui, pois em apenas 0,51% do território do país ocorrem 11% dos seus tipos de solo.

Agradecimentos



Referências

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